The Square: A Arte da Discórdia é um filme que alterna na sua longa duração momentos marcantes inclusive para as próprias realidades que encapsula, e que, numa narrativa multiplot com diversos personagens entrecruzando seus caminhos, consegue emblemar muito bem nessas relações todo o espírito libertino e por vezes irracional das artes contemporâneas que parece querer entender, seja num espaço propício a elas como num museu quase que destituído de visitantes (e que quando presentes não observam as artes, mas ironicamente só fazem discursar sobre si mesmos como se fossem mais importantes que o exposto, algo típico da nossa sociedade), seja também no ganhar de outros espaços histriônicos que performances artísticas possam vir a galgar, como num jantar para a elite sueca ou numa simples praça, lugar público onde o polêmico e forjado assassinato de uma menina tem o seu significado subvertido para ser chamado, na era da web 3.0, de ”Arte”.
Nota-se que há uma constante iminência no filme, uma urgência dramática que nos faz ansiosos para saber o que vai acontecer. Em determinada cena, por exemplo, e ouso chamá-la de uma das melhores no contexto do longa, o protagonista, homem profundamente dividido entre seu trabalho e suas paixões, se vê obrigado pela missão de deixar várias cartas em cada um dos centenas de apartamentos de um prédio residencial, metaforizando desta forma a necessidade pluralista e esquemática do filme em tocar em vários assuntos do mundo das artes, ao encaixar ao longo da trama inúmeras referências artísticas como se fossem os cartões postais depositados nas soleiras das portas.
O diretor Ruben Östlund consegue malabarizar bem suas influências, intenções e ambições, simbolizando-as nas ações e nas personalidades dos homens, mulheres e crianças (sendo que elas têm uma grande importância no filme, sendo o último plano dedicado a uma delas) que segue, entre cenários, diálogos, e uma elegância casada com um pedantismo intelectual típica ao cinema sueco que o mesmo vem seguindo desde antes do cinema de Ingmar Bergman.
O grande vencedor da palma de ouro em Cannes emula, portanto, com o arrebate de um ator de teatro iniciante muito daquilo que se vê como Arte, a velha Arte, hoje em dia, num mundo de desumanização galopante no real das ruas, tão impiedosa e mortal quanto uma apresentação artística extremista pode ser. Muitos vão chamar de irregular, satírico, exagerado, longo demais, forte demais, mas pra “The Square” eu fico com hipnotizante mesmo.
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