Crítica | Os Incrédulos
A peregrinação mundial dos cientistas Richard Dawkins e Lawrence Krauss é flagrada pela câmera e edição moderna de Gus Holwerda, que se utiliza de depoimentos de celebridades conhecidamente incrédulas – a maioria ateia – para fortalecer o discurso que torna o argumento científico a solução para a maioria dos males humanos, especialmente o da falta de discussão do papel dogmático que a religião exerce sobre as sociedades ocidental e oriental.
Dawkins é um zoólogo, etólogo e evolucionista, enquanto Krauss é especialista em física teórica. Seus currículos os credenciam para falar a respeito das descobertas pregressas da ciência, e especialmente para pregar às multidões a graça da verdade, a ciência como libertadora de qualquer pensamento recalcante, por ser ela a que explica a face originária da vida. No entanto, para que o alicerce da ciência seja sólido, é preciso usar o sepultamento por completo do pensamento religioso, tirando-o da base da pirâmide de pensamento, não só por ser a “instituição” um órgão que proíbe a discussão em volta de si, mas também pela natural escravização de seus membros, a maioria vítima de sofismas alienantes, cuja consciência passa longe da mentalidade dos fiéis.
Os debates são quase sempre muitíssimo enérgicos, onde a razão e a lógica quase nunca vence o senso comum do pensamento formado através da fé, seja pelos devotos fundamentalistas, seja por meio dos crentes que aceitam concessões. O discurso dos cientistas, no entanto, é indobrável por estes terem a certeza de que qualquer faceta da crença acima da premissa congruente do raciocínio fuja de seus próprios ideais.
Olhando por esse ângulo, é fácil associar o modus operandi dos pesquisadores aos de um fanático religioso, que possivelmente inspirou parte da massa ateia praticante que tenta converter tudo e todos. Mas há que separar a abordagem do discurso e as estratégias de fala, executadas para mais fácil entendimento dos incautos no simples pensar e no estudo da origem da vida, das espécies e dos lugares em que o homo sapiens habita. Os números apresentados para uma plateia exclusivamente sua são realizados em ambientes teatrais, dando a eles um ar de celebridade e que, com humor, levam a sua plateia uma mensagem que entretém e pretensamente informa. Assim, o discurso torna-se bastante discutível em razão da edição escolhida que os glamouriza na tentativa de popularizar a fala, o que pode naturalmente banalizar suas palavras – especialmente para os analistas mais “xiitas”.
As imagens falam por si só. Enquanto os dois protagonistas estão em um ambiente fechado, onde a paz reina, do lado de fora há vozes dissonantes que vociferam ofensas distantes demais da paz que predomina sobre o evangelho e tantas outras religiões, derivadas ou não do cristianismo, crenças essas que basicamente tentam reduzir o argumento da não religião a algo que a maioria dos dogmáticos conhece: o puro recalque, descrito por Sigmund Freud como fruto do chiste, de quem baseia qualquer decisão lógica em passionalidade, calcada basicamente na mágoa, que é o inteiro inverso da religião.
A crença defendida em Os Incrédulos é abordar en passant os conceitos científicos que Dawkins e Krauss pregam, não apresentando todos os argumentos que estes costumam usar em palestras, até para que o documentário sirva de aperitivo. O alvo é destacar o quão ignorantes podem ser os opositores deste pensamento, em alguns pontos até validando algumas ideias, mas, claro, utilizando o conceito científico como crítica à intolerância e tendo ao seu lado os melhores argumentos.