Com ares de pós-apocalipse, em um mundo que “acabou” mas que ainda teima em existir (especialmente em relação à humanidade), aliados à sensação de confinamento e sob total controle de um Estado totalitário e bastante coercitivo — referências às obras de Aldous Huxley, George Orwell e Anthony Burgess.
Silo é o primeiro volume da saga escrita por Hugh Howey partindo de um sistema de publicação sob demanda, primeiro em e-book (lançado separadamente em seis tomos) e depois em versão física completa. A autopublicação angaria cada vez mais adeptos e ganha muita popularidade, principalmente nos meios literários estadunidenses, sendo uma forma de exposição válida de material, apesar do hábito mercadológico frequente de não se buscar novos valores.
Na história a humanidade não consegue habitar o ambiente terreno, pois a paisagem é destruída e hostil. A localidade que permite a subsistência da espécie está em um silo subterrâneo de proporções homéricas. Holston é um personagem deslocado e reticente, um verdadeiro fruto do meio e autêntico reflexo do ambiente caótico em que vive. É apresentado, três anos antes do começo da história, o local onde mora com sua companheira Allison, um apartamento em que cabem duas camas e uma escrivaninha, um local incrivelmente grande para as pretensões de alguém deste universo. Com um sistema político complicado de se entender, até mesmo para os seus habitantes, Holston fica confuso, uma vez que questionar o silo é algo proibido, silêncio este que é praxe entre os moradores; até que resolve “rever” este conceito e começa a se perguntar como funciona o sistema de sorteio para os afazeres dentro da redoma, refletindo também sobre o fato de não ter ciência de até aonde vão os seus direitos.
O começo da narrativa é um pouco truncado, até porque este início serve apenas como preâmbulo da trama principal. Howey cai em um erro comum, de escritor iniciante, de tropeçar nas próprias pernas ao tentar provar um ponto. Algumas descrições e situações se alongam demasiadamente e se tornam dispensáveis diante do todo da obra. O excesso é facilmente distinguível. Os tomos denominados Holston e Medida Certa servem para ambientar o leitor a esse universo, mas certamente seriam mais palatáveis se fossem mais concisos.
Em O Começo, correspondente à Parte Três, a mesmice é quebrada com um recordatório da personagem Juliette, mostrando a sua trajetória e seu estado de enjaulamento, que evolui e ganha contornos dramáticos mais envolventes, preparando o terreno para a mudança de foco narrativo iniciado em Os Abandonados. Nesta Parte Cinco a trama evolui, tornando-se arrebatadora. A aura de suspense aumenta consideravelmente muito graças à sensação de claustrofobia em que os personagens se lançam, seja pelo isolamento do mundo através da vivência no silo, seja pelas desventuras dos personagens por dentro dos tubos. A dificuldade em manter-se vivo e o instinto de sobrevivência são muito presentes no cotidiano dos desbravadores desse habitat, e a escassez de comida que acomete o grupo algumas vezes remete metaforicamente a inúmeras dificuldades da vida moderna.
Silo é o primeiro número de uma trilogia que deve ter sua continuidade publicada também pela Intrínseca. A popularidade é tanta que se aventa a possibilidade de realização de uma adaptação, a qual já estaria em processo de formação do casting e com projeto capitaneado por Ridley Scott, o que se torna uma grande ironia, visto que muitos dos filmes do diretor influenciaram diretamente o ideário desta narrativa. A inspiração é justificada pelo fato do romance solidificar muitos dos conceitos de Howey, especialmente se pensar no background de Juliette, parecidíssimo com o de Ellen Ripley (Sigourney Weaver), protagonista da série Alien, cuja influência foi assumida pelo romancista.
Os últimos momentos são muito mais emocionantes do que os do restante da jornada, em uma amálgama de medo, paranoia e construção de mentiras a fim de obviamente manipular os que vivem naquelas condições. Ao final, a sensação passada ao leitor é baseada na subsistência; o foco da narrativa de Howey, sem dúvida, está na discussão de até quando é justa a luta pela sobrevivência e o que seria ético na busca por este alvo. O clima de teoria da conspiração em meio a verdades indiscutíveis é o ponto mais interessante, por novamente trazer à baila uma questão tão atual e ainda em voga: a ocultação de informação e manipulação do povo, uma capa que pretensamente busca a paz e o bem estar social mas que, na verdade, esconde interesses de indivíduos poderosos.