Tentativa de seu diretor em retornar aos bons tempos – ou ao menos à seara de filmes passáveis – Perdido em Marte é um esforço conjunto de Ridley Scott e o roteiro do pródigo Drew Goddard, cuja experiência na televisão – especialmente no recente sucesso de Demolidor – o credenciava a criar uma história carismática e interessada, êxito alcançado no argumento que se baseia no livro de Andy Weir.
Apesar do trabalho recente de produções hediondas, como Êxodo e Conselheiro do Crime, Scott consegue trabalhar bem com os elementos que lhe são postos à frente, se valendo especialmente de dois fatores fundamentais: o carisma de Matt Damon, que funciona de modo perfeito – ao contrário de Terra Prometida de Gus Van Sant – exatamente pela simplicidade de sua forma; e claro, uma trilha sonora incidental maravilhosa, que ajuda a preencher o vazio da solidão de um planeta inóspito.
Mark Watney (Damon) está junto de seus companheiros, viajando pelo espaço, em um esquema que reúne uma gama de personagens padronizados, que não fogem em nada do que o grande público consideraria palatável. A missão dá errado, e Watney fica para trás, dando vazão à velha história de superação e de resgate do homem abandonado.
Apesar de se valer de tecnobables na solução final, o argumento é crível, mesmo quando apela demasiado para a suspensão de descrença, exatamente por, mesmo com pouco tempo de tela, a persona de Watney resultar em algo interessante, otimista e chamativo, sem discrepâncias em relação ao seu passado, fugindo inclusive de velhos bordões, como família desesperada atrás do desaparecido ou cônjuge, à espera da volta.
Claramente, há no texto do filme um bocado de referências a objetos blockbusters do passado, como um pouco do espírito de Top Gun: Ases Indomáveis, no sentido de retratar a alma de equipe e as grandes mentiras dos “especialistas” – fatos que provavelmente irritam qualquer botânico que vê Watney realizar um sem número de proezas. Outra alegoria é ao óbvio mote de O Resgate do Soldado Ryan, ainda que este seja muito menos cafona e apelativo que o filme de Spielberg.
Apesar de não possuir cenas tão bem orquestradas do ponto de vista criativo, todo o suspense e claustrofobia funcionam em Perdido Em Marte, reprisando os ótimos momentos de Gravidade, inclusive o plot de desespero em torno da sobrevivência. Embora a carga positiva do filme de Scott seja enorme, este é um dos pontos diferenciais da fita, fato que inclusive insere a obra em um patamar superior ao recente Interestelar, por não encarar seu espectador necessariamente como um neófito.