Tabloide é uma novela gráfica que propõe perceber a realidade como fruto de um mundo tão absurdo, que chega a ser surreal. A mesma realidade dos jornais de todos os dias, sobre crimes e a alta do dólar. O mundano que jornalistas reviram para encontrar a próxima polêmica, o próximo escândalo, o novo crime nem tão perfeito assim que as pessoas comentam nas redes sociais, e no ônibus indo trabalhar. Quando a realidade é munição, é bom que ela seja a mais potente e incrível possível, uma vez que plantar fatos é antiético e pode dar muito mais trabalho do que ir atrás do assassino de uma mulher misteriosamente afogada.
E trajando um vestido de noiva – alusão a Quentin Tarantino, talvez? Pode ser, já que muita violência e deliciosas ironias do destino (as vezes tenebrosas) não faltam nessa história de L.M. Melite, publicada em 2017 pela Editora Veneta, e com uma capa dura linda o bastante para dar inveja a outras publicações. Do crime cometido à moça numa São Paulo fiel a gigantesca metrópole de verdade, com muita gente estranha, assexuada, e muitos prédios antigos e sem vida onde se escondem mil histórias diferentes (e algumas podendo ser assustadoras), revela-se uma trama digna de filmes de espionagem com uma pista levando a outra, e até mesmo uma seita secreta debaixo da marginal do rio Tietê.
E quem matou a noiva? Samantha e Horácio vão atrás da resposta, uma dupla de jornalistas de um jornal fuleiro e mofado, farejando as pistas da notícia tal uma criança atrás do doce que perdeu. Seus estímulos são primários, e sua coragem, digna de aplausos, em especial por se envolverem com gente perigosa e esquisita a ponto de duvidarmos se os possíveis envolvidos com o crime estão mortos, ou realmente vivos. Uma dupla que nada tem a ver um com o outro, pois Samantha é brutal em seu comportamento, e Horácio muito mais cometido, e mesmo assim os dois descem até as raízes de uma bizarrice urbana chocante até mesmo para quem lida com ela, dia após dia, o que rende ótimos momentos como o encontro inesperado deles com um suspeito considerado morto, mas que virou um zumbi, a ponto de atacá-los sem dó nem piedade. Repórter sofre.
Sofre porque quem sabe do que as cidades, as relações entre as pessoas, e do que o mundo dos homens é feito, sofre – e não é pouco. Tabloide parece exclamar isso tudo, o tempo todo, enquanto evidencia por meio de boas metáforas na sua trama conspiratória de que vivemos em cima de coisas que nem sequer suspeitamos existir – e quem as conhece, dificilmente não tem a sua vida mudada. Se as coisas de fato acontecem debaixo do tapete, Samantha e Horácio são o Sherlock Holmes e o Dr. Watson que São Paulo merecia ter, indo de esquina em esquina, com seu furgão estilo Scooby-Doo, para interrogar e montar os quebra-cabeças que eles chamam de obrigação e sacrifício, e nós, de notícias a serem esquecidas. Se os agentes da informação vão sair vivos por trabalharem na linha entre a verdade, a mentira e a omissão? Eles nunca têm certeza disso, mas vale a pena segui-los nesta brincadeira para descobrir o que existe no fim da toca do coelho.
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