Tag: eli roth

  • Crítica | O Mistério do Relógio na Parede

    Crítica | O Mistério do Relógio na Parede

    Boa parte dos cineastas cuja filmografia é rebelde vez ou outra cede aos gracejos de Hollywood e aceita fazer um filme comercial e convencional. Os maiores sucessos em bilheteria de Robert Rodriguez são da franquia Pequenos Espiões, mesmo David F. Sanbderg decidiu aceitar adaptar Shazam para o cinema, e em O Mistério do Relógio na Parede o diretor Eli Roth parece ter cedido, ao adaptar o livro de John Bellairs, que mostra a história do pequeno Lewis Barnavelt (Owen Vaccaro), um menino recém órfão, que vai morar com seu tio, um homem bastante peculiar.

    A casa de Jonathan Barnavel (Jack Black) é visivelmente diferente de todas as outras da cidade de Zebedeee, e a comunidade em volta considera o lugar mal assombrado, graças a um acontecimento misterioso do passado, além de obviamente todos acharem Jonathan estranho e excêntrico graças ao seu modo de vestir e agir. Próximo dele há a Senhora Zimmermann (Cate Blanchett), uma mulher também misteriosa. Juntos, Jonathan, Zimmermam e Lewis forma uma trupe de desajustados, cada um a sua forma, e logo eles percebem suas semelhanças.

    Há uma criação de cenário muito cuidadosa e acertada, não só da casa repleta de elementos mágicos que aos poucos se revelam como parte da trama mística, como também da escola onde Lewis estuda, com o menino sendo normalmente alvo de rejeição e bullying. A busca do garoto por aceitação apesar de óbvia faz um enorme sentido dentro da trama proposta.

    Apesar da abordagem extremamente infantil, a ideia por trás das ilusões familiares e delírios fantasiosos são levados de um modo corajoso e até arrojado em se tratando de um filme para crianças. O grande problema é a trama que se mune de muitos clichês, e a falta de um vilão realmente assustador. A participação de Kyle MacLachlan é bem sub-aproveitada, e talvez essa seja a única comparação justa deste filme com a saga Harry Potter, pois o Isaac Izard visto aqui é tão ruim quanto os vilões acessórios da saga do bruxinho, apagado e sem muita importância tendo como ponto positivo e único o fato do mal ter se originado e catalisado através da grande guerra mundial que ele travou em solo alemão.

    Mesmo com as soluções bastante óbvias do final, O Mistério do Relógio na Parede resgata um tipo de história de aventura infantil, subgênero meio em desuso no cinema dos últimos anos, mas ainda assim o roteiro de Eric Kripke (Supernatural) merecia ser melhor trabalhado, pois os momentos finais soam apressados e mal construídos, apesar de conter parte das boas e melhores piadas do filme.

    Facebook – Página e Grupo | Twitter Instagram.

  • Crítica | Desejo de Matar (2018)

    Crítica | Desejo de Matar (2018)

    Paul Kersey é um médico que somente tem olhos para duas coisas: família e trabalho. Como um exímio cirurgião, Kersey é bastante requisitado em seu trabalho, mesmo que seus plantões não sejam integrais. Enquanto está às vésperas de sair com sua esposa Lucy (Elisabeth Shue), sua filha Jordan (Camila Morrone) e seu irmão Frank (Vincent D’onofrio), ele é chamado no hospital, e um ataque acontece em sua casa durante sua ausência. Esse ataque marca mortalmente sua família e o deixa em uma situação desesperadora.

    A versão que Eli Roth constrói para o romance de Brian Garfield, já adaptado em 1974 quando foi vivido por Charles Bronson – nesse e em outras quatro continuações – leva em conta a mentalidade violenta e reacionária que tomou o mundo nos últimos tempos. O Kersey que Bruce Willis vive é pouco diferente do de Bronson, ele é bastante arquetípico, tal qual praticamente todos os outros personagens do roteiro de Joe Carnahan, aliás, o forte da adaptação claramente é o cenário desolador em que a Chicago atual está, com uma violência típica do cinema exploitation dos anos setenta e oitenta.

    Por mais que fãs mais ardorosos da cinessérie possam reclamar da mudança de profissão do anti-herói (o que é um esforço fútil, pois no livro Kersey era um contador), ela aqui faz muito sentido, uma vez que um médico especialista em cirurgias sabe como maximizar a dor daqueles que opera fora dos hospitais, ao contrário do arquiteto do primeiro filme.

    A motivação e a sedução que ocorre para o personagem começar a usar as armas que usa também é bem pensada, mostrando os comerciais caricatos e engraçados que passam na televisão americana, voltadas para os rednecks. Apesar de engraçadas e de lembrarem as propagandas de Robocop, de Paul Verhoeven, a atmosfera se torna assustadora, pois esse tipo de reclame na TV dos EUA é bastante comum. O quadro caótico que Roth pinta tem bastante ironia barata, mas também serve como denúncia a barbárie, ainda que por vias tortas, e a demonstração do quão Kersey é despreparado e tropeça em si mesmo quando comete os primeiros atos de justiçamento, e isso é o resumo do quão estúpida é a atitude de quem pensa em fazer isso.

    Para quem já assistiu Albergue, Albergue 2 ou Canibais e está acostumado a filmografia do diretor, a espera era que o gore em Desejo de Matar fosse extremamente explícito, o que poderia obviamente afastar um perfil de espectador mais sensível. Neste ponto, Roth parece ter aprendido bem com seu parceiro Quentin Tarantino, uma vez que consegue trazer esses elementos de cinema splatter de modo gradativo. As cenas onde aparecem vísceras, pescoços quebrando e afins vão subindo vagarosamente, em escalas que fazem o espectador gradativamente.

    As piadas feitas pelo roteiro seguem uma linha tradicional, de explorar os estereótipos de seus personagens, visando atingir um espectador de pensamento mais simplório. Há quem reclame de que boa parte das vitimas que Kersey executa são negros e latinos, reforçando estereótipos negativos, mas os corruptores são brancos, o que faz contradizer essa máxima identitária. Além disso, fica claro que Roth tenta atingir o que ele chama de Social Justice Warriors, muito por causa da celeuma em volta do lançamento de Canibais, acusado por ativistas de ser um retrato xenófobo sobre aldeias indígenas, atrapalhando de certa forma a recepção que o filme teve. Entre o último longa e Desejo de Matar há uma não preocupação em ser politicamente correto, e aparentemente é ainda mais proposital neste segundo, meio que em tom de vingança pessoal, o que por si só é uma atitude infantil, mas até esperada visto qual é a personalidade do diretor.

    Apesar de não ter qualquer crítica social aprofundada, a nova versão de Paul Kersey (e seus infortúnios) consegue brincar bem com a insegurança do americano médio com a morosidade do Estado em resolver o caos e a violência que tomam novamente os Estados Unidos. De certa forma, é um filme de época, como eram os longas de ação que Willis protagonizou no início de carreira, e seu papel canastrão cabe muito bem nesse conto de fadas bélico.

    Acompanhe-nos pelo Twitter e Instagram, curta a fanpage Vortex Cultural no Facebook, e participe das discussões no nosso grupo no Facebook.

  • Crítica | O Albergue 2

    Crítica | O Albergue 2

    O Albergue 2 A

    Lançado dois anos após o sucesso original da franquia – e estabilizando ainda mais a Lionsgate como casa de bons filmes de terror – O Albergue 2 marca o retorno de Eli Roth ao sanguinolento mundo estabelecido em 2005, mostrando já no início os eventos recorrentes da parte original, igualmente “apresentada” por Quentin Tarantino, que faria do jovem cineasta seu pupilo.

    Paxton (Jay Hernandez) retorna a narração dos fatos, ainda no trem que o levaria para a fuga do inferno em que ele e seus amigos se meteram. As marcas dos abusos que sofreu são vistas não somente na lembrança dos assassinatos, mas também em seus dedos decepados pelos açougueiros com tatuagens de cães na mão, unicamente para demonstrar o seu sonho recheado do terrível trauma que teve.

    Após discussões bobas, a câmera retorna às paragens europeias, focando em um novo grupo de protagonistas, uma reunião de belas mulheres amantes de arte, que se diferenciam em conteúdo dos estudantes fúteis ao estilo Euro Trip do primeiro. Whitney (Bijou Phillips), Lorna (Heather Matarazzo) e Beth (Lauren German) são pintoras, que, ao traçar quadros nus, encontram a modelo Axelle (Vera Jordanova), a qual, com toda sua lábia e sedutora figura, faz convidá-las para o mesmo hostel, para as mesmas situações, ganhando a confiança delas de modo muito suspeito, evocando segurança e bissexualidade.

    A narrativa segue igual, com doses menores de erotização explícita em um primeiro momento, por se tratar de personagens mais maduras e de backgrounds diferentes, não negando evidentemente seus apetites sexuais, mas que têm as manifestações de líbido em algo mais tímido e contido. A virada rumo ao gore acontece bastante tardiamente, quase na metade da duração total.

    No entanto, a liberação da violência é muito mais sanguinolenta já nas primeiras cenas de execução, reforçando o ideal de sexualização sacrossanta com doses cavalares de homoafetividade feminina, bem ao modo Súcubo, exatamente como visto em tantos fetiches masculinos.

    O cenário de torturas é mais variável, ainda que recorra ao ambiente “familiar” da franquia e tenha na heroína uma figura de ação muito mais enérgica do que Paxton; Beth consegue sair praticamente limpa de sua sessão, em uma cena curiosa que inverte por completo o paradigma estabelecido, além de garantir um momento de humor escrachado, conseguindo resgatar, em seu desfecho, uma faceta mais original.

    O argumento obviamente retoma semelhanças ao roteiro de O Albergue, por ser toda a equipe criativa reprisada no capítulo segundo. Mas a fita consegue ter uma identidade própria, transpirando unicidade mesmo em se tratando de uma continuação. O Albergue 2 consegue fugir da mediocridade comum as demais continuações atuais, com momentos até mais inspirados do que o original, aumentando o escopo de discussão ácida, fazendo anedotas com outros tantos grupos que discutem a hipocrisia, mas que vez por outra caem sobre esta.

  • Crítica | O Albergue

    Crítica | O Albergue

    O Albergue 1

    Começando a partir da premissa xenofóbica, tipicamente americana, de que o imaginário europeu é repleto de promiscuidade e “livre amor”, O Albergue se inicia exibindo uma futilidade atroz de turistas, que só pensam em maneiras de consumir sexo a qualquer custo. As liberais moças holandesas escondem uma estranha intensão, na verdade uma reprimenda para os bobos que buscam ficar entorpecidos e transar indiscriminadamente.

    Mochilando, Paxton (Jay Hernandez) e Josh (Derek Richardson) buscam experiências no período em que estão de férias pela Europa. Apesar da clara diferença de ethos, já que Paxton é aberto a qualquer tipo de relação com mulheres e Josh apresenta uma maior timidez, até por ter recentemente terminado um namoro, ambos só tencionam o escapismo, unidos ao islandês Oli (Eythor Gudjonsson). O roteiro de viagens muda, e eles resolvem ir até a Eslovênia, perto de Bratislava, a fim de encontrar moças de corpos esculturais e que tenham intenção de se incluir em eventuais aventuras sexuais sem compromisso.

    No caminho até o famigerado local, o trio se depara com figuras de gostos duvidosos, tendo quase uma premonição do mau agouro que viria. Decidem então se hospedar em um albergue, acompanhados por mulheres desnudas que escondem atrás da volúpia um cenário grotesco, do capitalismo, capaz de tornar infantes em marginais e moças bastante novas em viciadas, que se prostituem por muito pouco.

    Após o sumiço  do amigo estrangeiro, e uma visita ao chamado museu da tortura, a dupla de amigos fica preocupada, tentando burramente reunir as pistas que lhe são apresentadas. Um submundo de passatempos turísticos se “apresenta” diante dos olhos vendados e/ou arrancados dos arrogantes americanos, que se acham superiores aos outros homens, um parque de diversões protagonizado pelos que podem pagar para brincar de açougueiros ou cirurgiões.

    Os cenários onde ocorrem as cirurgias são cavernosos, onde a sujeira das instalações faz lembrar a imundície da alma dos que lá frequentam, dando vazão à podridão de caráter por meio da glamourização da tortura. O tom do roteiro é sério, apesar de provocar no público algumas gargalhadas involuntárias, e o gore gradativamente aumenta com o desenrolar da trajetória de Paxton. A denúncia vista em O Albergue inclui o prazer quase sexual que os  homens endinheirados tem em provocar agonia, amputamentos e dilacerações em suas vítimas compradas.

    Aos poucos, o personagem principal se vê sozinho em uma pátria que não é a sua, lidando com línguas que não entende e com idiomas de dor jamais provados, contextualizados de modo tosco pela atuação fraca de Hernandez, que se debate estranhamente ao ter seus dedos amputados. Apesar das atuações fracas, Roth consegue gerar uma atmosfera de medo e penúria, unidas a um extremo humor negro, que compreende até a tentativa vã do personagem em resgatar seus dois dedos retirados à força, na esperança de conseguir novamente uni-los ao seu debilitado corpo.

    O cinema de Eli Roth é muito reverencial, uma bela reimaginação de Evil Dead e A Noite dos Mortos Vivos. Como emCabana do Inferno, O Albergue reconta os melhores pontos de Jogos Mortais, fita do ano anterior, ainda que seu caráter seja muito mais violentamente explícito. As sensações experimentadas vão desde o desprezo pela decadência a que o homem se submete até uma sátira poliglota ao fetiche dos americanos por sangue, que tem em seu âmago a função de açougue e clínica improvisada em closes nas vítimas, que deveriam não ter outra preocupação a não ser as trivialidades cotidianas das instituições de ensino.

    Perto de completar 90 minutos de exibição, o filme se entrega ao tom escrachado, não se preocupando mais em fazer sentido em um tom mais sério, apesar de ainda guardar laços com a sanidade mental da estética padrão, tendo no sacrifício de Kana (Jennifer Lim) seu maior indício de acontecimento.

    O argumento martela no ideal do espectador a mensagem de que o vilão – escolhido como a figura do estrangeiro – enxerga as suas vítimas como meio de consumo. O discurso de um dos algozes faz ligação direta com isto, reiterando que o homem tem uma distância enorme daquilo que o mesmo ingere. O tom de profecia se torna ainda mais real, quando a presa e o membro da elite trocam seus papéis, através de uma louca inversão de valores anunciada durante e após os créditos do filme, servindo como recurso metalinguístico, uma vez que essa faceta do cinema de terror começaria a adentrar o mainstream do cinema, mantendo a essência dos efeitos práticos de Greg Nicotero, graças a figuras bastante controversas, como Eli Roth, que dedica a sua filmografia a dar eco aos desejos de quem vê na barbárie uma alternativa de prazer.

    Compre: O Albergue

  • Crítica | Bata Antes de Entrar

    Crítica | Bata Antes de Entrar

    Bata Antes de Entrar 1

    Após toda a polêmica de Canibais – com a demora de seu lançamento no circuito de cinema dos Estados Unidos –, Eli Roth retorna a direção de longas-metragens, acompanhado do boom de cinco estúdios/produtoras diferentes, no filme que seria o mais palatável até agora de sua curta e prolífica filmografia. Bata Antes de Entrar já se diferencia de seus primos anteriores nas imagens inciais, aludindo ao ponto turístico do letreiro de Hollywood, acompanhado de uma música sentimental, movida pelo piano que introduziria a rotina de Evan Webber (Keanu Reeves) e sua bela família normativa, que em seu micromundo tem uma rotina corriqueira, sem muitas emoções.

    A câmera sobrevoa o subúrbio com o mesmo piano de corda utilizado ao adentrar a casa dos Webber, fomentando a tragicomédia de uma família tradicional e ordeira, que neste filme é o principal alvo do humor ácido da filmografia de Roth. Após uma viagem da bela esposa Karen (Ignacia Allamand) – não sem antes com uma recusa ao sexo, que ativa em Evan todos os seus “instintos” animalescos e libidinais – e seus filhos, o arquiteto e ex-DJ fica solitário em sua residência, tendo que conviver somente consigo em pleno feriado de Dia dos Pais. O chamado da aventura ocorre quando ele atende a porta, e duas belas moças adentram o recinto onde vive sua parentela.

    Após uma longa espera, e um jogo de sedução estabelecido, apesar de muitos pesares, as novas protagonistas Genesis e Bel finalmente conseguem seu tento, fazendo Evan ceder aos seus encantos, algo mais do que natural, uma vez que suas intérpretes, Lorenza Izzo e Ana de Armas têm a figura de sedução extrema, comum nos exemplares normalmente vistos nas fitas do diretor. Mais uma vez o cineasta apela para o sexploitation de estrangeiras, ainda que seja menos expositivo fisicamente e mais focado na discussão da moralidade textual, voltado para temas pesados como pedofilia.

    A abordagem de Genesis e Bel é tratar o sexo como algo vil, resgatando a tradição dos slashers e diversos outros sub-gêneros do terror, que são sempre alvo de reverência da lista de filmes de Roth. Bata Antes de Entrar nada mais é do que outra homenagem aos filmes do cine drive-in estadunidense, onde jovens iam com seus carros unicamente para transar e consumir filmes de orçamento baixo, semelhantes a esta obra produzida em terras chilenas.

    Apesar de toda a pecha de não se levar a sério – especialmente pelos péssimos momentos de atuação de Keanu Reeves –, o roteiro zomba da fragilidade da estrutura familiar do americano médio, ao mesmo tempo que faz troça da arrogância de figuras supra-seguras como o dito “herói” da jornada, fazendo de Evan o exemplo da hipocrisia tipicamente adulta, especialmente em comparação com os juvenis representados na dupla de beldades, debochando principalmente da condição de falsa humildade do homem, que unicamente por seus gostos se julga superior a tudo, estabelecendo assim um curioso diálogo com Alta Fidelidade, de Nick Hornby, que também apresenta esse estereótipo, só que de outro viés.

    O gore do filme é bastante contido, mas ainda assim presente, como inúmeros outros espectros dos horror movies, como citações a personagens importantes que jamais aparecem, armadilhas malfadadas, aparições convenientes de coadjuvantes e muito sadismo nas cenas e falas de sexualidade controversa.

    Os momentos finais são dedicados à desconstrução de todos os arquétipos normativos de seus epílogo, com a destruição de inúmeras peças de arte, bem como de toda a falsidade da estrutura familiar do conservador americano. O texto de Roth, Guillermo Amoedo e Nicolas Lopez é ácido, pontual, repleto de furos propositais e contestação, utilizando mcguffins que envolvem provar ou não um ponto e brincando com temas politicamente incorretos, mostrados de modo estilístico – e que funcionam caso o espectador compre a proposta de seu realizador. Considerando que esses fatores funcionem, Bata Antes de Entrar se torna uma ótima paródia dos filmes de obsessão e romances água com açúcar, tão populares em Hollywood.

  • Crítica | O Último Exorcismo

    Crítica | O Último Exorcismo

    LastExorcism_poster

    Logo na primeira cena o cinegrafista é enquadrado no espelho, que já caracteriza o filme em primeira pessoa no formato de mockumentary, estilo muito em voga e utilizado a exaustão nos últimos, The Last Exorcism é de 2011, muito após Bruxa de Blair, Cloverfield e Rec. O personagem central é Cotton Marcus (Patrick Fabian), jocoso, um showman do “credo cristão” que não tem vergonha de se valer da ignorância de seus fiéis. Apesar disso, no início, ele não deixa claro se seu caráter é de charlatanice pura ou mesclada com um pouco de fé em Deus. Ele declara que não acredita em demônios, mas quando faz os exorcismos ele tem de fingir acreditar.

    A fé do protagonista é abalada devido a doença do seu filho, mas a manteve minimamente acesa pelo menino ter sobrevivido. Após algum tempo, através de notícias em jornais, descobriu sobre um caso de exorcismo em que um rapaz autista morrera, e Cotton decide fazer uma cruzada contra a escola de Exorcismo que o Vaticano abrira, através do documentário que estivera gravando.

    A “vítima” é mostrada como uma menina criada em um lar cristão fundamentalista, mas ainda assim, é atormentada pelo diabo – ao menos é o que acredita o seu pai. Nell, interpretada por Ashley Bell, torna toda a feitura do filme em algo relevante, aliás as atuações são pontuais em quase todos os casos, especialmente com Louis Herthum, Patrick Fabian e Calebe Landry Jones.

    Lá pelos 27/28 minutos o reverendo é mostrado montando suas arapucas de exorcismo, como cordões invisíveis, sons emulando Satanás em aparelhos de mp4. A “pilantragem” é muito semelhante a de muitos iguais brasileiros, que se utilizam da ignorância alheia e alta superstição para encher seus bolsos de dinheiro.

    Os relatos dos cidadãos comuns prestam um serviço de verossimilhança à obra, mas já foram usados tantas vezes que torna-se um recurso exaustivo. Daniel Stamm dirige seu segundo longa-metragem e até consegue prender a atenção de espectador, mesmo que seu horror movie não contenha muitos sustos.

    No segundo ato as coisas mudam, e Nell passa a dar indícios de medo, aparentemente ligada à figura paterna. O patriarca diz achar que as ações são demoníacas, mas o testemunho do irmão e do pastor local fazem levar a possibilidade para uma criação de métodos medievais, agressivos e violentos, o que causaria na menina problemas de ordem psiquiátricas, que se agravam com a descoberta de sua gravidez, especialmente com a possibilidade de incesto.

    Na última meia hora o ritmo acelera drasticamente, o que torna a trama ainda mais interessante. O conjunto de possibilidades apresenta hipóteses interessantes, que remetem até à perda da inocência, mas que se provam como falácias puras e simples. O plot twist à la Bebê de Rosemary é legal, mas falta a si a ambiguidade do clássico de Polanski. O Último Exorcismo, em última análise, é uma exploração competente do tema, mesmo sem recorrer a todos os clichês do gênero filme de exorcismo, apelando para as repetições típicas dos mocumentários.

  • Crítica | Canibais

    Crítica | Canibais

    The-Green-Inferno-by-Dan-Mumford

    A última pérola de Eli Roth, Canibais ( do original The Green Inferno), faz uma homenagem justa e muito fiel às fitas italianas de canibais, pautados numa realidade fantasiosa e absurdamente preconceituosa dos hábitos indígenas do lado de baixo da Linha do Equador. Sem realizar um filme há bastante tempo – o último, O Albergue: Parte II, havia sido registrado em 2007 – excetuando, claro, o segmento O Orgulho da Nação, em Bastardos Inglórios, o realizador demonstra que ainda possui uma mão forte para registrar o sadismo e a ferocidade inerentes e inexoráveis à existência humana.

    O roteiro escrito pelo próprio diretor em conjunto com Guilermo Amoedo (Aftershock, Que Pena tu Familia), mostra um bando de jovens idiotas e suas motivações batidas, quase todas voltadas para sexo com uma falsa capa de preocupação social. A história acompanha Justine, interpretada por Lorenza Izzo, uma menina bonita, rica, filha de um representante da ONU, que se aproxima de um grupo de ativistas por simpatizar com a figura de seu líder, Alejandro, Ariel Levy. A motivação banal cobra o seu preço e logo ela se vê viajando até o Peru para defender uma tribo indígena da extinção, acompanhada é claro por um grupo de jovens tão alienados quanto ela, com direito a estereótipos raciais e arquétipos toscamente construídos – tudo é feito sem razão aparente e zero motivação lógica, exatamente como os filmes trashs que o cineasta tenciona homenagear.

    O grupo que tenta levar a civilização americana aos pobres latinos não fica impune e tem seu avião abatido, aparentemente por acidente, caindo na selva amazônica. O show de xenofobia se agrava, mostrando os nativos como seres sem escrúpulos, primitivos, religiosos e claro, canibais. O show de goire é muito bem registrado, o elenco de desconhecidos é maltratado, dilacerado, decepado, tem seus órgão vitais postos a mostra, membros cortados ainda vivos e mais um sem número de barbaridades que tornam a fita incomodamente hilária para quem tem estômago fraco, mas que constitui um verdadeiro deleite para o cinema de mal gosto.

    Eli Roth mostra muita evolução na maneira de filmar, desde as cenas de tortura lancinante, até os registros no interior do avião com a gravidade em estágios anormais, numa “belíssima” cena de vômito em que os fluidos tomam a direção vertical a norte – sensacional, além, é claro, de brincar com a visão tosca do estadunidense médio sobre os perigos estrangeiros, tema abordado antes em seu Hostel. A câmera na mão emula a sua referência óbvia aos mockumentaries como Canibal Holocausto, não que isso seja um demérito, visto que sua habilidade de registro é primoroso.

    Se há alguma inteligência no roteiro, esta se esconde atrás dos diálogos absurdamente engraçados, em especial os de Alejandro, que revela a real intenção do ato rebelde como uma encenação para desviar os olhos da mídia do trabalho de seus contratantes. O mais tresloucado e sem noção do grupo – que em determinado momento se masturba na jaula para aliviar a tensão, claro recebendo a reprimenda de seus colegas – é por incrível que pareça o mais lúcido, ao dizer “Acha que o governo não sabia de 9/11, ou que ele combate o tráfico de drogas? Bons e maus são farinha do mesmo saco!

    A tribo de Yajes é um show a parte. Suas mulheres são recatadas e cobrem seus seios, mesmo que nenhuma seja esteticamente apetitosa, aliás, a única crítica negativa a obra é a quase que completa ausência de nudez. Como já era de se esperar, os jovens vão morrendo um a um, até que só sobre a protagonista, que em seu relato final exime os nativos da culpa, negando que eles sejam canibais, para no final, ela enxergar nos seus colegas de faculdade, camisas com a foto de Alejandro, seu nêmesis, como uma inspiração a la Che Guevara. Eli Roth mostra que está em sua melhor forma, trazendo o melhor produto de sua pequena porém relevante filmografia, superior até mesmo a Cabana do Inferno. Canibais é uma ode ao cinema exploitation, além de consistir num dos filmes mais engraçados de 2013.