Após toda a polêmica de Canibais – com a demora de seu lançamento no circuito de cinema dos Estados Unidos –, Eli Roth retorna a direção de longas-metragens, acompanhado do boom de cinco estúdios/produtoras diferentes, no filme que seria o mais palatável até agora de sua curta e prolífica filmografia. Bata Antes de Entrar já se diferencia de seus primos anteriores nas imagens inciais, aludindo ao ponto turístico do letreiro de Hollywood, acompanhado de uma música sentimental, movida pelo piano que introduziria a rotina de Evan Webber (Keanu Reeves) e sua bela família normativa, que em seu micromundo tem uma rotina corriqueira, sem muitas emoções.
A câmera sobrevoa o subúrbio com o mesmo piano de corda utilizado ao adentrar a casa dos Webber, fomentando a tragicomédia de uma família tradicional e ordeira, que neste filme é o principal alvo do humor ácido da filmografia de Roth. Após uma viagem da bela esposa Karen (Ignacia Allamand) – não sem antes com uma recusa ao sexo, que ativa em Evan todos os seus “instintos” animalescos e libidinais – e seus filhos, o arquiteto e ex-DJ fica solitário em sua residência, tendo que conviver somente consigo em pleno feriado de Dia dos Pais. O chamado da aventura ocorre quando ele atende a porta, e duas belas moças adentram o recinto onde vive sua parentela.
Após uma longa espera, e um jogo de sedução estabelecido, apesar de muitos pesares, as novas protagonistas Genesis e Bel finalmente conseguem seu tento, fazendo Evan ceder aos seus encantos, algo mais do que natural, uma vez que suas intérpretes, Lorenza Izzo e Ana de Armas têm a figura de sedução extrema, comum nos exemplares normalmente vistos nas fitas do diretor. Mais uma vez o cineasta apela para o sexploitation de estrangeiras, ainda que seja menos expositivo fisicamente e mais focado na discussão da moralidade textual, voltado para temas pesados como pedofilia.
A abordagem de Genesis e Bel é tratar o sexo como algo vil, resgatando a tradição dos slashers e diversos outros sub-gêneros do terror, que são sempre alvo de reverência da lista de filmes de Roth. Bata Antes de Entrar nada mais é do que outra homenagem aos filmes do cine drive-in estadunidense, onde jovens iam com seus carros unicamente para transar e consumir filmes de orçamento baixo, semelhantes a esta obra produzida em terras chilenas.
Apesar de toda a pecha de não se levar a sério – especialmente pelos péssimos momentos de atuação de Keanu Reeves –, o roteiro zomba da fragilidade da estrutura familiar do americano médio, ao mesmo tempo que faz troça da arrogância de figuras supra-seguras como o dito “herói” da jornada, fazendo de Evan o exemplo da hipocrisia tipicamente adulta, especialmente em comparação com os juvenis representados na dupla de beldades, debochando principalmente da condição de falsa humildade do homem, que unicamente por seus gostos se julga superior a tudo, estabelecendo assim um curioso diálogo com Alta Fidelidade, de Nick Hornby, que também apresenta esse estereótipo, só que de outro viés.
O gore do filme é bastante contido, mas ainda assim presente, como inúmeros outros espectros dos horror movies, como citações a personagens importantes que jamais aparecem, armadilhas malfadadas, aparições convenientes de coadjuvantes e muito sadismo nas cenas e falas de sexualidade controversa.
Os momentos finais são dedicados à desconstrução de todos os arquétipos normativos de seus epílogo, com a destruição de inúmeras peças de arte, bem como de toda a falsidade da estrutura familiar do conservador americano. O texto de Roth, Guillermo Amoedo e Nicolas Lopez é ácido, pontual, repleto de furos propositais e contestação, utilizando mcguffins que envolvem provar ou não um ponto e brincando com temas politicamente incorretos, mostrados de modo estilístico – e que funcionam caso o espectador compre a proposta de seu realizador. Considerando que esses fatores funcionem, Bata Antes de Entrar se torna uma ótima paródia dos filmes de obsessão e romances água com açúcar, tão populares em Hollywood.