Não é mais o que se conta, mas como. Se há algo realmente valioso em Nunca Vai Embora, da editora Companhia das Letras, é a narração mais que elegante e inebriante do jovem escritor e roteirista Chico Mattoso, dono de uma habilidade ímpar na arte de desdobrar acontecimentos e tratar reviravoltas de uma forma hipnotizante, mesmo que o romance seja de curta duração, em pouco mais de 120 páginas tão adoráveis quanto possíveis. Há então curiosidade, nisso, devido ao fato de se contar, em primeira pessoa, com desamores nestas páginas que tanto amamos adorar, enquanto as mesmas alojam a tragédia anunciada de um “amor” que começa no Brasil, e talvez, termina em Cuba.
Talvez porque ele nunca se esvai, por completo. Sem apelar para melancolias de todo gênero, Mattoso nos apresenta com grande desenvoltura, e prazer, o problemático e inseguro Renato Polidoro, menino bem educado e trabalhador, num simples consultório odontológico. Envolve-se então com Camila, estudante de cinema que, diante das reclamações do jovem e da paixão com ele, convida-o para se mudar para Havana, livrando-se de sua vida chata enquanto há tempo de mudar seu destino, sem a presença de rugas ou arrependimento, ainda. Ela, é claro, ajuda mais ele, do que o contrário, sendo que Camila não quer fugir de nada, e nutre suas paixões com mais habilidade que o garoto que vive a vida para impressionar o exigente pai. Uma vive o momento, e o outro, a procura dos finais dos seus próprios arco-íris.
Assim, o coerente Nunca Vai Embora torna-se, desde o princípio, um romance sobre busca e fuga, em todos os sentidos. Entramos de cabeça no âmago de Renato, que topa ir com a confiante (e inocente) Camila, a rainha dos sonhos, para a efervescente e saborosa Havana, com todos os seus novos personagens, cores, lógicas e sabores da vida cubana. Nota-se como os elementos mal resolvidos de uma vida nos perseguem, à medida que tentamos ignorá-los, e olhar para frente, ou pior: para o lado. Após uma forte briga terminada em sexo e culpa violentos, Renato e Camila se separam, fisicamente, e apenas fisicamente. Sob a sombra de Camila, ele vaga com outras mulheres, em balcões de bar onde se envolve em outras vidas, e outras histórias. Sempre a procura dos finais dos arco-íris que, para ele, já se apagaram no céu.
Sim, ela nunca irá embora para Renato, pois a chama verdadeira não se apaga, passe o tempo que for. Renato, todavia, inseguro e ainda destemido, com amigos que tentam abrir seus olhos sobre os efeitos do mundo para um homem que se compromete a enfrentá-lo, e nele viver, fica em Havana e lá estabelece suas expectativas sem fim, suas impulsividades e alegrias ocas, dessas que acabam no piscar de uma madrugada. Sua vida é a de um poeta triste, sem forças para mudar a situação, o que nos convoca a refletir: vale a pena viver do passado, por mais glorioso que este possa ter sido? Mattoso e seus personagens falam por si só, e nesta voz nos embriagamos em uma deliciosa leitura rápida, e reflexiva, em prol de possíveis releituras desta aventura “a dois”.
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