Mrs. Fletcher, comédia de humor negro de Tom Perrotta focada na cuidadora de idosos vivida por Kathryn Hahn, brinca com os absurdos da meia-idade em contraponto aos desprazeres da terceira idade, além da emancipação típica dos jovens.
Eve Fletcher se vê em uma situação difícil, seu filho Brendan (Jackson White) está se mudando, e com sua saída ela começa a perceber que pode mudar certos hábitos, principalmente daqueles envolvendo a forma como ela encara o sexo. Hahn acerta demais ao mostrar o receio de uma mulher que tenta sair do seu recato. Em torno dela, orbitam pessoas que lidam muito bem com sua sexualidade, Brendan mesmo é um exemplo disso, e essa é uma das possibilidades que explicam o afastamento dos dois, além da admiração do garoto pelo pai.
A trama é bastante sexualizada, todo o subtexto brinca com isso e a adaptação do livro de Perrotta, nessa temática, é desenvolvida de maneira gradual. A timidez da protagonista vai sendo abandonada aos poucos, ao longo dos sete episódios dessa temporada. É curioso, pois alguns anos antes, Hahn protagonizou junto a Juno Temple o longa As Delícias da Tarde, que lidava com temas similares, ainda que não fosse ela a personagem causadora do furor, já se via ali um potencial semelhante ao que Eve demonstra em sua série.
Graças ao seu tempo ocioso, a personagem-título gasta horas em um grupo de apoio para novos escritores, onde reside seu convívio social mais básico além do trabalho, e em casa, passa a se utilizar do cinema pornográfico para dar vazão aos seus impulsos sexuais.
Brendan é um sujeito odiável, vaidoso e sabotador. Aos poucos ele vai mudando, aprendendo com gente diferente, e parece ser mais aberto a novas experiências, ao menos em um nível superficial. Ele não consegue ter mais relações exatamente por conta das travas sociais e sexuais comuns a vida de mulheres de meia idade. O drama que mãe e filho vivem são bem diferentes, um goza plenamente de privilégios comuns a vida de qualquer jovem de classe média, já a mulher não se sente merecedora de usufruir sequer de momentos breves de intimidade.
O último episódio é um pouco morno em seu início, e reflete basicamente sobre as questões emotivas não resolvidas de mãe e filho, as carências respectivas de cada um deles e o modo agressivo com que se relacionam com outras pessoas, cada um ao seu modo, colecionando pecados e inseguranças entre si.
Mrs. Fletcher termina com um gancho covarde, com intervenções bruscas, reiterando que Eve não tem momento nenhum de paz, nem para se reinventar e muito menos para experimentar coisas novas. Fica a expectativa de que ocorra mais lastro para o desempenho de Hahn como epicentro deste cenário onde a melancolia impera, rumo a uma jornada que tenha ao menos um pouco de paz e não só tensão e angústia.