Muitos dos problemas da humanidade em toda a sua história são constantes: transcendem cultura, evolução tecnológica, clima etc. Constantes também se tornam as reclamações sobre estes problemas mais comuns: “Impostos são uma praga!”, guerra, fome, disputa territorial, distribuição desigualitária de riquezas e meios de locomoção ou transporte.
Pois bem. Desde que surgiu a ideia do famigerado “Teletransporte” (ou teleporte), ele é imaginado como resolvedor das mazelas dos nossos meios de transporte atuais, dando um ponto final à questão por sua praticidade intrínseca e com resultados que poderiam ser comprovados quase que instantaneamente.
Ressalto aqui que me refiro a qualquer tipo de “transporte instantâneo” sequer imaginado, desenhado ou descrito ao longo da história da humanidade. Ou seja, aparições instantâneas carregam um conceito similar ao do nosso teletransporte moderno e maquinário. Eis aí o trunfo do teletransporte antigo ao novo. Vais entender no decorrer do texto.
O principal ponto do teletransporte moderno, que já foi experimentado e de fato funcionou (um experimento que resultou no “teletransporte” de um fóton), basicamente consiste em transmitir informações para que seja possível reconstituí-las na máquina de destino. Ou seja, não é possível transmitir ”magicamente” as mesmas partículas através do espaço-tempo de forma instântanea. O que acontece, então, com o corpo original? Pode-se dizer de forma simplista que ele é “diluído em bits/bytes” para que sejam transmitidos. Portanto, mantenha em mente este conceito para analisar o cenário aqui discutido.
Com essas informações agora transitando entre as suas sinapses neurais, eu lhe pergunto: adentraria então tal máquina, sabendo que todas as moléculas do seu corpo estão sendo pulverizadas e sendo reconstruídas em outra máquina a milhares de quilômetros de distância?! Sabendo (ou sem saber, talvez) que, mesmo que a cópia física e celular seja perfeita, você nunca irá garantir que toda a sua consciência estará intacta “do outro lado”? Pode-se o imaterial se perder durante tal transmissão de informação? É a consciência, de fato, material? Alguém tem a resposta definitiva para isso? Certo, eu sei… A certeza corre como um fóton de nossas mentes diante de tais questões.
Outro ser desceria na plataforma final. Outro ser que se passaria por mim perfeitamente, com os mesmos movimentos, jeito de agir e pensar. Nem mesmo tal replicante saberia que é uma farsa, uma cópia, que nasceu de fato apenas quando saiu da plataforma de desembarque; seria o disfarce perfeito. Quem, eu me pergunto, em sã consciência levantaria dúvidas sobre a eficácia de tal invenção e a sua perfeição ao nos transportar (copiar) para outro lugar? Ninguém o faria! E, para ser bem honesto, creio que com o tempo todos se acostumariam com isso e nem faria tanta diferença assim no resultado final sobre o curso da evolução humana. Mas, mesmo acreditando nisso, ainda me assombro com a ideia de ter o meu ser desfeito em partículas para em seguida usarem essa informação para colocarem um substituto na minha vida com a enorme chance de ninguém nunca questionar que “aquele cara” sou eu.
Correndo o risco de parecer um velho medroso quando no futuro longínquo inventarem tal equipamento, ao me negar a entrar em um deles, peço que não tomem a minha aversão por medo irracional. Longe disso, a negação raivosa que surgirá em mim se algum dia tentarem me colocar à força numa máquina dessas é provida de um pensamento cuidado sobre as diversas variáveis que envolvem o gracioso teleporte. Por isso lhe pergunto:
Entraria sem receios todas as vezes que fosse usar tamanha invenção…?
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Texto de autoria de Amilton Brandão.
Amilton mais loco que o Bátema! Muito bom o texto!
E eu entraria sem medo. Pelo simples motivo que eu acreditaria piamente que EU sairia do lado oposto do teleporte, do mesmo modo que entrei.
Talvez até por ignorância ou prepotência, que me levam a pensar que mesmo com nossas idiossincrasias, não creio que elas se devam a nenhuma configuração que passaria desapercebida, ou melhor, que não poderia ser decodificada. E se a cópia é o mesmo que meu eu anterior, sem erros, sem diferenças. Eu a considero, filosoficamente, sendo o mesmo indivíduo.
Isso tudo é claro, imaginando que a hipotética máquina tem um funcionamento perfeito. Com um ponto de exatidão que não vai deixar nenhum bit de dados, passar desapercebido.