Crítica | Miss Violence
O começo do fim. O fim de uma família. Uma árvore cortada não por meio de força externa, mas corroída por um invasor cupim que, em um segundo de posse de suas raízes, começa aos poucos a degradação da prejudicada estrutura interna. A primeira denúncia são os frutos que caem em direção ao solo, agora desnutridos, e se espatifam no chão, a polpa estourando – imaginem a cena. A queda junto a decadência marca o declínio de qualquer germinação, sendo assim uma questão de tempo (curto) para a árvore da vida, a partir dai, ostentar apenas o epitáfio já anunciado.
Miss Violence deseja mexer com seu psicológico. Aos despreparados, vai e consegue bem, porque choca e seu intuito principal é o choque com um verniz de estudo financeiro e social da atual crise que a Grécia ainda enfrenta, com sua população refém de um sistema incrédulo às demandas públicas. O que acontece dentro de uma árvore, um ser vivo à beira do abismo? não é a pergunta certa. Aonde ela assegura suas raízes para resistir a queda total é a pergunta a qual o filme de Alexandro Avranas investiga inteligentemente com poucas palavras, movimento em quadro ou extra-diegeses, dissecando o valor positivo ou negativo das ramificações familiares em tempos de cegueira e emergência existencial. Não há otimismo ou pessimismo. Não há filosofia ou canções de ninar, gosto de fábula; nada. É desse nada que surge a força do não verbal transformando a atmosfera de cada close ou dose de silêncio em objeto quase palpável, cortante, visível.
É o exercício mudo de se assistir três tigres tristes se debatendo numa jaula. Aguenta quem pode. Uma espiral de reviravoltas com base nutrida pela claustrofobia vivida e suportada longe de olhos públicos, sempre entre quatro paredes, no qual tudo o que é visível tem uma importância tão grande quanto o poder da palavra em filme de Woody Allen. O poder neste caso repousa em detalhes: as cortinas sempre fechadas, o silêncio que exclama feito buzina de caminhão e a realidade na mesa do jantar que nos toca por alcançar os personagens, vítimas de si mesmos, com o poder de um jato em rasante no céu.
Se Miss Violence é gratuito, frio e denso demais, prevendo a opinião da maioria dos espectadores que assisti-lo, o contato com a depressão de uma realidade burlada por uma câmera (que tenta ser invisível mas não consegue atingir tal efeito) também dita de forma extrema e sem meias verdades a impressão do público. Contudo, nada na projeção omite a certeza quanto a sensibilidade do autor, imerso até o primeiro chacra num miserável cotidiano, árvore que jamais será a mesma, e que pode existir no vizinho ao nosso lado, universalmente. Destaque para as atuações: Sete tigres tristes à flor da pele. Um comediante morreu em Nova York. Uns dizem que foi suicídio. Vai saber.