As informações do filme de Hideo Nakata começam através das ondas e tubos de uma televisão antiga, típica dos anos noventa. Os primeiros momentos de Ring: O Chamado já estabelecem qual seria o instrumento de horror, mostrado duas meninas – Tomoko Oishi (Yûko Takeuchi) e Masami (Hitomi Satô) – que assistem televisão enquanto discutem sobre uma fita cassete que a primeira assistiu, para logo depois, ocorrer já o primeiro óbito. Ring: O Chamado seria o primeiro filme da saga da fita que fazia seus espectadores morrerem, resultando em um fenômeno pop do terror contemporâneo.
A tal gravação gera uma curiosidade tremenda em todos os personagens, especialmente nos que fazem de seu ofício e função desvendar mistérios. As passagens de tempo mostram a como parte da imprensa lida com o boato a respeito das mortes, e é nesse ínterim que Reiko Asakawa (Nanako Matsushima) é introduzida e elevada ao posto de protagonista da trama.
Ao contrário do que normalmente ocorre nos filmes norte-americanos de gênero terror, nesse não há uma preocupação em se estabelecer uma história maniqueísta, de luta contra o bem e o mal, tampouco os personagens que são vítimas são mostrados em atitudes imorais, ao contrário, são pessoas ditas normais.
O livro de Koji Suzuki já havia sido adaptado para o audiovisual em um telefilme, mas ganhou notoriedade graças a inventividade de Nakata, que consegue imprimir suspense e tensão mesmo nos pequenos elementos narrativos da história, seja nos closes rápidos nos corpos deformados das vítimas, ao estilo Sergio Leone, ou o uso de elementos tão corriqueiros como fonte de tormento. Há um uso forte da trilha sonora como efeito atemorizante e da estática das TVs, imitando o clássico Poltergeist: O Fenômeno, de Tobe Hooper e Steven Spielberg, ainda que o conteúdo de real amedrontamento esteja na metalinguagem de um filme que assassinará aqueles que assistem, fortificada a sensação de desespero proporcionada pelo ambiente fechado e escuro do cinema.
A decisão de Reiko em procurar o vídeo que causaria o infortúnio pode ser banal e estúpido, mas condiz perfeitamente com a condição de jornalista que envolve sua profissão. O longa contém um número elevado de cenas externas de dia, fato que faz desconstruir a ideia de quem só há medo e pavor nas noites. A jornada de Reiko e seu ex-marido Ryuji Takaiama (Hiroyuki Sanada) pelo interior do país, a fim de encontrar uma fuga para a morte certa. O resultado é uma busca difícil e infrutífera na maior parte dos eventos, mas que resulta em um conjunto de respostas inconvenientes.
As questões envolvendo a história da Sadako, a tal mulher misteriosa, que buscava assassinar quem ousava ver o filme até o final é repleta de causos terríveis, mostrando o homem como a pior das criaturas, capaz de encerrar a vida até de seus entes queridos. A sensação de alívio, vista nos instantes próximos do final não duram muito tempo, relembrando o quão duro pode ser o destino, à exemplo do que aconteceu com a menina vitimada que busca na coleta de almas sua justificação. Tal prerrogativa teria que ser levada a frente, para pôr fim a maldição, fato que põe Sadako e Reiko em pé de igualdade, e mais uma vez reforça a ideia de Ring: O Chamado de que o homem tem uma forte tendência a ser misantrópico e egoísta.