Onde mais que não num universo Lego seria possível reunir Batman, Gandalf, Superman, Han Solo e As Tartarugas Ninjas e ainda achar plausível que eles estejam juntos na mesma história? Depois de tantos videogames usando os amados bonecos como protagonistas de aventuras mil, já estava mais que na hora de irem para a “telona”. Era justamente a mobilidade vista nos consoles que a maioria dos espectadores esperava ver no filme. E as expectativas não só se cumpriram, como se superaram. Mesmo sendo todo digital, a animação remete aos filmes de stop-motion, o que contribui para o saudosismo do público adulto.
A história é banal, e não precisava ser complexa mesmo, afinal é um filme voltado mais aos pequenos. E em certos momentos, dá a impressão de estar se perdendo no meio de tantas possibilidades dadas pelos inúmeros “universos” Lego. Parece um tanto non-sense os personagens irem do Velho Oeste ao céu, e depois ao fundo mar. Porém, o que pode parecer apenas uma muleta do roteiro para exibir na tela o máximo de produtos Lego, acaba se revelando totalmente coerente com o desfecho.
Se, para a criançada, é a aventura de um boneco “padrão” Lego que precisa derrotar um vilão, para os adultos a história traz embutidas, além das referências pop, críticas ao status quo sócio-político-econômico atual. Leva a reflexões sobre o consumismo desenfreado, o monopólio – tanto de bens quanto de informações – e, principalmente, sobre a alienação e a supressão da individualidade e do livre-arbítrio. O “mundo comum” do protagonista é assustadoramente semelhante aos mundos distópicos de 1984, de George Orwell, e de Admirável mundo novo, de Aldous Huxley. Parece muito um filme infantil, mas como já disse, para as crianças, é uma aventura multicolorida e muito, muito divertida.
Interessante notar que mesmo os menores detalhes são feitos com peças Lego. Fogo, água, tiroteios, explosões, fumaça – tudo foi feito “juntando” pecinhas. É óbvio que o filme tem um atrativo a mais para aqueles que passaram a infância brincando com Lego, construindo coisas e reclamando da falta de peças da mesma cor para construir uma casa que não fosse toda listrada. Mas o filme se sustenta e consegue agradar mesmo àqueles que não tiveram essa oportunidade.
Apenas algumas ressalvas. No último terço, a “bagunça” cresce exponencialmente e o roteiro parece não ter certeza de qual caminho seguir. E a dublagem… Além de se perderem as vozes originais – e muitas das piadas eram feitas sobre os atores donos das vozes – em alguns momentos os dubladores nacionais soam tão artificiais que conseguem fazer o espectador “sair” do filme. Os distribuidores parecem não se importar com a penca de marmanjos que se interessam por assistir o filme com o som original.
Há, nesta animação, um quê das animações da Pixar. Tem aquela capacidade, difícil de atingir, de ao mesmo tempo agradar gregos e troianos, adultos e crianças. As piadas, as gags, os diálogos são compreensíveis em diferentes níveis a cada um dos espectadores. Se a criança vai se divertir por causa do jeito engraçado de um personagem falar algo, alguns dos adultos irão se divertir tanto pela piada quanto pela referência a algum filme, livro ou HQ. Consegue ser abrangente sem ser superficial. O que, convenhamos, atualmente é uma qualidade e tanto.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.