Acho que esse talvez seja o filme em que Rocky perde de vez a sua identidade. Nos dois primeiros filmes, vemos o personagem sempre lutando pra se estabelecer, seja financeiramente, como um boxer de ponta ou mesmo como homem. Até mesmo no terceiro filme há uma história de superação, ainda que bem mais rasa do que nos anteriores. Porém, uma subtrama política foi incluída de forma bem hábil no roteiro. Era o final da Guerra Fria e o filme tornou-se uma grande propaganda pró-EUA. Nada melhor que o personagem que foi a personificação do sonho americano para fazê-la.
Desde o início estabelece-se a campanha pró-EUA. Com o surgimento de Ivan Drago (Dolph Lundgren), tido como um super-humano criado em laboratório, os soviéticos são demonstrados como os grandes vilões do mundo, sempre frios, arrogantes e calculistas, enquanto os americanos se portam sempre como os grandes mocinhos do planeta. O auge desse duelo se estabelece na trágica luta entre Apollo Creed (Carl Weathers) e Drago. Apollo aparece como uma alegoria do Tio Sam e o ginásio está todo decorado com motivos americanos. Isso tudo se agrava com o show de James Brown e a música “Living in America”. Chega um pouco de falar sobre o duelo EUA x URSS. Vamos falar um pouco do filme.
Sylvester Stallone assume o leme da direção pela terceira vez e novamente demonstra bastante competência. Sly demonstra grande talento ao filmar as sequências de ação do filme, tais como a luta de Apollo e Drago, toda a montagem de treinamento em que são sobrepostas as técnicas de Rocky e do pugilista soviético e na luta final dos dois. Essa última sequência merece destaque, pois Balboa e Ivan Drago são frequentemente retratados como dois titãs dos ringues. A luta chega a ser exagerada em vários momentos, mas o diretor/ator evita que tudo caia no ridículo. Toda a parte sentimental, ainda que mais rasa do que em momentos anteriores, sofre um trato bacana por parte de Stallone, com o ponto alto ocorrendo na cena em que Balboa sai de casa para poder pensar sobre a morte de Apollo e ponderar a respeito da luta com Drago.
Com relação ao roteiro, a mudança de tom do drama para a ação acaba deixando alguns personagens mais rasos, principalmente o protagonista. Rocky não tem mais que batalhar pra conseguir migalhas de dinheiro, o que faz com que ele torne quase um bobalhão esbanjador. Beira ao ridículo a empregada-robô que Rocky presenteia seu cunhado Paulie. Outro absurdo do roteiro é Rocky Jr. ficar completamente sozinho nos EUA enquanto toda a família Balboa parte para a União Soviética. Só nos resta pensar que a empregada-robô ficou cuidando do garoto. Só que uma questão interessante é levantada pelo roteiro: Drago é um atleta desenvolvido em laboratório que faz uso absurdo de anabolizantes durante seu treinamento. Recentemente, aconteceram denúncias sobre o doping de atletas russos e uma enorme investigação está em curso, uma vez que as tais denúncias poderão confirmar suspeitas que existem desde a década de 80.
Encerrado com um discurso pró-EUA dotado de pieguismo e propaganda, Rocky IV cumpre bem o que se propõe. Um filme de ação com um certa profundidade emocional que funciona como uma diversão escapista, mas o que cumpriu com louvor o objetivo de ser um panfleto ideológico.