Crítica | Minding the Gap
Nos cenários mais injustos, Minding the Gap, o filme documentário de estreia do jovem Bing Liu teria passado batido a primeira vista. Em uma experiência própria, estranhei quando comecei a ouvir falar das boas reações que ele vinha recebendo mundo afora, parecia um simples filme sobre skatistas, o que havia em suas entrelinhas foi o que me instigou a aguardá-lo com grandes expectativas. O documentário atravessou tantas barreiras que foi um dos indicados na equilibrada categoria de Melhor Documentário do Oscar 2019 e deve ter sido um grande dia para o jovem cineasta responsável pelo longa ver onde seu projeto chegou, seu filme nasce de um desejo genuíno de gravar seu esporte favorito e no fim abraça temas mundiais.
Liu é um jovem que cresceu humildemente em Rockfort nos Estados Unidos e desde criança tem um forte vínculo com outros dois rapazes que compartilham o mesmo amor pelo skate que ele. Ele e sua câmera acompanham a intimidade desses três jovens durante alguns anos e aos poucos a realidade vai batendo na porta de cada um. Zack precisa aprender a ser responsável por outra vida, Keire reluta em encarar o futuro e Bing começa a investigar o passado para encaixar algumas peças de sua vida. Em algum momento, o documentário passa a ser sobre as pessoas que fazem esses garotos serem quem são e como a violência doméstica deixa rastros enraizados.
O longa tem uma vida crescente muito bem-vinda, o diretor ainda que deixe sua trajetória um pouco fora de plano, ganha quando seu desenvolvimento como ser-humano e como cineasta move o filme para caminhos certeiros. Por conta do acesso íntimo que ele tem com os seus amigos, suas abordagens são sempre muito naturais e as respostas soam honestas por serem reflexos de uma amizade real e antiga. E o diretor compartilha com teu espectador uma perspectiva muito interessante, seu olhar sobre seus amigos é muito acolhedor mas ele conhece as falhas de todos, assim como eles o conhecem. Então é um bom exercício assistir como o cineasta lida com os dois lados de estar fazendo um filme sobre si e as pessoas que ele ama, pois alguns podres se mostram impossíveis de ignorar no meio do caminho.
Bing começa a enxergar suas histórias atravessando os limites das individualidades e agrega novas camadas, como a sensibilidade de acompanhar a mãe do filho de Zack e ouvir a versão dela de alguns fatos, ou o enfrentamento que o jovem cineasta faz a si próprio em ouvir relatos dolorosos de sua mãe e do seu irmão. É muito claro como o filme e seu criador crescem juntos e amadurecem, o retrato que Bing faz de sua paixão, de seus amigos e das dores do fim da adolescência é quase puro, eterniza uma geração que busca por significados e carrega consigo histórias das quais não precisa reviver, mas Minding the Gap deixa claro que nem tudo na vida acontece como deve acontecer, assim como nada parece resistir ao finito.
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Texto de autoria de Felipe Freitas.
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