As dinâmicas diferentes entre o mercado americano de quadrinhos em comparação ao brasileiro inviabilizam certas opções editoriais. Salvo exceções pontuais como algumas edições da Image na época da Abril e, recentemente, The Walking Dead republicado pela HQM em edições únicas, nossas revistas sempre se formaram pelos mixes. Ainda hoje, o custo-benefício de um mix permite a leitura de mais de uma revista a um preço ainda atrativo. Se há pontos positivos como o preço, há arbitrariedades negativas que sempre incomodaram os leitores como a escolha dos títulos bem como uma arbitrariedade para publicação de novas revistas.
Ainda hoje, a Panini Comics compõe suas revistas mensais – tanto mix quanto as revistas lançadas no mês – de uma maneira difícil de compreender, para dizer o mínimo. Muitas vezes, certos títulos se iniciam em algum mix e depois de alguns arcos ganham revistas próprias (dois exemplos, um de cada casa: Deadpool da Nova Marvel, lançado inicialmente em X-Men Extra, antes de ganhar revista própria, e Esquadrão Suicida dos Novos 52, lançado primeiro em uma edição conjunta com a Aves de Rapina, depois em três encadernados solo, em seguida para a revista do Arqueiro Verde, finalizando suas edições em uma revista própria, ufa.).
A prática, porém, não é somente da atual editora. Desde a Abril, a escolha de novas edições e novos números fundamentavam pontos de partida ao leitor, sempre promovendo novas revistas com o atrativo nº1 na capa. A 3ª série de Batman lançada a partir de 1990 pela editora representa esta afirmação. A nova revista em um espantoso formato americano, foi arbitrariamente lançada sem nenhuma mudança editorial vinda de fora. Observando com distanciamento, a primeira edição de Batman apresentava o que hoje a Panini segue tanto em formato quanto em número de páginas. (Desde o Renascimento, as edições mensais tem saído com 50 páginas, com duas histórias por mês. A exceção é o tipo de papel atual em couchê ou alguma variação brilhante).
A primeira edição da nova revista apresenta uma boa fase do Morcego reunindo um time de ouro: John Byrne e Jim Aparo compondo uma aventura em três partes intitulada As Muitas Mortes de Batman. Se hoje o processo de fortificação do personagem o faz um humano quase perfeito (um contrassenso que os leitores não ligam porque, afinal, trata-se do Batman), é interessante observar uma abordagem mais leve, tanto na narrativa que não abusa do fator-morcego como nos traços ainda sem uso excessivo de cores pretas e sombreamentos.
A trama se inicia com uma possível morte de Batman. Uma cena do crime em que o morcego é encontrado crucificado. Aos poucos, percebe-se que há um assassino na cidade que traveste seus mortos com o uniforme do herói. Byrne mostra sua excelência narrativa ao compor um primeiro ato sem nenhuma fala. Apenas desenvolvendo as cenas para que Aparo desenhe com a qualidade costumeira. Assim, o primeiro ato marca a urgência da morte do Morcego, bem como mostra a reação dos personagens queridos do público a essa notícia. O herói só aparece de fato na trama na segunda parte.
Seguindo uma estrutura narrativa tradicional dos quadrinhos com um narrador em terceira pessoa desenvolvendo o enfoque da trama – um resquício literário presente na nona arte – se debruçar sobre histórias antigas sempre evocam as comparações sobre as diferentes formas de se compor uma HQ e, ainda assim, produzir uma trama eficiente. Se hoje há um excesso de sagas e prolongamentos desnecessários, com histórias normalmente com 4 a 6 partes no mínimo, é sempre positivo observar como, ainda que seja uma frase exageradamente batida, o menos é mais. Em somente três partes, a dupla cria uma boa trama investigativa, explora os conceitos tradicionais da personagem e ainda não se prolonga além do necessário, resultando em uma história robusta que se não tem certa visão cerebral como se tem dos quadrinhos atuais, é divertida ao extremo.