Para falar a verdade, nunca fui muito fã de lobisomens. Até hoje, não conheço um filme decente que faça jus às criaturas místicas que são uma mistura grotesca de homem e lobo e mais poderosas e ferozes do que qualquer outro predador. No entanto, alguns livros atualmente sobre lobisomens os trazem de uma maneira diferente, não havendo um meio termo: nasceu a lua cheia, são lobos. Lobos de verdade, e não os híbridos bizarros. Esse é o caso de Frostbite e, apesar de eu preferir o modo trash lobisomem de ser, esse livro está entre os melhores relatos desses monstros que eu já tive o prazer de ler. Com personagens atormentados e uma sequência frenética de acontecimentos, essa é uma leitura indispensável para todos aqueles que buscam por sangue e um ritmo caótico.
Narrado em terceira pessoa, essa mesma narrativa se divide em dois momentos: quando Chey, a protagonista, está em sua forma humana, e outro enquanto ela está em sua forma de lobo. É evidente a mudança que ocorre mesmo no modo de contar a história quando esses dois momentos mudam. Quando humana, tudo se desenrola de acordo com os sentimentos da protagonista, seja quando está com raiva, com medo ou com a certeza de que vai morrer. Quando loba, tudo que quer é sangue e morte, dando assim um ar tenebroso para aquela protagonista que, mesmo forte, não parecia ter essa maldade dentro dela.
Sim, tem um casal protagonista de lobisomens (own). Porém, não há drama e não há meninices nessa parte. Você torce por eles por serem parecidos (veja bem, no primeiro encontro deles como humanos, ele tenta matá-la com um machado. No primeiro encontro deles como lobos, ela tenta arrancar a jugular dele com os dentes, não é o casal perfeito?) e combinarem. Porém, desde o princípio fica evidente que a protagonista tem um segredo que a levou até ali. E é o que nos leva ao outro ponto forte do livro: os personagens.
A protagonista não é uma donzela indefesa. No entanto, ela também não é a personagem mais útil do livro enquanto humana. Não porque ela não pensa no que faz, mas sim porque os outros são simplesmente muito mais habilidosos e mais treinados do que ela. Porém, ela tenta, e ganha respeito por não desistir mesmo quando tudo parece dar errado e ela está, literalmente, toda quebrada em algum canto da floresta. O outro, Powell, que é o lobo que a transformou, também merece ser mencionado por condizer o tempo todo com a impressão inicial que passa ao leitor. Ele não muda aquilo em que acredita e não contém sua raiva quando certas coisas acontecem. Powell é, acima de tudo, um predador.
Existem, é claro, alguns personagens babacas, como o namorado de Chey, que não o é por ser um personagem mal criado, mas por ser criado tão bem em suas manias que é simplesmente um babaca completo. Todos os personagens são únicos e bem feitos. E agora vamos ao melhor personagem do livro: Dzo.
– Eu sei. O engraçado é que não estou com tanto medo de ser morta como estou de falar com Powell novamente. Mas você não entederia isso.
Ele ergueu as mãos em desculpas fracas.
– Talvez você morra entes de ir tão longe – sugeriu ele.
– É – Ela começou a andar novamente – Obrigada, Dzo.
Ele não se importa com o que você pensa, como você aparenta ou quem diabos você é. Dzo é a criatura mais pacífica e mais despreocupada que você poderia conhecer em toda sua vida. Suas palavras de sabedoria (como visto ali em cima) são indispensáveis para você manter foco no seu objetivo. Como a pessoa que me emprestou o livro disse: todo mundo deveria ter um amigo como o Dzo, e eu concordo com ela. É um personagem cativante que permanece uma incógnita até o final do livro. Apenas capaz de entender frases literais, é digno dos melhores diálogos presentes no livro.
Por último: as transformações. Diferente dos seriados, filmes etc., a transformação que David Wellington narra é muito mais poética do que a grotesca quebra de ossos e dores absurdas. A luz da lua toca o lobisomem e seu corpo se desfaz, como se nunca houvesse existido, e em seu lugar o lobo se materializa. Foi uma surpresa agradável – apesar de preferir as transformações dolorosas e repletas de gritos – ter uma visão de como ele quis colocar os lobisomens: como se lobo e homem fossem duas entidades diferentes com duas consciencias distintas.
Portanto, apesar do final um pouquinho frustrante – afinal, era desejável que a protagonista arrancasse a cabeça dos antagonistas a dentadas -, o autor criou e desenvolveu uma excelente história de lobisomens e recomendo a leitura até mesmo para quem nunca foi, assim como eu, um grande fã dessas criaturas.
–
Texto de autoria de Thiago Suniga.
Dois filmes:
in the company of wolves
http://www.youtube.com/watch?v=ZDqNOkd8vIY
Dog Soldiers
https://www.youtube.com/watch?v=R_0Ej5N-hFQ
Ok, primeiro: desculpe a demora, mas finalmente assisti os filmes recomendados para dar uma resposta. Eu realmente gostei dos dois filmes, mesmo achando que o primeiro (Company of Wolves) não fosse realmente me inclinar a apreciar filmes de lobisomens mais do que antes (porque, ao meu ver, era mais voltado a fábulas e folclore do que as criaturas).
Agora, quanto ao segundo (Dog Soldiers), eu realmente gostei muito e preciso dizer que se fosse o primeiro filme do gênero que eu tivesse assistido, provavelmente eu não iria torcer o nariz para todos os filmes de lobisomem que encontro por aí (considerando assim, o melhor filme sobre essas criaturas até o momento – não que eu tivesse assistido muitos, mas enfim).
Obrigado pelas ótimas indicações e pelo comentário. Até mais!
Otima resenha!
Me deu vontade de ler o livro, verei se consigo!
… (Após tantos anos de convivência, tenho o direito de te ignorar)
Excelente, Thiago!
Tentarei dar uma conferida, já que a mitologia me interessa
Eu recomendo, principalmente para se comparar e ter noções do quão variável essa mitologia pode ser ao ver as maneiras diferentes entre aquele lobisomem “tradicional” e a imaginação de um autor que deseja colocar um pouco de seu próprio tempero em uma história. xD
Caara, quando você começou a ler esse livro, não consegui evitar olhar com certo desprezo para ele xD Sei que não se deve julgar um livro pela capa, mas essa não ajuda mesmo. De qualquer forma, sua resenha me deixou curioso! Embora pense que provavelmente ficarei frustrado. Não sei, não engulo esse lance de lobisomem como um lobo total. Lobos são fodas, mas não são assustadoooores. Ainda mais depois de GOT, em que todo mundo quer um lobo para chamar de seu, you know.
Eu tinha certeza de seu desprezo no momento que comecei a ler, Diio, e com isso em mente preciso te dizer que você provavelmente vai ficar, sim, frustrado, mas talvez não pelos motivos que acha que vai. xD
Veja bem, é diferente contar uma história em que existe um lobo ou o medo que essa criatura irá impor e no suspense que irá acarretar em uma história em que, tecnicamente em grande parte, você é o lobo e as sensações são diretamente do ponto de vista animal, mudando e focando-se em como as coisas mudam para você (o monstro) ao invés de aqueles que estão a sua mercê (suas presas).