Muitas pessoas possuem um certo problema em relação à expectativa de obras e produções. De forma geral, ao assistir um bom trailer você imagina que será um bom filme, o que curiosamente, na maioria das vezes o que ocorre é o contrário ou quando algo é muito recomendado e você já espera muito da obra. Bulldogma, de Wagner Willian, consta em várias listas de melhores de 2016, logo ao lê-lo já se espera muito, e o mais gratificante é que os quadrinhos de Willian te entregam tudo aquilo que prometeu.
A sinopse bastante simples, acompanha um momento atribulado, em vários sentidos, da vida da publicitária Deisy Mantovani e de seu cachorro. Momento esse que coincide com a compra de um apartamento que foi vendido, pois o antigo morador acreditava que alienígenas faziam abduções por lá. Há uma certa pitada de ficção-científica, de maneira quase subliminar.
Contudo, a simplicidade acaba na sinopse, pois com o que a gente se depara em Bulldogma pode ser taxado de várias formas, menos como simples e deve ser visto em várias camadas de interpretação.
A primeira delas é a da própria vida de Deisy, com a construção de uma realidade crua e bastante factível, onde se pode ver os problemas ligados ao mundo do trabalho e, principalmente, as sacanagens decorrentes deste. Apesar de diferentes profissões é muito fácil se identificar com pessoas sacanas que já te passaram para trás em algum momento de sua carreira. Além disso, a relação com amigos; festas e excessos; como sexualidade de uma pessoa que sente o peso do mundo, de suas escolhas e de como as coisas já não são mais tão simples quanto poderiam ser.
Também deve se destacar uma séries de sonhos/pesadelos, como que visões que fazem parte da vida da protagonista. Difícil definir ao certo, mas soando como um tipo de surrealismo que nós acompanhamos em determinadas páginas. Inclusive, apesar de ser uma HQ bem grande é importante a realização de sua leitura mais de uma vez, já que muitos destes momentos requerem uma atenção extra e certos detalhes podem não ser percebidos em uma primeira leitura. Vale até dizer que em determinados momentos não se trata de uma leitura fácil. Pense na leitura de Bulldogma, como a leitura de um livro, um pouco de concentração é importante. Para quem já leu Sandman, essas passagens remetem bastante a sua irmã mais jovem, Delírio.
E não poderia deixar de citar o cãozinho de estimação da protagonista, que está presente em vários momentos da estória e funciona ora como ponte de diálogo para com os leitores, ora como sensação de paranoia, como que se o animal estivesse sempre observando a protagonista nos momentos em que ela está em casa. A relação dela como o animalzinho é também bastante interessante e crível.
Outro ponto fundamental, se não aquele que mais me chamou a atenção foi a estrutura narrativa estabelecida pelo autor. Tanto as soluções gráficas quanto as das partes escritas são bem elaboradas, com paginas interessantes e bastante originais. A forma como o uso de novas tecnologias é feito, diálogos que fogem dos balões tradicionais, e principalmente, como o autor trabalha alguns monólogos da protagonista, soando como verdadeiros diálogos com o leitor. Tudo impressiona pelo cuidado e originalidade.
Enfim, não adianta ficar somente escrevendo sobre o gibi, comprem, leiam e tirem suas próprias conclusões!
PS: o autor criou uma página na internet https://bulldogma.wordpress.com/ com material extra e complemento para discussões do quadrinho. Trata-se de uma obra que foge das páginas e ganha complementos em outra mídia.
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Texto de Autoria de Douglas Biagio Puglia.
Muito bom. Façam mais resenhas sobre quadrinhos nacionais.
Pode deixar, Alex. Aos poucos vamos publicando mais coisas 😉