Em cenários e épocas diversos, uma série de personagens carismáticos e movidos a forças estranhas e emoções fortes, vivem histórias que o narrador viu, ouviu falar ou até viveu. Não são exatamente contos, pois a estrutura narrativa pende mais para o lado da crônica. São crônicas do cotidiano ambientadas em sua maior parte na orla carioca misturando realidade e ficção na medida certa.
Filha vira cafetina para chantagear o pai!
Filho faz filme erótico sobre a vida da mãe!
Candomblé: corno recebe santo sem querer!
Largou o marido para consolar o viúvo da filha!
Sexo, politica e futebol na ditadura argentina!
Pai e filha no motel assaltado. Cada um com seu amante!
Ladrões de conversas atacam em Paris!
Mas falar que são histórias do cotidiano não reflete 100% o conteúdo. O projeto gráfico, que remete às manchetes de jornais e revistas sensacionalistas, já indicam que os “causos” estão longe de ser triviais. Os protagonistas das histórias são, na maioria, pessoas comuns em situações incomuns. E é aí que está a excelência de Nelson Motta, ao contar cada uma delas numa linguagem coloquial, como se estivesse numa conversa de bar.
Qualquer contador de histórias que se preze – já dizia Nelson Rubens – aumenta, mas não inventa. Assim, por mais improváveis que pareçam, ainda há certa verossimilhança. O leitor ainda se pega pensando “É difícil, mas poderia acontecer”. Usando o humor como argamassa, o autor explora as várias facetas da natureza humana, indo da bizarrice à putaria com a mesma desenvoltura.
As crônicas são independentes, com personagens diferentes. Mas as histórias finais amarram e entrelaçam os personagens entre si. Essa estrutura de fix-up acaba parecendo forçada, quase um deus ex-machina, já que ocorre de forma abrupta e pouco natural. Seria suficiente que a “amarração” se desse apenas pelo narrador do conto final, que explica como descobriu as outras histórias. Infelizmente, a tentativa de interligar os personagens revela-se canhestra e superficial, em vez de ser o ponto alto do livro. Mas mesmo assim, o texto tem a seu favor a habilidade de Motta em “trazer” o leitor para dentro da narrativa, dando o tom malandro e familiar capaz de causar identificação do leitor com as situações vividas pelos personagens.
O que é realidade e o que é ficção em cada história? Pouco importa. Vai do leitor. A linha entre o real e o imaginário depende da vivência de cada um.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.