Aos 30 anos de idade, o ítalo-americano John Fante trazia consigo uma maturidade preciosa, repleta de autocrítica consciente sobre os anos de sua juventude, com fins de reconhecer os próprios erros de escritor iniciante e narrá-los na ficção através de seu alterego Arthuro Bandini, o ponto mais brilhante de sua carreira.
Um ano antes, o escritor deu vida e voz às peripécias da personagem em Espere a Primavera, Bandini, o primeiro do quarteto que narra a trajetória de Arthuro, tão semelhante a de seu autor que criador e criatura tornam-se sinônimos.
Lançado no país pela José Olympio – detentora de boa parte do catálogo de Fante no país –, foi Pergunte Ao Pó que trouxe o derradeiro destaque ao autor. A narrativa é uma pequena pérola que não busca uma grande jornada e centra-se na história cotidiana de Arthuro Bandini, de origem ítalo-americana, recém chegado de Los Angeles à procura de emprego e de destaque social como um escritor.
A maneira lúcida com que Fante narra sua história promove uma feroz autocrítica de seus dias iniciais como escritor, universalizado na figura do alterego. Bandini representa o pior que pode acometer um artista novato: é presunçoso, esnobe e vaidoso ao extremo com sua própria criação literária. Por detrás de seu ego, Bandini é tímido, vivendo do medo de não ser tão bom quanto sua capacidade requer. Como um herói romântico, deseja viver aventuras para que possa narrá-las com a pompa necessária.
É pelo viés do sentimento que a personagem conquista o público. Bandini é formado por excessos para se tornar odiado pelo leitor, tanto no reconhecimento que se pode ter diante de seus defeitos quanto a respeito de suas reações extremas. Longe de uma jornada modificadora, a narrativa retrata a juventude imatura e – no âmbito da escrita – a relação do escritor com sua própria história de vida entre viver para contar ou narrar como forma de viver. Fante reinventa a própria história ao recontá-la em linhas narrativas, fazendo da própria biografia elemento primordial de sua ficção.
Entusiasta do autor, Charles Bukowski incentivou a popularização de Fante na década de 70, quando, ao publicar um novo livro, exigiu de sua editora o lançamento de Pergunte Ao Pó, além de escrever o prefácio da edição. Estranhamente, Fante tem reconhecimento tímido no Brasil, embora seja influente como escritor e chave para compreender movimentos posteriores, como a geração Beat, que faz da sociedade alvo de crítica.
Ao compor um personagem que desejava se inserir na sociedade a qualquer custo, Fante analisava a época vivida em meio à crise de 29 e próxima de uma segunda guerra mundial. Dentro deste cenário, Bandini é um miserável que, assim como muitos outros americanos, viveu de maneiras parcas à procura de um sustento minguado, passando dias comendo dúzias de laranjas, único alimento que tinha dinheiro suficiente para adquirir.
Em meio a este difícil e árido cenário, Fante não tem medo de fazer de sua personagem um homem sentimental. Imaturo, difícil, mas transbordando emoções. Em seu prefácio, o Velho Safado elogia a capacidade do autor em conseguir resgatar certo sentimento perdido na literatura. Como se os autores, à procura de personagens durões, omitissem a sensibilidade natural dos seres humanos.
A épica de Bandini não carrega uma mensagem transformadora de conduta, mas confirma a imaturidade aparentemente perene de um homem ainda incapaz de reconhecer o mal que faz a si próprio.
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