Crítica | Número 23
Após uma parceria em Batman Eternamente o diretor Joel Schumacher e o ator Jim Carrey se reencontram, em momentos distintos de suas carreiras, ambos passando por um certo ostracismo após o auge de seus trabalhos. O filme de suspense e terror se baseia na história de Walter Sparrow (Carrey), um sujeito afetuoso, e que representa isso até na natureza de seu trabalho de domador de cães e motorista de uma van que trata animais domésticos. Aos poucos, a história do chefe de família se desenrola e o público passa a conhecer melhor o sujeito.
Numero 23 tem uma versão para o cinema e outra, sem cortes (que vem a ser essa analisada) a narrativa entre ambas não é tão diferente, com ambas se focando bastante no núcleo familiar, cujos parentes amam muito o sujeito, a começar por sua esposa Agatha (Virginia Madsen), que compra para ele um livro velho, de capa vermelha e de mesmo nome que o filme. Também é mostrado o trabalho dele, cuidando dos cães, com ele eventualmente se machucando com a mordida de um deles, todos elementos para demonstrar o quanto ele é um homem bom.
Dado o nível de paranoia em os dois terços finais do filme se insere, é possível pensar que o são bernardo que o mordeu passou para ele alguma doença, como raiva ou uma variação mais forte dessa. Caso seja a levada a sério, essa teoria põe o filme lado a lado com Cujo, clássico de Stephen King cujo terror em livro e filme mora em um cachorro descontrolado e assassino, sendo que aqui, esse animal “só” teria passado algo a Sparrow, como raiva, que resultaria na paranoia e insanidade que se desenrolaria nos próximos momentos.
A narração presente no filme incomoda demais, a tentativa de emular a narrativa literária não combina muito com o caráter de thriller. Ao ler sobre a historia de Fingerling, o personagem do livro há algumas dramatizações da imaginação do protagonista, de como seriam os dias do personagem, encontrando paralelos entre a vida dele e a que ele lê no romance. As meras coincidências passam a parecer coincidências cósmicas, fruto é claro de uma imaginação fértil e de uma condução narrativa tola e infantil, dado que nem o caráter nonsense consegue ser bem aludido na obra.
Há quem elogie o filme afirmando que tirando as teorias da conspiração, a obra é agradável, mas a realidade é que sem as ilações levantadas não sobra história em Número 23. A tentativa de Carrey em atuar como um sujeito obcecado e sombrio, todo o núcleo familiar que embarca nessa empreitada tosca e falida, nada faria sentido e o acúmulo de acasos que tentam fazer parecer que tudo aquilo é parte de um destino antes traçado faz com que tudo soe bobo, pontuado ainda por aspectos técnicos bem mal pensados, como a fotografia sempre escura e sem requintes e qualidades, além de atuações tão exageradas que beiram uma comédia involuntária.