Mundo Fantasma, HQ de Daniel Clowes que ganhou uma tradução brasileira ano passado, não conta exatamente uma história, é mais um apanhado de narrativas curtas ambientadas no estranho mundo de Enid e Rebecca.
As duas são melhores amigas recém-formadas no ensino médio, irônicas e inteligentes elas navegam entre seu mundinho particular e um desinteresse geral por todo o resto. Ao longo das histórias, as duas tentam se ajustar com a nova condição de “adultas” e como consequência acabam se separando: Rebecca arranja um emprego em uma cafeteria e um namorado e Enid, depois de não conseguir entrar na faculdade, pega um ônibus para qualquer lugar, sem saber bem o que quer fazer, mas com a eterna sensação de não se encaixar.
Um dos elogios feitos frequentemente a Clowes é o como um homem de 30 anos consegue capturar com precisão o universo de duas meninas adolescentes e eu vi ali, em cada uma, mas principalmente na relação entre elas, muito da minha própria adolescência. Há uma concorrência sutil entre Enid e Becky (elas disputam principalmente a atenção de Josh, um amigo de quem ambas gostam sem admitir) que não nasce por competitividade e sim por insegurança. Além disso ele retrata muito bem o incômodo entre querer a atenção de garotos e ao mesmo tempo não querer ser a menina que se esforça para isso, ou acha-los idiotas e ainda assim querer que eles te achem interessante.
Talvez, independente do sexo, essas sejam as ambiguidades de qualquer adolescente e é isso que Clowes traz tão sensivelmente nas suas histórias e no seu traço. “Mundo Fantasma” é sobre os incomodos e as mudanças necessárias para se achar seu lugar no mundo e também sobre como as vezes encontrar esse lugar demora bem mais do que se esperava.
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Texto de autoria de Isadora Sinay.