Nove entre dez críticos ao abordarem uma obra de Antonio Prata iniciam a análise a partir de sua árvore genealógica. Se o talento é um gene passível de ser transmitido de pai para filho, é difícil não mencionar o pai Mario Prata – um dos cronistas que se adequam ao epíteto de um dos mais talentosos do país – ao iniciar uma conversa sobre Antônio. Embora seja uma raridade a filiação na literatura, há bons exemplos consagrados como Alexandre Dumas e Alexandre Dumas Filho, Stephen King e Owen King, e outras duplas que comprovam a teoria da evolução pelo meio da narrativa.
Vencedor do prêmio Jabuti em 2010 na categoria Crônica, Meio Intelectual, Meio de Esquerda, lançado pela Editora 34 é uma reunião de crônicas que, como toda boa crônica, dilui qualquer definição de gênero. Sempre considerada como um gênero menor, uma afirmação vinda até mesmo de estudiosos da literatura, a crônica sempre foi uma espécie de patinho feio literário. Devido a seu formato breve, a necessidade de uma contextualização de fatos presentes na mídia, e outras definições de manuais, definiu-se que ela é uma narrativa datada e, portanto, menor.
Porém, uma constatação rápida em grandes cronistas do país como Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Nelson Rodrigues e Mario Prata, demonstram que a afirmativa é uma definição simplista. Embora os autores dialoguem em maior ou menor grau com um fato observado, o estilo e a visão única de cada autor é que o marca a solidez do texto, mesmo fora de seu tempo.
Nas quase 80 crônicas que compõe o livro de Prata, essas anteriormente lançadas em jornais e revistas, não são os fatos cotidianos e midiáticos o enfoque do autor, como uma crítica fundamentada sobre o mundo. Mas os fatos miúdos da vida, as reflexões que surgem ao acaso em uma tarde ensolarada, o caminho repetido que fazemos durante anos no carro sem nunca se questionar o porquê e outras análises que mostram a complexidade natural de cada um de nós.
Com uma prosa rica e bem-humorada, o autor transforma pequenas observações em análises poéticas em meio a um mundo caótico. Demonstrando precisão ao abordar com qualidade tais temas em textos tão breves, De fato, não soubesse o leitor que se trata de um livro de crônicas, muitas das narrativas poderiam ser chamadas de contos pela abordagem temática e lírica de momentos que, ao menos uma vez na vida, todos irão passar: a espera de uma ligação, as brigas que acontecem por um motivo estúpido, a imaginação que não cessa ao ouvirmos os sons de nossos vizinhos.
Prata é um atento observador do mundo ao redor e um talentoso autor capaz de transmitir tais sensações em meio a um formato simples, direto e breve, divertindo e produzindo reflexões ao leitor. Meio Intelectual, Meio de Esquerda é uma daquelas seleções que demonstram a força da crônica, contrariando qualquer afirmativa de gênero menor.
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