Crítica | Inocentes
Produzido em Singapura, Innocents de Chen-Hsi Wong mostra um cotidiano escolar muito diferente da realidade ocidental, ainda preso a valores considerados atrasados no hemisfério onde se situa a América, e por isso chega próximo de chocar o espectador, apesar de toda a sua singeleza e cuidado ao abordar temas polêmicos relacionados a infância.
A história é narrada pelos olhos de uma menina aplicada aos estudos e vista pelo adultos como um modelo de conduta, Syafqah – Nameera Ashley. Quase todas as ações passam pelo elenco majoritariamente infantil, o que demonstra que essa é uma história sobre o “mundo das crianças”, o que evidente não torna a sua trama desinteressante para o público mais velho. Na escola onde estuda – um ambiente de forte repressão e ensino bastante antiquado – ela conhece Huat, feito por Cai Chengyue, um menino problema padrão, que além de ser um estorvo em classe é também maltratado pelos colegas no lado externo da instituição – às vezes até nas dependências do local. Os dois são obrigados a conviver juntos, como se posto ao lado de uma boa aluna, o rapaz seria constrangido a mudar sua postura.
Syafqah não gosta desse gesto forçado num primeiro momento, e permanece distante do menino, observando-o de forma platônica, sem travar com ele relação nenhuma, como uma observadora passiva, mas ela cede ao clamor de Huat por algo mais, enxerga nele uma carência enorme e logo se simpatiza por ele. Ambos têm trajetórias de vida parecidas, mas ainda assim, distintas.
Os pais são retratados como vilões, no caso de Syafqah há um excesso de severidade por parte de sua mãe. Na primeira tomada em que ela aparece, a figura de autoridade é filmada ao longe, evidenciando o distanciamento que tem com a própria filha, a única relação presente ali é a da figura autoritária que imputa obrigações a menina. Para Huat e sua irmã – uma menina com necessidades especiais – o problema é ainda mais grave, pois seu pai os rejeita e sofre de um grave vício, que faz o rapaz temer por sua segurança e claro a de sua irmã indefesa. Tais coisas são sugeridas de forma sutil, com muita leveza. Huat e Syafqah tornam-se cada vez mais próximos.
A forma como menino é tratado pelas “autoridades” é sempre em tom de humilhação, e ele se sente compelido a desistir de tudo e é impedido por sua amiga, até um ponto em que fica insustentável sua situação. O desfecho é emocionante, e faz o espectador duvidar da amizade dos protagonistas, o que se prova um engano, pois a relação dos dois é de total cumplicidade. A conclusão faz doer, como um murro no rosto, pois explicita a imundície do pensamento adulto aos olhos das crianças inocentes e denuncia a hipocrisia no discurso, que se diz bom mas que é menosprezador e humilhante para quem é diferente do que “eles” acham correto.