No prefácio da edição nacional de O Beco do Pânico, de Clovis Levi, livro originalmente lançado em Portugal, onde foi muitíssimo bem-sucedido, e que chegou ao Brasil pela Globo Livros, Jairo Bouer aponta a dúvida como ponto focal da trama. A interpretação me parece acertada, e, ao longo dessa pequena história que explora os infindáveis questionamentos de Caíque, um adolescente de classe média alta, a incerteza será de fato o fio condutor.
Namorando a garota mais bonita da escola, mas se vendo subitamente atraído pelo professor de Teatro, nosso protagonista, tido por todos como um pegador, começa a questionar sua sexualidade – fato que, atrelado a outros males da idade, como o desinteresse pelos estudos, a dificuldade de diálogo com os pais e mesmo a revolta juvenil sem objetivo claro, dá ao leitor a dimensão da confusa psique de um jovem que, como quase todos os outros, não sabe ao certo quem é.
E a multiplicidade não se encontra apenas nos dilemas de Caíque. É impressionante o número de temas tratados por Clovis Levi, que, trabalhando uma gama enxuta de personagens, consegue trazer às páginas desde a ambígua relação que até hoje temos com a Ditadura Militar, na figura do autoritário e intolerante Barbosa, avô de Caíque, até as diferenças de classe que assolam todos os cantos da nação, representadas por Cuca Fresca, o favelado melhor amigo de nosso herói. Contudo, essa vastidão de assuntos abordados acaba por configurar antes uma falha que uma qualidade; o 11 de setembro, bullying, homofobia, preconceito étnico – nada parece escapar à ânsia de Levi de enriquecer sua história, o que, por fim, torna superficiais quase todas as reflexões alcançadas sob o prisma adolescente dos narradores.
E embora suas construções psicológicas sejam louváveis, a forma como esses adolescentes efetivamente se expressam passa grande estranheza e, vale dizer, simplesmente não condiz nem com a realidade nem com o universo no qual se encontram. Onde já se viu, por exemplo, um jovem repleto de revolta, como é Caíque, no momento de extravasar essa ira utilizar de jargões como “Vai se catar”?
Ao ler O Beco do Pânico, o leitor se depara com uma trama que gira em torno de dúvidas, e, como não poderia deixar de ser, sai com algumas delas em aberto. É uma pena que, ao concluir suas 111 páginas, talvez a única dúvida que realmente o incomode seja: valeu a pena?
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Texto de autoria de Alexandre “Noots” Oliveira.