Os letreiros do começo de A Comédia Divina avisam que a história a ser contada é levemente baseada no texto A Igreja do Diabo, de Machado de Assis. Tal associação se complica graças ao filme que Toni Venturi concebeu, não por motivos ideológicos, e sim pela concepção bem equivocada com que o novo filme do diretor de Cabra Cega traz à luz.
O espectador é apresentado ao tal diabo, vivido por um Murilo Rosa canastrão, mas que não incomoda em nada a plateia. O que de fato causa desconforto é a atmosfera criada em torno de si. O anjo decaído é mostrado com seus caricatos capangas em cenários estilizados de maneira quase mambembe. Na trama, o inimigo de Deus (interpretado por Zezé Motta) decide fundar sua própria igreja, utilizando a vida da jornalista Raquel Brackman (Mônica Iozzi) para propagar via imprensa as suas ideias e conceitos.
Iozzi tenta garantir um pouco de personalidade a sua protagonista, mas o que se vê é um sem número de situações forçadas e envolta com personagens caricatos e eventos clichês. A televisão em que Raquel trabalha é uma amálgama de características usuais de canais como SBT, Rede Globo e Record. Nem as tentativas de soar metalinguístico funcionam, causando uma comoção às avessas em quem assiste, uma vez que é bastante constrangedor acompanhar a ascensão pessoal e profissional da jornalista. Há uma tentativa fracassada de se realizar um comentário social a respeito da abordagem midiática geral, mas os argumentos, infelizmente, não passam da superfície.
Os cenários divinos contém os efeitos de animação mais sofríveis entre todos os aspectos negativos do filme, céu e inferno parecem ter sido feito por crianças que acabaram de aprender a usar as ferramentas do software flash. Ao final, há uma referência a O Sétimo Selo, trocando-se o jogo de xadrez ao jogo da velha. O resultado final de A Comédia Divina se mostra como uma versão menor e menos sofisticada de outros produtos de temática religiosa, sem qualquer traço de crítica e ausente de carisma em seus personagens.
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