Embalado por uma trilha sonora singular, que varia entre o rock’n roll clássico, folk e um bocado de blues, os solos de guitarra e a base do baixo ajudam a aumentar o odor de gasolina, assim como o incômodo gosto de sangue que teima em predominar nos lábios, após sucessivos embates físicos, causados em sua maioria por motivos banais, como o bom e velho machismo, provocado por alguma ação que conflitava com o respeito que não foi dado em sua medida exata aqueles que protagonizam o seriado.
Sons of Anarchy usa avatares tipicamente masculinos, como a gangue de tatuados destruidores de lado que cortam o Norte da Califórnia, numa cidade fictícia chamada Charming atrás de algo, cujo objetivo ainda não é completamente revelado, pois parece ter a ver com um desejo interno e incontido. Toda a selvageria deles esconde uma vida repleta de sofrimentos e ardor na alma. Essas sensações são flagradas logo no início, ainda no piloto, que mostra o drama de Jackson Jax Teller (Charlie Hunnam), cujo drama familiar é bastante calamitoso, ao enxergar sua ex-esposa Wendy (Drea De Matteo), grávida, sofrendo uma terrível caso de overdose.
Dentro do grupo de motoqueiros é notada uma hierarquia clara, com a obrigatoriedade de ser respeitada. Por ser formado em sua maioria por “senhores” de idade avançada, com quase todos ultrapassando os quarenta, é natural que Jax não seja deles o líder, ainda que tudo leve a crer que ele possivelmente assumirá este papel de destaque. Quem dita as regras no meio dos inconsequentes homens adultos é Clarence ‘Clay’ Morrow, personagem do veterano Ron Perlman, que enfim pode interpretar um sujeito de seu tempo, um sujeito castigado pela vida e que já tem vivência o suficiente para decidir de maneira resoluta e sábia todas as diretrizes dos Filhos da Anarquia. Clay fundou o grupo junto ao pai de Jax, e por isso o encara como se fosse uma extensão de seu antigo amigo, além é claro de vê-lo como o natural sucessor como o lobo alfa da alcateia.
Problemas reais e rotineiros batem à porta dos que são flagrados pelas câmeras. Para maximizar a sensação de realidade, a lente usa artifícios de primeira pessoa, inserindo o público nos problemas dos personagens. Desde a percepção de que ser pai não era algo que Jax desejou desde o começo, até a recusa ao uso das mesmas substâncias que quase fizeram sua ex abortar. Como nas telenovelas há mil tramas paralelas, como os da mãe de matriarca dos Teller, Gemma Teller Morrow (Katey Sagal), que não cansa de dar lições de moral e de julgar seu herdeiro, ao mesmo tempo em que é casada com o melhor amigo de seu ex-marido. A frequência que faz a cama de Clay gera muitas dúvidas a sua moral, do ponto de vista ético, mas é aceitável a todos os personagens, já que o casal tem poderes máximos sobre o Clube. Partes importantes da sua intimidade são discutidas até mesmo a velhice que se aproxima, cada vez mais evidente em suas marcas de expressão e em suas transas com o chefe do bando. O fato de ser encarada pela infiéis que seguem seu marido mostra um emocional abalada, que pioraria com o decorrer dos anos.
Os diferentes núcleos coexistem de modo equilibrado e hermético, sem causar uma gangorra de importância, uma vez que foram pensados em sua origem para ser assim e extremamente calculado, para que o formato não atrapalhasse o conteúdo. A capa de violência que permeia o modus operandi meio mafioso de Sons of Anarchy não esconde o quão difícil são as questões emocionais que estes sofrem. O sangue sobre a superfície branca de pele unidos as flashs variantes entre a carbonização dos inimigos e a overdose dos que cercam Jax mostram a poesia que existe no árido universo dos anti-heróis mal encarados que protagonizam o seriado.
Apesar de ser este um universo majoritariamente masculinizado, há alguns papéis femininos de destaque, que guardam em si poder e influência quase ilimitados, seja pelos futuros nas ações dos que extorquem, pela singularidade de cada uma das personalidades ou pela vida pessoal dos mandantes do grupo de motociclistas. Gemma mostra suas garras, sempre influindo em como se dá o desenvolvimento do filho, e consequentemente, o presente de gangue. Sua preocupação é que seu filho siga os bons momentos de seu pai, e não aqueles em que ele sofreu “derrocadas. É curioso como mesmo com toda a rotina bandida, os integrantes do bando conseguem viver suas vidas de modo comum, como qualquer outro espécime comum da sociedade, frequentando festas de crianças, batizados e afins. Ao mesmo tempo que tais transições espirituais ocorrem, cada um dos personagens recorrer a droga necessária a si, para escapar da miséria em que a vida deste está, como se viver fosse um fardo demasiado pesado para si, e verdadeiramente o é.
O modo como alguns ciclos se cruzam é bastante peculiar, como os da crise que a gangue sofre por ser indiciada, por tráfico de armas, o que faz Clay ser encarcerado que ocorrem coincidentemente com a menopausa de sua esposa. A sensação de que o tempo passou e de que eles já não são mais tão “jovens” acomete os pares. Os tempos pedem por mudanças, por sucessão, isso ainda no primeiro ano de série.
A “recepção” dada a quem trai o clube é severo, já que o tratamento dado a cada um dos internos é familiar, eles não são apenas adoradores de velocidade com tatuagens e cabelos desgrenhados, a um forte sentimento de pertencimento mútuo e de interdependência. As cobranças são todas feitas em níveis pessoais. É mais que algo somente profissional, daí a veemência em tratar os assuntos de deslealdade, pois as atitudes os ferem emocionalmente.
A rivalidade entre a agente federal June Stahl (Ally Walker) e o clube aumenta com o desenrolar dos fatos do primeiro ano, fazendo desta relação algo dicotômico, por vezes até erótico, quando se põe a voluptuosa mulher diante dos machos alfa, Jax e Clay. O tratar com as mulheres é sempre uma questão delicada, especialmente para Jax, ter de lidar com sua ex saindo da reabilitação e com a situação difícil que vive com Tara Knowles (Maggie Siff) é demasiado difícil e até doloroso. O primeiro período termina em meio a uma questão deveras pessoal com Opie (Ryan Hurst), que consegue ser revertida graças a uma manobra de roteiro muito bem pensada, e claro, cabível. Os ecos desses dramas prosseguem no início da segunda temporada, sem qualquer fôlego, continuando a história exatamente da onde parou, usando uns poucos preâmbulos para introduzir o expectador na trama novamente.
A nova concorrência, formada por arianos racistas é de enfrentamento severo. A alcunha do primeiro episódio dá a tônica, Albification introduz Ethan Zobelle (vivido por Adam Arkim) e AJ Weston (Henry Rollins) que lideram o bando. Os nazistas mexem drasticamente com a rotina de Charming, e agem de modo truculento contra as lideranças de Sam Crow, tocando em pontos muito pessoais de suas vidas.
A trajetória de Jax em tentar legalizar as atividades do clube vão de encontro aos desejos de seu falecido pai, registradas em seu diário. O que deveria ser o passo de afirmação rumo o endireitamento de seus passos, acaba sendo seu erro fatal, uma vez que cobra um alto preço de sangue no decorrer do seriado.
Sons of Anarchy parece o filho ilegítimo de Easy Rider e da produção de Corman, os Anjos Selvagens, mais bastardo ainda que os originais, usando o estilo de vida em duas rodas para mostrar uma outra faceta da vida marginal, semelhante ao que ocorre entre gangues de negros, latinos e mafiosos. Seu viés é muito mais adulto e bandido que o dos filmes dos anos 60, não contém tanto experimentalismo psicodélico por ser uma evolução do conceito. É como se o “sonho” e o romantismo tivessem findado, e o que sobrou foi a dura realidade, repleta de ossos e dentes quebrados.
A crua realidade não guarda sequer as relações familiares. Os conflitos edipianos entre Jax e Clay se aprofundam, tanto pela soberania do clube quanto pelo futuro de seus negócios. O embate ideológicos se dá em muitos níveis. A situação fica tão insustentável, que os outros membros discutem o futuro deles a despeito do presidente e do vice. A força da atuação de Adam Arkim é muito grande, sua atuação apesar de comedida é muito bem pensada. Seu vilão serve muito bem a trama e não denigre o roteiro.
O desfecho do ano é bastante emocional e catastrófico, com os membros da família Teller/Morrow ou em apuros ou foragidos, com todos eles devastados emocionalmente, e reagindo de modo diverso e singular cada um. Um dos nazistas rapta Abel, o filho pequeno de Jax e isso o faz desejar estar destruído. A caçada ao menin faz todo o clube se embrenhar numa pouco consequente jornada, nada comparada a rotina deles, já que aqueles eram tempos atípicos e loucos. A intrínseca de relação de filhos tirados dos pais é algo que aumenta ainda mais o escopo de dualidade da série, até a motivação do raptor de Abel é discutível, visto que ele acredita terem sido os “Sons” responsáveis pela queda do seu menino. A montanha de sentimentos remete a Babel, uma torre que torna-se cada vez mais perigosa, quanto mais alta fica, mais indistiguível fica a fala de quem julga o próprio discurso o mais correto.
Apesar da enrolação que permeia o terceiro ano, é possível notar alguns pontos, como a necessidade de que as decisões mais urgentes tenham o martelo batido somente após a unanimidade do clube. A entrada ou exclusão de membros por exemplo. A fuga de Gemma faz o clube atravessar o oceano, atrás das respostas que tanto precisam, atrás do herdeiro, e em busca de relevar a demora com que são levadas todos os acontecimentos. A mudança de ares ultrapassa a distância geográfica entre Charming e a Irlanda, refletindo-se até na cena de abertura, que tem os acordes de guitarra substituídos por sons tipicamente irlandeses.
A estadia no Reino Unido traz a tona lembranças agridoces a Gemma, tocantes ao seu passado com John Teller, mas na maior parte do decorrer anual os eventos são arrastados e anti-climáticos, exceto pela correria desenfreada do season finale, surpreendentemente agressivo. Aos poucos, todos os perigos que poderiam inferir medo no público a respeito de seus heróis vão aos poucos caindo por terra, dando lugar a trama da quarta temporada. Neste momento, o comando policial em Charming muda, aproveitando o ensejo de estar todo o clube atrás das grades, o hiato é sentido no crescimento dos filhos de Jax e nas mudanças na zona urbana, mas é ainda mais evidente com a troca de comando nas patrulhas, que mesmo se mostrando nada coniventes com o clube, não impedem o acerto de contas deveras sangrentos dos Sons.
O retorno a ação fez com que algumas mudanças no modus operandi do clube fossem forçadas, deixando alguns dos membros da velha guarda incomodados pelo desprezo que acham estar recebendo. Paralelo a isso, os relatórios de John Teller são escrutinados por Gemma, que acredita que ou Jax ou Tara estão cientes as anotações que a entregam. Para piorar Jackson quer se retirar do grupo, para cuidar de sua família e dar vazão aos desejos de seu pai.
A descoberta dos motivos da morte de John Teller são agravados. O mergulho dentro de suas memórias registradas no diário faz com que todos que entram em contato com elas se sintam enojados. Toda a situação passa a ser ainda mais grave ao se declarar abertamente quem havia feito o trabalho. Para piorar, a situação interna só se agrava, com o começo dos negócios com os latinos (Wayans), com o transporte de coca. Bobby Munson (Mark Boone Junior) chega até a contestar a autoridade de seu presidente, em nome da segurança do clube.
A realidade é que mesmo quando os problemas sobrepõem um ao outro, as discussões e os dramas ficam ainda mais intensos e perigosos. O preço cobrado por viver dentro do clube é alto, preço de morte na maioria das vezes. Se os membros de Sons of Anarchy não caem ante a vida, as suas vidas tornam-se algo miserável, em nome da unicidade do grupo. A cisão de Jax com o MC é finalmente anunciando isso a Clay e Bobby, reconfigurando toda a hierarquia do grupo. Tudo se dissolve, Piney Winston (William Lucking) é assassinado, Otto Dellaney ( Kurt Sutter) finalmente entrega os seus por causa de promessas não cumpridas, o que faz Bobby ir preso, Clay é alvejado por Opie.
Gemma revela o segredo que havia nas cartas para seu filho, claro, escondendo toda a sua participação no assassinato de John Teller, culpando Clay por tudo, fazendo seu argumento parecer algo legítimo e baseado somente nas especulações das cartas. Os sentimentos que atacam Jackson são variados, e sua decisão (difícil) o obriga a tomar as rédeas dos SoA bem momento em que ele sairia, uma vez que o presidente está hospitalizado, e que está em vias de perecer, claro. A queda do antigo rei faz ele ter que tomar a atitude de manejar o martelo. A imagem variante entre a geração moderna e a do passado é um artifício interessante, desenhando um paralelo visual belo e maldito entre Jackson e John Teller, talvez prevendo o mesmo destino, compartilhado entre as duas gerações, uma maldição hereditária.
A presença de Clay no clube, no começo do quinto ano o faz parecer um morto andante, um esboço do que foi o líder do grupo por tantos anos. O incrível é que mesmo tentando consertar as mazelas deixadas por seus antecessores, Jax não consegue afastar o espírito da morte de perto de todos os que o envolve. Como era Michael Corleone, ele tenta sair, mas não consegue, o rastro de morte está inexoravelmente ligado ao seu destino, é um pecado de sangue, e a presença de um vilão tão forte e presente como é Damon Pope (Harrold Perrineau), ele perde ainda mais chances de conseguir se livrar do seu fardo. Nem mesmo o fantasma de seu pai é capaz de fazê-lo mudar. Jackson vê seu clube ser aprisionado e sofrer o diabo dentro do cárcere, sendo postos para lutar como gladiadores, mas não ante uma platéia enfurecida, e sim testemunhado por pessoas que temem ver o sofrimento de quem luta.
Os eventos ocorridos neste ano são muito mais violentos que todos os outros, todos os motivos estão intimamente ligados a operação dentro do clube. A relação conturbada entre Gemma e Tara dá sinais de que vai finalmente sarar, mas assim que começa a avançar, os tragicômicos acontecimentos faz com que tudo retroceda, afinal, pôr em risco as vidas de Abel e Thomas é demasiado sério, talvez até mais do que as consequências dos outros ator conturbados, pois paralelamente a isto, a sabotagem interno do MC é descoberta por Wayne Unser (Dayton Callie), quase ligando estes a quem foi de fato o mandante.
As coisas entre Clay e Jax voltam a ficar péssimas, só piorando com o tempo. Após ressurgir das cinzas, e sexagenário ex-presidente vê ruir um plano seu, deveras mal construído, especialmente por este confiar em quem não deveria. Ao descobrir tudo, Jackie consegue falar a sua “old lady” o que ele pensa a respeito de seu antigo padrasto. Após uma guerra não declarada – que se estendeu demasiado, aliás – o antigo presidente assume os seus próprios erros, sendo assim expulso. Todo o stress provindo da situação caótica em que o clube está e da perseguição que sua esposa sofre faz Jax partir para uma instabilidade mental, que passa a ser seu comportamento corriqueiro. Ele agride todos os que se opõem a ele, até sua ex-mulher, culpando-a de um modo completamente desnecessário, passando por cima da reabilitação dela.
A vivência ligada a violência em que Jackson está metido o faz ficar insensível a maioria dos dramas humanos, sejam dos que estão distantes, dos que vivem as mazelas da sociedade de Charming e mesmo aqueles que o cercam. Apesar da enorme chance de ser diferente de seus antepassados, Jax mostra ser muito semelhante aos predecessores. Tudo o que ele ama se afasta, vai para longe, e mesmo com a alternativa dele se voltar na direção dos seus, ele não o faz, seja por impossibilidades ligadas ao MC ou imbróglios legais. Ao final do quinto ano, o presidente assiste a derrocada dos outros personagens – múltiplos, e bem mais consequentes que os outros anos – de modo anestesiado. Gemma toma o lugar de Tara, na mesma posição em que a quarta temporada se encerrou, e é incrível como em cada season finale a qualidade sobe um pouco.
Como seu pai, Jax começa um diário, voltado para os seus herdeiros, contando a sua vivência, lamentando as suas perdas, seja a de Bobby como VP, ou de Tara, ainda encarcerada, não sem antes anunciar que iria para o Oregon, até sem seu marido. O modo as coisas são conduzidas pioram o escopo de violência, já que Clay é inquerido a entregar seus antigos asseclas, na prisão e Otto é perseguido por um ex-federal que consegue se alçar a um papel bem mais presente do que o de um simples coadjuvante. O círculo de relações dentro do cárcere é extremamente bárbaro, rivalizando em crueldade com a inimizade que ocorre entre SAMCRO e os irlandeses, especialmente com Galen “Galaam” O’Shay, membro do IRA vivido por Timothy V. Murphy, que por sua vez não suporta mais a arbitrariedade do presidente que exercia seu cargo desde o quinto ano.
Tara, já fora da prisão segue com seu plano de sair de Charming, fazendo alianças com pessoas que antes pareciam “mortas”, dado o sumiço que tiveram na trama. Aos poucos ela passa a não confiar mais em quem é do clã Teller, e claro, tem razões muito plausiveis e justificadas, mas que não podem ter sua vazão estabelecida, já que Galaam e Jax entram em uma guerra, quue impõe um estado de sitio a todos os que estão envolvidos com o Clube.
A crise familiar dos Teller nunca foi tão intensa, seja na disputa entre Gemma e sua nora, ou no distanciamento do casal de protagonistas. Muitos traumas acontecem sobre o seio familiar, e embaixo deles corre um terrível rio de sangue e amargura. No momento em que Jax vê a possibilidade de findar com os irlandeses, ele não titubeia, sob a ordem de que tudo foi acordado em voto – aliás, isto é repetido inúmeras vezes. Mas o ápice do ano é quando finalmente depõem o antigo rei. A cena após o martelo batido é seguida de um silêncio retumbante, sem qualquer menção a música ou trilha, somente o som ambiente, quando não o total emudecimento. O choque é dos personagens e da platéia, o preenchimento da surpresa quase inebria o público, ao mesmo tempo em que aturde alguns dos caracteres.
Ao se aproximar da season finale, Jax repete a tática que havia feito com Pope para eliminar os cabeças dos negócios ilegais dele, produzindo uma enorme matança, como a vista no Batismo escrito por Mario Puzo em O Poderoso Chefão. No entanto, o troco não demora tanto quanto na saga de Michael Corleone, uma vez que quem ele amou o apunhala de modo cruel e egoísta, em nome da paz de sua família, o que é obviamente uma questão muito contestável. A história de John Teller se repete miseravelmente com Jackson, inclusive nos relatos dos diários.
Nem reimaginando toda a saga e analisando as perdas sofridas e as mortes impingidas pelo clube poderia se encarar com naturalidade as consequências dos atos mostradas no season finale. A máxima bíblica de que o salário do pecado é a morte não poderia ser mais implacável com Jackson Teller, pôs ele se vê sem sua liberdade, sem os filhos e sem ter quem cuide de seus meninos. Mesmo os que antes estavam lá para arrumar a bagunça que o MC fazia não mais estão. O sexto ano conseguiu ser mais produtivo para o ceifeiro do que o quinto, impressionantemente. Como a trilha (sempre pontual ao longo do show) de Noah Gundersen & The forest Rangers em The Day is Gone, cita de forma muito certeiro a inexorabilidade do destino e do quanto a mudança chegou tarde a eles.
O derradeiro ano começa diferente das expectativas deixadas no último season finale. Jax está preso, executando alguns inimigos, associando-os aos nazistas. Gemma age com tamanha desfaçatez, cuidando dos netos mesmo com seus últimos atos, enquanto convive com a culpa que tenta tomá-la, motivo que a obriga a abrigar Juan Carlos Juice Ortiz(Theo Rossi). Jax logo sai da cadeia, uma vez que seu acordo passa a valer menos sem as garantias dadas a Tara.
Uma rixa com os chineses se instaura, pois Jax acredita que o responsável pelo assassinato de sua old lady foi motivada por eles. Retaliações acontecem de ambos os lados, muito sangue é derramado graças a mentira de Gemma. Nero está enfiado no fogo cruzado, vendo todos os seus negócios ruírem graças a proximidade com Sam Crow, como se a aliança entre ambos fosse maldita, trazendo o salário de morte que lhe é devido pelos pecados que cometeu.
No entanto, o receio em ter as contas acertadas com o próprio filho fazem Gemma fraquejar, cometendo o ato falho de confessar assassinato na casa de seus netos, perto do pequeno Abel, que cada vez mais estranha a falta de sua mãe. Os entes queridos do Clube vivem em perigo ainda maior do que o de costume, e eles são isolados, do resto de Charming.
Em meio a mortes de personagens importantes para toda a trama, a verdades vão aparecendo. Wendy recupera aos poucos a confiança de Jax, em virtude do modo como ela se portou e do “forçado” afastamento de Gemma das crianças, esses causados pelo comportamento depressivo de Abel, depois de saber o destino de sua “segunda” mãe. A gratidão da ex-viciada não permitia que ela tivesse um segredo tão grande com seu antigo amante.
Aos poucos as peças se mostram a Jackson, com o depoimento de uma criança e a descoberta do encobertamento de Juice. O encontro, na cadeia, entre Jackson e Juice é obviamente revelador, por mostrar que os chineses não tinham culpa, exibindo que toda a guerra foi á toa, além é claro do pesado segredo a respeito da morte de Tara.
Para quem assiste o drama completo de longe, é impossível escolher lado, uma vez que todos estão intimamente ligados para o bem e para o mal. Absorta pela culpa, Gemma conversa com o que seria o fantasma de sua nora. Convivendo com as consequências de seus atos, Jax vê tudo ruir a sua volta, entendendo aos poucos que a culpa por seu pai ter morrido não era só de Clay, tampouco de Gemma. Uma das motivações circuladas seria o suicídio, motivado pela necessidade de ver sua família e clube vivos, a despeito de sua existência. Essa possibilidade ganha cada vez mais força, especialmente após os fatídicos acontecimentos do penúltimo episódio. Nem mesmo todo o montante de corpos preparou o público para os acontecimentos, mesmo com todos os indícios apontando para isto.
Após o matricídio, Jackson tem que finalmente responder por todo rastro de corpos e claro, pela desolação de seu espírito, devastado após a execução de mais uma pessoa que ama. O destino decidido pelos presidentes dos Sons Of Anarchy de todo o país torna-se incógnito, revelado somente após o acerto de contas com seus antigos inimigos. De positivo, há o acréscimo um membro negro, rompendo com uma tradição secular de exclusão dos diferentes.
Assumir a sua fraqueza faz Jackson se diferenciar do mesmo personagem apresentado sete anos antes. A evolução, fruto do que entendeu dos escritos de John Teller o faz querer parar, para que o mesmo destino não acometesse a terceira geração de sua família, uma tentativa possivelmente tardia de salvar Abel e Thomas do destino da marginalidade, assassinato e criminalidade. A recuperação é o caminho decente para a nova Wendy, mas não é o suficiente para o protagonista.
A retirada dele “coincidiria” com o dia mal de todos os seus adversários, os homens maus. Resgatando novamente os acontecimentos do Batismo impetrado por Michael Corleone nos minutos finais de Poderoso Chefão, Jax é pela última vez o carrasco, o júri e o executor de todos aqueles que fizeram de Charming o mar de sangue que se tornou. Caberia aos seus antigos parceiros decepar a última cabeça, daquele que acumulou o maior número de assassinatos. Os meninos poderiam enfim crescer sem a presença venenosa dos membros do clã Teller, sem qualquer influência maléfica, sem um exemplo ruim a seguir.
Os corvos retomam a estrada, o asfalto rachado ganha contornos belos, como uma paixão irresistível para o antigo rei. A chegada de Mister Mayhem se dá com os braços abertos, como num terno abraço.
Nossa ..vc arrasou nesse texto …….Meus Parabéns ……..sem mais 😀
Cara, eu amei seu texto. Inteiro. Parabéns pra análise a SoA. Minha série predileta da vida.
Como diria Chibs: Disãrs… what a text, Filipe Boy!