Crítica | Querido Menino
Querido Menino, do diretor Felix Von Groening (Bélgica e Alabama Monroe) começa com uma fala tão isolada de David Sheff que quase parece um monólogo de Steve Carrell. Em sua expressão se percebe desespero, angústia e resignação, causadas pelo sumiço de seu filho Nicolas. Entre a depressão do distanciamento emocional com seu filho – e agora físico – reside a sensação de impotência de um pai que sabe que seus erros podem ter sido o motivo do afastamento do seu primogênito, tanto de si quanto de sua família, ainda que esses erros e/ou irresponsabilidades não sejam dados de uma vez ao espectador.
A música instrumental atua numa crescente, aumentando seu volume a medida que o passado de Nic é mostrado. Com idade de 12 anos, ele é feito por Jack Dylan Grazer e parece deslumbrado com a chegada dos bebês que seriam seus irmãos. Já mais velho, o rapaz é feito por Timothée Chalamet. A delicadeza com que a história do rapaz se desenrola impressiona, não só pelo desempenho de Chalamet e Carrell, mas também pelo cuidado que a câmera de Groening possui ao retratar esse desenvolvimento familiar.
A trilha sonora tem um papel narrativo importante, sua utilização ultrapassa o simples embalar simbólico típico dos filmes premiados, pois servem como abreviações dos sentimentos e sensações não só de Nic, mas também de seu pai. Em alguns momentos, evocam a rebeldia, em outros tantos se atalham as discussões entre pai e filho e a decepção do homem mais velho, pelos rumos que a vida de seu filho está tomando.
Em alguns pontos, o roteiro de Luke Davies e Groeningen soa moralista e conservador ao lidar com os vícios de Nic, mas é até natural que isso ocorra visto que é baseado no livro de pai e filho contando tal história. Em alguns pontos a montagem soa confusa, não equilibrando os momentos de desespero dos adultos com os de curtição do jovem. A ideia de soar confuso, propositalmente, para emular a condição mental de Nicolas tem uma função narrativa clara, mas sua execução não é satisfatória. A ousadia do realizador pode ser facilmente confundida com arrogância.
De qualquer forma, Querido Menino acerta demais em seu cunho emocional e no retrato do limite das pessoas que orbitam alguém com uma adicção severa. Chalamet e Carrell estão irretocáveis, nota-se a química absurda entre os dois e a proximidade sentimental que deveria existir entre os reais. Uma fala de uma pessoa cuja família também está na reabilitação resume bem a sensação de quem sofre com um parente adicto, de que existe a sensação de luto por quem ainda está vivo, e esse talvez seja o diferencial mais óbvio deste para um Trainspotting ou Réquiem Para um Sonho, pois se trata mais de um estudo de personagem que sofre com uma obsessão do que um debruçar sobre o vício em si, e por mais que não seja tão profundo quanto as obras de Danny Boyle e Darren Aronofsky, sobra sentimento, cumplicidade e humanidade no filme de Groening.
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