Às vésperas da realização do Encontro do Mercosul, que reunirá importantes nomes da política e economia das Américas, algo estranho está acontecendo em Florianópolis e região. Uma série de mortes aparentemente não-relacionadas entre si chama a atenção da polícia local, e em pouco tempo a situação evoluiu para uma caçada em grande escala. Está em terras catarinenses um assassino misterioso, identificado pelo codinome Xstranho. Quais são seus alvos? Há como deter esse lendário “fantasma”, temido na comunidade internacional de Inteligência? É o que autoridades brasileiras e estrangeiras precisarão correr contra o tempo para descobrir.
Essa é a sinopse de Morte em Dezembro, romance de estreia de Ivair Antonio Gomes, publicado pela Editora Dracaena. Este interessante thriller investigativo mostra que nem só de fantasia vivem os novos nomes da literatura brasileira. A estrutura adotada pelo autor chama a atenção logo de cara: são citadas inúmeras agências da lei, nacionais e internacionais, além dos pormenores e burocracias que envolvem seu funcionamento. Fica claro que foi realizada uma extensa pesquisa para construir a história nos moldes propostos. Ainda que a escrita em si tenha um tom seco, conciso e muitas vezes resumido (lembrando até mais um conto do que um romance), essa forma como a trama é contada lembra o estilo de autores como Frederick Forsyth, Robert Ludlum ou John le Carré.
Tal escolha narrativa tem seus prós e contras. A visão crua e pouco romantizada certamente deve agradar aos ansiosos por “realismo”. Não há um herói infalível, que de peito aberto e na base do improviso, resolve tudo sozinho. Pelo contrário, cada órgão policial, até mesmo em outros países, trabalha arduamente para conseguir uma micro-pecinha do quebra-cabeças. Ao mesmo tempo, o ego e orgulho de cada um as vezes atrapalha o trabalho em equipe. Sensacional a sacada sobre dar o comando da operação para alguém inferior na hierarquia. Assim, em caso de sucesso, mérito da colaboração de todos. Se as coisas derem errado, temos um conveniente bode expiatório. Politicagem na sua mais pura forma. Nessa mesma linha, a figura clássica do super-assassino solitário (imortalizada nos clássicos de espionagem) também é desconstruída. Uma operação complexa, ainda mais nos tecnológicos dias atuais, fatalmente envolve um grupo de colaboradores.
Por outro lado, a grande preocupação didática/descritiva com o funcionamento de uma grande investigação internacional deixa pouco ou nenhum espaço para serem trabalhados os personagens. O fator humano, pessoal, emocional inexiste. Por exemplo, o Delegado Azevedo, um policial veterano mas com experiência simples, que de repente se vê no centro de algo muito grande. Ele é o que há no livro de mais próximo a um protagonista. Mas, salvo uma breve interação com a esposa, não sabemos quem ele é, o que está sentindo, etc. Outro personagem com certo destaque (pois todos os outros são apenas NOMES que simplesmente aparecem quando a história exige), é o agente da ABIN, Marcelo da Silva. Inteligente, experiente, bem treinado e com um passado um tanto suspeito, também deixa o leitor interessado em saber mais sobre ele. Sem falar no próprio Xstranho, que inicialmente tem algumas “cenas” pra si, mas logo some até o desfecho.
Entende-se que a proposta era de fato priorizar os procedimentos e não as pessoas. Mas ainda assim, personagens mais desenvolvidos, capazes de gerar empatia, seriam um “recheio” a mais que poderia enriquecer a obra. Outro ponto negativo que infelizmente precisa ser apontado são os erros de revisão do texto. Apesar do belo projeto gráfico (a capa é muito bonita), tais erros acontecem em número suficiente para incomodar. Em última análise, porém, o saldo final é positivo. Morte em Dezembro é uma leitura rápida e agradável, uma boa recomendação para fãs de histórias policiais e de espionagem. Além, é claro, da diversão particular pra quem conhece Florianópolis, que é identificar os locais onde os eventos se desenrolam.
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Texto de autoria de Jackson Good.