Crítica | Conflitos Internos III
Terceira parte da saga conhecida mundialmente como Infernal Affairs, Conflitos Internos III começa com um número sangrento, em Maio de 2002, alguns meses antes da morte de Chan Wing Yan, retratada em Conflitos Internos. Os diretores Alan Mak e Andrew Lau retornam para dar fim a saga de gato e rato iniciada em 2003*, mostrando de maneira violenta e um pouco fantasiosa o submundo criminal de Hong Kong.
Esse capítulo tem muito mais ligações com o primeiro do que com Conflitos Internos II, até por ter sua linha temporal bem próxima do clássico. Mesmo sua abertura lembra a do primeiro, com um elevador passeando por cenários bem parecidos com os antigos, inclusive com imagens de deuses e demônio. As linhas temporais aqui são bem distintas, brincam entre 2002 e 03, como em uma leitura de relatório das ações dos agentes infiltrados no crime e na policia, trazendo de volta a perseguição de gato e rato que fez famosa a franquia e sua versão estadunidense, Os Infiltrados.
O retorno do inspetor Lau (Andy Lau) é silencioso. Seu personagem parece mais enigmático, mais preocupado em continuar agindo nos dois lados da lei em prol de seus negócios e de sua sobrevivência, correndo as vezes sem rumo, como uma galinha recém decapitada, ainda forte, mas sem pleno uso de suas faculdades mentais. Ele age muitas vezes por impulso, parece estar pensativo mas não aparenta ter o controle da situação, uma vez que nunca foi o cérebro das operações que fez parte.
A mostra das sessões de terapia de Chan Wing Yan (Tony Chiu-Wai Leung), com a doutora que foi responsável depois por identificar que ele era um policial disfarçado, mesmo com seus dados no banco da policia deletados. Essa parte foi traduzida de modo diferente na versão de Martin Scorsese, economizando personagens, pondo a psicanalista para ser esposa do personagem de Matt Damon, transformando isso num triangulo amoroso. Aqui, há alguns semelhantes parecidos, mas nada tão explicito, ainda que haja sim um componente sentimental, que justificaria o afinco dela por provar que o morto não era um mero fora da lei.
Mesmo na parte pós morte de Yan o que se percebe é uma confusão mental e comportamental da parte do “inspetor”, aqui, ele não é bandido, herói ou anti herói, é sim um herói falido, como um anjo que se revoltou contra Lúcifer. Os últimos momentos de Lau mostram um homem confuso, que não consegue lidar tão bem quanto antes com a pressão de estar sendo sempre vigiado, não lidando bem com a possibilidade de ser descoberto, ele vive um homem só, um sujeito que não tem a quem recorrer, nem superior e nem abaixo dele, está encerrado com seus segredos em si até que ele mesmo exploda, e a saga Conflitos Internos se encerra assim, de forma poética, violenta e melancólica, emulando qualidades inerentes a vida.