Crítica | Castanha
Despertando uma narrativa que desdenha da linearidade, mas que necessita dela para ser compreendida, Castanha conta um epitáfio, exibindo a história do clã que dá nome ao filme sob a ótica de um tripé: Através da matriarca, seu neto e de um dos filhos. O espécime mais contemplado pela câmera de Davi Pretto é João Castanha, um já combalido showman que se apresenta na noite gay, mas que durante o dia faz ás vezes de filho exemplar, cuidadoso com a casa e com sua mãe.
O viés escolhido pelo guião é de extensa depressão e decadência, independente do objeto analisado. Enquanto a já idosa Celina visita seus ex-amores, em condições mais insalubres que as suas, ainda convive com o vício de Marcelo (Gabriel Nunes) em crack, que consome o dinheiro e as forças da idosa, fazendo com que ela sinta-se eternamente cansada, o que interfere na vida e saúde de Castanha também.
Na cena de prólogo há uma referência do que será mostrado em tela, com um homem nu, ensanguentado, que corre pelas ruas gaúchas como se fosse perseguido por um rolo compressor, prestes a ser esmagado pela modernidade e pela urbanização, contando os maus de tempos mais frios e secos como opressores da alma humana, convenientemente interrompendo a intimidade inerente as relações pessoais.
No entanto, as escolhas do roteiro arrotam um desnecessário arremedo linguístico, exibindo clichês típicos de filmes independentes que são notórios pelo formato pouco usual, mas que no caso de Castanha, escondem uma história que seria profunda, prometendo isto, mas que não cumpre esse papel mínimo. Nem a metalinguagem de misturar cenas ensaísticas e teatrais garantem maior subsistência, tampouco garantem algo além do ordinário.
As cenas extensas buscam mergulhar na intimidade familiar, além de passear pelos corredores das atividades noturnas do personagem título, e no entanto também não acrescentam muito, nem mesmo ao exibir a fé em que João se agarra, mostrada em poucos e escassos momentos, uma representação da pouco esperança que o protagonista tem em qualquer mudança ou evolução de quadro. A inevitável velhice que o acomete faz lembrar a mediocridade a que está inexoravelmente preso, tendo somente em sua mãe – um ser simples e moralista – o porto seguro, um dos únicos momentos em que é livre de críticas e reprimendas. Tal é a influência da senhora em seu caráter, que mesmo com a vida que leva, Castanha guarda uma personalidade realista, repleta de julgamentos e preconceitos semelhante aos de cristãos fundamentalistas, até se culpando (em partes) pela trajetória trôpega sua e de seu problemático sobrinho.
A contemplação do ócio e da morte lenta provoca enfado em Castanha, e também no público graças aos excessos narrativos, quase sempre vazios de conteúdo. A obsolescência e compleição física do personagem o faz sentir um homem morto, que esqueceram de enterrar; um dinossauro que vaga pela Terra sem encontrar seu lugar ou caminho, exercendo seus últimos dias desmedidamente, sem saber qual identidade tomar.