Resenha | Tango, com Violino – Eduardo Alves da Costa
Tango, com Violino descreve o dia a dia de Abeliano, um professor de história da arte aposentado que envelheceu “ex abrupto, no momento em que se deu conta de que poderia viajar gratuitamente nos ônibus municipais”. A partir daí ele desenvolve o hábito de andar ao acaso nos coletivos da cidade, na esperança de que seu itinerário lhe revele algo inusitado. Desse modo, acaba por transformar a banalidade cotidiana em uma série de aventuras que atribuem importância a cada contato humano, a cada paisagem urbana. Alimentando-se do que vê e do que ouve, em todo ônibus que entra Abeliano vive um universo possível e fugaz, que se desfaz a cada fim de viagem para ressurgir na próxima, o que lhe possibilita “adiar o mergulho no isolamento irremediável e definitivo”.
Elogiado por Antônio Houaiss, que afirmou que sua escrita é “diabalmente aliciente”, o autor nesta obra – diferente do juvenil Memórias de um Assoviador – aborda o universo da terceira idade. O protagonista, Abeliano, com 76 anos, começa contando suas memórias. Aposentado, não sabe muito bem o que fazer com tanto tempo livre. Até que descobre as vantagens de ser velho. E a melhor delas é desfrutar da gratuidade do transporte público. Essa descoberta quebra sua rotina, acabando com o tédio.
Diferente de outras obras sobre essa fase da vida, Tango, com Violino não foca na idade, na aposentadoria, nas doenças, enfim, na velhice em si. A partir de sua “descoberta”, ele sai todos os dias passeando por São Paulo, conhecendo lugares e conversando com pessoas. E conversa com os mais variados tipos, sobre os mais variados assuntos: política, arte, filosofia, o sentido da vida. Ouve causos, confissões, o que quer que tenham a dizer ao encontrarem nele um bom ouvinte. Ocasionalmente, sai para passear “disfarçado”, com a ajuda de seu amigo Theo, que trabalha em uma loja de fantasias. E não hesita em envolvê-lo em suas brincadeiras, aproveitando-se da timidez do amigo.
“Será que você ainda não percebeu que neste país um sujeito com mais de sessenta anos adquire o dom da invisibilidade?! Você pode andar pela rua, entrar numa repartição pública, ir ao baile, almoçar no restaurante, de peruca, sem peruca ou com uma peruca de duas cores, metade ruiva, metade morena, vestido de odalisca ou pelado, que ninguém, estou dizendo, absolutamente ninguém vai botar os olhos na sua insignificante e envelhecida pessoa! Para gente como nós, meu caro, acta est fabula, a representação terminou!”
A narrativa em terceira pessoa tenta – no meu entender, de forma pouco eficiente – emular Saramago, com diálogos sem marcações. Protagonista, personagens, perguntas, respostas, tudo junto e misturado, prejudicando a fluidez da leitura. Não é apenas uma questão de habituar-se a esse formato narrativo, como nos livros de Saramago, em que bastam algumas páginas para a leitura encontrar seu ritmo e fluir agradavelmente. A voz dos personagens se misturando à voz dos demais personagens exigem atenção redobrada, o que acaba tornando a leitura cansativa, apesar de a trama ser interessante.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.
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