Crítica | Lancelot: O Primeiro Cavaleiro
Lancelot: O Primeiro Cavaleiro é mais uma das muitas obras que adaptam os contos míticos de Avalon a respeito da lenda do Rei Arthur e seus cavaleiros da Távola Redonda. Dirigido por Jerry Zucker (Ghost: O Outro Lado da Vida), o filme se inicia com um resumo dos primeiros passos do soberano dono da Excalibur para depois mostrar o astro de comédias românticas Richard Gere se exibindo como Lancelot, um exímio espadachim que vive seus dias tranquilos no campo.
Por mais que o filme não seja um primor dramaturgicamente, há um cuidado com sua atmosfera. O departamento de arte, cenários e figurinos corroboram para o estabelecimento da historia, mas é a música de Jerry Goldsmith que mais a marca. É ela que ajuda a denunciar o terrível combate que Malagant, o príncipe perverso feito por Ben Cross, impõe a uma simples vila de camponeses, e claro, aos reinos vizinhos. Essa condição de opressão contrasta demais com o restante do tom do filme que se preocupa em excesso por criar um caráter de romantismo exagerado.
Lancelot é habilidoso, um sujeito de boa índole e honrado, capaz de derrotar praticamente qualquer pessoa, mesmo em um duelo desigual. Os destinos de Camelot o encontram por acaso, como se ele estivesse predestinado, e não há nem sequer uma tentativa básica de estabelecer realidade nos combates ou nos pretensos encontros amorosos. Desde o primeiro momento em que encontra a Guinevere de Julia Ormond já se percebe que dali brotará uma relação amorosa. Não se guardam surpresas dramáticas, é tudo bem óbvio, uma historia de época preocupada em entreter por meio de um romance açucarado.
Após fazer Apertem os Cintos o Piloto Sumiu e Top Secret, os irmão Jerry e David Zucker seguiram carreiras diferentes, o segundo continuando nas esteiras das comédias rasgadas enquanto o outro se dedicou a fazer historias mais sérias. No entanto, o que se vê nessa produção, além de clichês românticos, é uma leveza que não combina com tempos tão sombrios quanto esses. É curioso como todo uma vertente de filmes sobre a Idade Média insiste em ser super limpinho, higiênico, comedido com violência e volúpia.
Mesmo a suposta traição e indiscrição conjugal envolvendo Guinevere e Lancelot é suavizada, estabelecida assim graças a escalação do veterano Sean Connery como Arthur. O veterano herói de ação não poderia ser retratado como vítima da infidelidade de sua amada e de seu principal cavaleiro, portanto, se impõe uma diferença de idade, e uma relação fria entre rei e sua futura rainha, colocando o humilde Lancelot como a resposta plebeia a um possível herdeiro do trono.
Ao menos o filme expõe questões políticas e sociais comuns a época, como casamentos arranjados para proteção entre reinos e vilarejos, sequestros de figuras importantes a fim de conseguir barganha com reféns. A grande questão é que tudo é mostrado de uma maneira bem pueril, quase infantil, como um conto narrado para crianças, que só busca o intento de derreter corações sensíveis e apaixonados.
Se o filme não se levasse tão a sério, certamente haveria algum charme na condução da historia, principalmente no triangulo amoroso entre protagonistas. É uma pena, pois Connery tenta dar alguma gravidade ao seu papel, enquanto os outros dois atores parecem protocolares, mesmo ao fim, onde uma batalha sangrenta ocorre, não há força, o sangue que jorra de heróis é artificial demais, não se sente o sacrifício de ninguém, e o resultado final carece de emoção.
Lancelot: O Primeiro Cavaleiro poderia ser mais assertivo se não se levasse tão a sério, pois acaba pecando em ser um drama de época e um filme de aventura, não acertando em cheio sequer a vertente de romance rasgado, uma vez que não há quase química nenhuma entre os dois principais atores, e as questões de discussões sobre a época medieval também não são bem trabalhadas.