O tema “pessoas com superpoderes” hoje sem dúvida afasta muita gente. O trauma de Heroes foi brutal. Uma pena, pois essa produção do canal SyFy deveria receber mais atenção. Atualmente em sua segunda temporada, a série conta a história de um grupo de pessoas com habilidades sobre-humanas, identificados como Alphas, atuando numa força-tarefa do governo americano que investiga crimes cometidos por outros Alphas. A equipe é liderada pelo psiquiatra Lee Rosen (vivido pelo ótimo David Strathairn), descobridor desse fenômeno ao tratar de seus pacientes.
O mérito de Alphas é combinar simplicidade com seriedade. O formato é de um típico seriado policial, com o inevitável caso da semana, ao mesmo tempo em que os personagens e a trama maior são aos poucos desenvolvidos. Se não existem mistérios grandiosos e explosões de cabeça, por outro lado o roteiro é sempre coerente ao trabalhar as questões apresentadas. A maior delas é o preconceito e o temor dos agentes do governo em relação aos Alphas, sempre querendo aprisiona-los sem qualquer preocupação com direitos civis. Rosen, por outro lado, é um pacifista convicto, e os enxerga como seres humanos, muitas vezes com problemas psicológicos. A dinâmica é sempre conturbada, e entre aquilo que o doutor gostaria de fazer e aquilo que ele consegue fazer, cada vitória da equipe traz um gosto amargo.
Outro aspecto interessante é a postura pés no chão em relação aos poderes, mantendo uma visão (pseudo) científica, e limitando-os, evitando assim um dos erros de Heroes: criar personagens nível DEUS e ficar sem história pra contar sobre eles. Além de estabelecer que o uso das habilidades traz consequências. Bill, ex-agente do FBI e líder de campo da equipe, tem superforça temporária graças a elevadas descargas de adrenalina. Porém, seu corpo e principalmente seu coração sofrem desgaste com o processo. Rachel consegue ampliar seus sentidos a níveis impressionantes, mas apenas um por vez, a custo de muita concentração, e prejuízo dos outros quatro. Nina tem algo entre hipnose e controle mental, mas depende de contato visual pra poder “influenciar” alguém. E o vício em conseguir tudo o que quer através desse poder a impede de ter qualquer relacionamento verdadeiro. Gary, de longe o mais carismático da série, é um jovem autista que enxerga ondas eletromagnéticas, conseguindo interceptar e filtrar emails, ligações telefônicas, etc. Não raro, ele mergulha nesse “mundo” só dele e se isola ainda mais. Completando a equipe, Hicks possui hipercinese, em essência uma pontaria absurda e reflexos dignos de um THE NINDJA. Sua habilidade é afetada por stress e autoconfiança, e o personagem surge como o clássico talentoso porém fracassado.
As comparações com quadrinhos também estão lá e são bastante óbvias. Lee Rosen é Charles Xavier com outro nome. Toda a discussão sobre preconceito e perseguição levando ao inevitável “nós contra eles”, não dá pra negar, é X-Men puro. E quando o vilão se revela, o negócio fica tão explicito que uma acusação de plágio não seria exagero. A série peca por falta de originalidade, então? Seria ingênuo dizer o contrário. O que vale, porém, é a forma como as coisas são apresentadas, com um “realismo” que consegue ser inédito. Alphas é uma série competente que merece ser vista e levada a sério.
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Texto de autoria de Jackson Good.