Gabriel Garcia Márquez ficou dez anos sem fazer romances antes deste Memórias de Minhas Putas Tristes, lançado em 2004. Composto por capítulos longos, mas de fácil leitura, o primeiro tema tocado na narrativa é a velhice, e como o protagonista encara tal fase de sua vida – ele não é lamurioso ou lamentador, ao contrário, destaca os pontos positivos do seu cotidiano e debocha de quem não compreende os sinais que a vida dá, em especial nesse momento.
Aos poucos o autor mostra quais serão os enfoques da obra. É dada uma atenção especial a vida do sujeito solitário por opção, que aparenta ser moralista no início – devido também a alta idade – mas que aos poucos se mostra uma pessoa desprendida do discurso formal de agir segundo os bons costumes. Sua vida sexual é peculiar, quase sempre acompanhada de relações “pagas”, mas não era lotada de profissionais na pura essência da palavra, e sim por mulheres pagas de formas “extracurriculares”. Um dos pontos levantados pelo autor é o alto custo do sexo, mesmo o “não-remunerado”. Ponto forte da narrativa são as descrições das mulheres, algumas voluptuosas, intrigantes e excitantes por natureza.
O ofício do narrador – o herói falido e decadente da jornada – era o de escritor e cronista, o que ajuda a traçar alguns paralelos com sua vida amorosa. Seus textos eram curtos, e sem fins apropriados, ao menos segundo as suas próprias expectativas, e quase em todas as relações que ele se meteu, terminavam incompletas, faltando algo importante sempre, para ser plenamente satisfatório.
A reticência do escritor em desfrutar de seu “presente de aniversário” – escolhido e amputado pelo mesmo – contrasta com o resto de sua vivência. O novo fator que se apresentava, a paixão, mudou completamente suas perspectivas, tanto em relação as necessidades quanto no que toca os seus desejos, e até ao seu ideal de “vida perfeita”.
A possibilidade da perda de seu objeto de alento se mostra trágica e torna o “ciúme mais real que a verdade” – sentimento presente em quase todas as relações amorosas desde sempre.
Um dos personagens mais controversos, a cafetina dona de uma casa de burlesco veste a máscara de mentor e profere o resumo desta obra, de uma forma bastante clara: “Não vá morrer sem experimentar a maravilha de trepar com amor!”.
O ato final é quase como um último suspiro de um ancião decrépito à espera da morte iminente, e termina de forma repentina, vislumbrando uma possibilidade de futuro esperançosa para o protagonista sem nome e sua ninfeta. Gabriel Garcia Márquez proporciona ao seu leitor uma história que foca na reticência e no medo de viver plenamente, desfrutando dos desejos mais sórdidos do homem, condenando quem não o faz a uma existência sem alegrias..