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  • Review | Space Force – 1ª Temporada

    Review | Space Force – 1ª Temporada

    O governo de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos é envolto em muitas polêmicas, não só de pregação de intolerância com minorias e grupos tradicionalmente excluídos, mas também com uma negação da ciência em diversos pontos. Em um tweet, o presidente norte-americano tinha dito que viria uma nova “força” governamental, em breve, a Space Force, e a ideia de Greg Daniels (de The Office, Upload e Parks and Recreation) seria explorar essa possibilidade.

    A primeira temporada da série começa imediatamente com a promoção do general Mark Naird (Steve Carrell) ao comando da Força Espacial. Já no episódio piloto é mostrado um pouco de sua personalidade e suas trapalhadas, mas não exatamente como seu personagem Michael Scott, em The Office. Apesar de Mark ser apresentado dessa forma, ele ainda possui uma capacidade de liderança razoável e consegue demonstrar bastante bom senso, diferente de Scott.

    Grande parte da problemática da série mora exatamente nas expectativas, pois o seriado foi vendido como uma comédia rasgada e muito similar a The Office. Existem muitos elementos de humor, mas também muito drama e crítica social, fator esse que esbarra também em outro problema, a  completa falta de acidez nos roteiros.

    Há muitas piadas fracas, e uma insistência nelas, como a gag cômica do gabinete de Mark estar sempre ocupado por um visitante não anunciado. O fato de Daniels já ter experiência com séries, e de ter tido inícios ruins como foi em The Office e Parks & Recreation faz ter esperança de que a série cresça nas temporadas seguintes.

    Assim como é difícil explicar a funcionalidade da Força Espacial, é difícil também explicar se o intuito do programa é fazer rir ou não. Lisa Kudrow tem algumas das melhores piadas, e ela sequer aparece em todos os episódios. Se gasta tempo demais criando casais sem química alguma, formando relacionamentos entre pessoas que ninguém se importa, resultando num tolo e fútil esforço.

    Space Force tem dificuldade em encontrar sua própria identidade, e termina com um gancho bastante inoportuno, basicamente para ativar no espectador uma curiosidade que não conseguiu ser criada de maneira espontânea ao longo de toda a temporada. A expectativa minimamente positiva que fica é que se invista mais no desenvolvimento dos personagens, e que eles criem química naturalmente com o tempo, como ocorreu nas outras séries do criador.

  • Crítica | O Virgem de 40 Anos

    Crítica | O Virgem de 40 Anos

    Judd Apatow ficou conhecido nos anos  90 por fazer parte de uma geração de humoristas que dava muita vazão  ao improviso. Depois de participar da produção de  séries como Freaks and Geeks e Undeclared, ele se tornou diretor de cinema focado em comédias de costumes, e O Virgem de 40 Anos talvez seja a mais conhecida entre suas obras, que fala a respeito de Andy, um quarentão que tem a vida tranquila e cheia de hobbys, e que percebe que sua condição de celibatário nesta idade o faz ser completamente diferente dos demais colegas de trabalho lojistas.

    A rotina de Andy consiste nele acordando sempre sozinho com uma ereção monstra, que não cessa sequer depois urinar. Sua casa é repleta de bonecos e action figures de séries e filmes nerds  e até seus vizinhos o enxergam como um sujeito que precisa transar, mas a realidade que até o próprio protagonista é que sua vida não tem muito sentido além de ir trabalhar na loja Smarth Tech. Nesse cenário tudo é enfadonho e tende a se repetir, o show de Michael MacDonald que toca televisões grandes da loja, a convivência com o elenco de humoristas que hoje seria praticamente impossível de reunir – há Jane Lynch, Seth Rogen, Elizabeth Banks, Paul Rudd – e basicamente todos os seus colegas de trabalho tem só um sentimento por ele, que é o de ou desprezar ou ignorar ele, por ser tímido e diferente dos demais.

    Há todo tipo de dementes sexuais em volta de Stitzer, David (Rudd) não consegue superar sua ex, Cal (Rogen) se enfia em qualquer relação amorosa escatológica e Jay (Romani Malco) trai sua parceira a todo tempo, e o trio o julga, achando que pode dar dicas de vida para ele, doutrinando o sujeito na estrada que seria a vida de um homem sexualmente ativo, e esses momentos garantem momentos bem engraçados, como o sentimento de epifania que cada um tem ao perceber o óbvio, mas também revela o quão infantil é o homem heterossexual, que medem sua masculinidade pela quantidade de mulheres com que transaram na vida.

    É engraçado como o roteiro de Apatow e Steve Carrell perverte suas próprias regras, utilizando a masculinidade frágil, seus clichês e defeitos para desconstruir a visão das pessoas sobre os nerds (o ano era 2004, bem longe da alcunha soar cool como soa hoje), assim como mostra um sujeito tão sensível e respeitador que não consegue se aproximar do belo sexo. Todos os outros homens são mostrados como mesquinhos e escrotos, e os próprios verbalizam que Andy ter guardado sua essência pode ter sido algo bom.

    A comédia serve bem a Carrell desenvolver seu humor físico. Aquela altura, ele estava terminando a primeira temporada de The Office, e seu papel aqui é bem diferente de Michael Scott, embora ele também tenha um sem número de inseguranças, e lide muito mal com as mulheres. Incrivelmente ela não culpa as moças, tal qual a maioria dos celibatários fazem, isso já o faz distinguir da maioria do comportamento agressivo dos Incels, mas ele claramente tem problemas sérios.

    Mesmo sendo arisco e pouco afeito a relações, dois fatores sobressaem no modo de pensar do protagonista, sendo o primeiro o fato de apesar dele fugir da normalidade a condição de homem normal o enoja,em especial no fato da maioria dos caras tratarem as mulheres  como meros objetos, ele é diferente dos machões trogloditas que se divertem quebrando lâmpadas fosforescentes por prazer. Ele não exalar barbarismo, e isso inflige o segundo fator, ele não sente pena de si mesmo, e isso é inédito entre praticamente todos os homens em tela. Os momentos que ele se vê como o errado, são induzidos por seus novos amigos.

    A necessidade de aceitação que Andy sofre o faz cair em momentos absurdos, como quando ele vai se depilar em uma casa coreana, onde ele pragueja contra todos, ou ele agindo como um robô xavecador que faz a personagem de Elizabeth Banks se interessar por ele, onde ele não  fala e não age como um ser humano de carne e osso, tal qual a própria Beth, que também é uma caricatura de mulher. Ao mesmo tempo que isso ocorre, ele consegue ser patético e romântico ao ponto de encher o quarto de velas, virar os bonecos e retratos ao ligar uma fita de filme pornográfico, ao som de Hello de Lionel Ritchie.

    Aos poucos se percebe que a vida dos amigos supostamente mais maduros de Andy é triste, um é stalker, outro mente descaradamente para todos os conhecidos, outro não sabe lidar com sua orientação sexual, que é bissexual, aliás, todos os três funcionários da Smart Tech tem problemas em lidar com homossexualidade, e ficam fazendo piada com isso o tempo todo, mostrando que a base da sua sexualidade era insegura, Andy provoca nas pessoas uma memória, sobre suas primeiras experiências sexuais, elas são sinceras até demais consigo, mas ele não consegue ser com Trish (Catherine Keener).

    Os momentos mais ricos, irônicos e engraçados moram nas piadas de situações de suposto cotidiano, como quando Trish e Marla (Kat Dennings) discutem asperamente sobre sexo, uma vez que a filha mais nova quer fazer sexo, mas é impedida por ela. Toda a sequencia na casa da mulher e depois numa clínica de controle de natalidade é absurdamente engraçada, e mostra que a maioria absoluta dos homens mede sua força e poder pela extensão de seus pênis, e como e quando são usados.

    A única vez que Andy age como um sujeito ruim ocorre quando se sente confrontado por sua parceira, que vê o celibato como algo ruim e sente necessidade de tornar física a relação. Por mais clichê que isso seja e por mais que se apele para algo básico das comédias sexuais, sua reação é esperada, ele sem ter experiência age como se estivessem tentando extinguir o seu estilo de vida, agindo de maneira preciosista e desnecessária ao extremo. O homem volta a estágio mais básico, imaturo e irracional de sua existência.

    Evidente que ele dá vazão no final a mais piadas adolescentes, como transas de apenas um minuto, e o homem deixando a mulher estafada por ter muita energia retida enquanto ela é uma pessoa comum de meia idade. O Virgem de 40 Anos assume todo seu caráter satírico, ao mostrar os personagens cantando Age of Aquarius, como em um musical da Broadway como parte de um rito de passagem para os homens e mulheres, e por mais que seja uma comédia boba, há muito conteúdo de discussão, sem soar panfletaria ou ligada a movimentações de justice warriors, e esse é um filme muito mais aclamado por parecer um besteirol, ainda que seja uma total desconstrução disso tudo.

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  • Crítica | Querido Menino

    Crítica | Querido Menino

    Querido Menino, do diretor Felix Von Groening (Bélgica e Alabama Monroe) começa com uma fala tão isolada de David Sheff que quase parece um monólogo de Steve Carrell. Em sua expressão se percebe desespero, angústia e resignação, causadas pelo sumiço de seu filho Nicolas. Entre a depressão do distanciamento emocional com seu filho – e agora físico – reside a sensação de impotência de um pai que sabe que seus erros podem ter sido o motivo do afastamento do seu primogênito, tanto de si quanto de sua família, ainda que esses erros e/ou irresponsabilidades não sejam dados de uma vez ao espectador.

    A música instrumental atua numa crescente, aumentando seu volume a medida que o passado de Nic é mostrado. Com idade de 12 anos, ele é feito por Jack Dylan Grazer e parece deslumbrado com a chegada dos bebês que seriam seus irmãos. Já mais velho, o rapaz é feito por Timothée Chalamet. A delicadeza com que a história do rapaz se desenrola impressiona, não só pelo desempenho de Chalamet e Carrell, mas também pelo cuidado que a câmera de Groening possui ao retratar esse desenvolvimento familiar.

    A trilha sonora tem um papel narrativo importante, sua utilização ultrapassa o simples embalar simbólico típico dos filmes premiados, pois servem como abreviações dos sentimentos e sensações não só de Nic, mas também de seu pai. Em alguns momentos, evocam a rebeldia, em outros tantos se atalham as discussões entre pai e filho e a decepção do homem mais velho, pelos rumos que a vida de seu filho está tomando.

    Em alguns pontos, o roteiro de Luke Davies e Groeningen soa moralista e conservador ao lidar com os vícios de Nic, mas é até natural que isso ocorra visto que é baseado no livro de pai e filho contando tal história. Em alguns pontos a montagem soa confusa, não equilibrando os momentos de desespero dos adultos com os de curtição do jovem. A ideia de soar confuso, propositalmente, para emular a condição mental de Nicolas tem uma função narrativa clara, mas sua execução não é satisfatória. A ousadia do realizador pode ser facilmente confundida com arrogância.

    De qualquer forma, Querido Menino acerta demais em seu cunho emocional e no retrato do limite das pessoas que orbitam alguém com uma adicção severa. Chalamet e Carrell estão irretocáveis, nota-se a química absurda entre os dois e a proximidade sentimental que deveria existir entre os reais. Uma fala de uma pessoa cuja família também está na reabilitação resume bem a sensação de quem sofre com um parente adicto, de que existe a sensação de luto por quem ainda está vivo, e esse talvez seja o diferencial mais óbvio deste para um Trainspotting ou Réquiem Para um Sonho, pois se trata mais de um estudo de personagem que sofre com uma obsessão do que um debruçar sobre o vício em si, e por mais que não seja tão profundo quanto as obras de Danny Boyle e Darren Aronofsky, sobra sentimento, cumplicidade e humanidade no filme de Groening.

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  • Crítica | A Melhor Escolha

    Crítica | A Melhor Escolha

    A Melhor Escolha é o novo filme de Richard Linklater, apresentando um resgate de um cinema mais simples e pouco pretensioso, tal qual seus antigos Escola de Rock, Bernie e Jovens, Loucos e Rebeldes. Curiosamente, em Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, o diretor já resgatava elementos de “Jovens, Loucos…” e aqui compõe uma continuação espiritual de A Última Missão, dirigido por  Hal Ashby e estrelado por Jack Nicholson. Ambas produções baseadas em livros de de Darryl Ponicsan, que inclusive trabalhou com o diretor neste roteiro.  Dessa vez, a história acompanha o veterano do Vietnã Larry Doc Shepherd (Steve Carrell), que encontrará seus antigos colegas de farda, o profano Sal Nealon (Bryan Cranston) e o reverendo Richard Mullah Mueller (Lawrence Fishburne) para realizarem uma última missão juntos: velar o corpo de seu filho morto, Larry Jr., até sua terra natal.

    O reencontro do trio em 2003 sob circunstâncias pesadas põe a prova a amizade construída em solo inimigo, bem como a lealdade prometida entre os alistados. O desbocado e sempre bêbado Sal não hesita em ir com o antigo amigo para a jornada, enquanto o pastor vê nos afazeres religiosos, bem como nos problema em suas pernas, desculpas para não partir. Apesar dessas questões, ambos partem rumo a essa nova jornada, conduzida sob uma mistura de personalidades diferentes que soa muito engraçada.

    Ao ter de encontrar o corpo de seu filho – que também serviu as forças militares – Larry se depara com um ardil completamente desonesto, em que os homens de alta patente mentiram sobre o falecimento de seu herdeiro. Então, o caráter de Road movie se intensifica, com os amigos tendo de levar o cadáver do fuzileiro estrada a dentro, ignorando o que o governo poderia transportar sem custos o sujeito.

    No hall onde encontram o caixão, quem decide contar a verdade para o lutoso veterano é Sal, um homem do mundo e não o homem santo. A brincadeira com a inversão de ideais é salutar, pois funciona tanto nas questões irônicas e humorísticas como também nas mais sérias. Apesar desses conflitos, e da letargia de Larry, percebe-se uma camaradagem intrínseca entre os viajantes, como se mesmo após certo tempo, e apesar de todas as mudanças em suas vidas, não houvesse uma distância real entre os que lutaram juntos, e essa intimidade certamente se dá pelas adversidades que tiveram.

    Mesmo sem grande pretensões, com uma trama simples, Linklater propõe uma boa reflexão sobre a necessidade que os Estados Unidos tem em se embrenhar em conflitos armados desnecessários. E ainda faz uma trama que não soa panfletário, uma vez que até as reclamações são feitas por pessoas que estiveram em campo de batalha.

    Ao se aproximar do final, o filme investe bastante em melodrama para destacar ao publico que trata-se de uma obra sobre o luto. Um filme sobre perdas e como lidar com essa sensação. O memorial estabelecido é muito bonito e a musica acompanha bem o cortejo. Doc buscou forças nos homens que correram perigo junto a ele, para lidar com um mau que, apesar de não ser completamente inesperado, também não é tão comum de acontecer, uma vez que a ordem natural são os filhos enterrarem os pais e não o contrário.

    É a partir dessa tragédia que a personagem faz florescer um novo sentimento fraterno por seus irmãos de farda, não exatamente substituindo o amor que tinha por Júnior, mas ao menos ajudando-o a aplacar um pouco o amargor e a dor. É essa singeleza o melhor aspecto de A Melhor Escolha.  Muito bem construída pelo roteiro e muito bem interpretada pelo elenco veterano. Uma obra tocante que não soa piegas, apesar de sua premissa sensível.

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  • Crítica | A Guerra dos Sexos

    Crítica | A Guerra dos Sexos

    A Guerra dos Sexos, novo filme de Jonathan Dayton e Valerie Faris, diretores de Ruby Sparks e Pequena Miss Sunshine traz consigo o ambiente do tênis profissional na biografia de Billy Jean King (Emma Stone), tenista multi-campeão de Grand Slams.

    O longa em suas mais de duas horas consegue reproduzir o esporte com bastante emoção, em sequências enquadradas em ângulos que dificilmente aparecem em produtos semelhantes. Os planos abertos só não são mais poderosos graças aos dublês que pouco parecem com os atores principais, mas ainda assim há um esforço enorme em situar visualmente o espectador no auge dos anos setenta, logo após a revolução sexual. Dessa forma, todo o discurso pró-igualdade entre os sexos se torna aceitável, mesmo para as platéias mais conservadoras.

    Talvez o problema maior do longa more exatamente nessa isenção, uma vez que ele tenta fugir tanto do discurso panfletário que aparenta estar em cima do muro o tempo inteiro. O mote em cima da partida entre o tenista aposentado e showman Bobby Riggs (Steve Carrell) é sub-aproveitado, basicamente porque não há um aprofundamento nem das questões graves que lhe ocorrem e nem das pessoas que orbitam ao redor dele.

    Ainda assim, há uma carga de diversão muito forte nos dramas mostrados, sem evidentemente desrespeitar as causas levantadas. A questão é que o abuso da linguagem arquetípica suaviza o viés libertário e simbólico do produto final, fato que o faz decrescer um pouco em qualidade aos temas propostos, o que é uma pena. Mesmo as razões que faziam Riggs ser arrogante em quadra são aproveitadas sem maiores potenciais, bem como a rivalidade da protagonista com o misógino John Kramer, interpretado por um Bill Pullman que aparenta ter vergonha de dizer o texto machista que lhe foi incumbido pelo roteiro. Nesse ponto, há de pelo menos se comemorar o quão repleto de barbaridades eram os assuntos e argumentos ditos nos anos setenta em relação a figura da mulher e as suas capacidades tanto de raciocínio quanto de competitividade, o que ainda assim é muito pouco para um projeto tão ambicioso.

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  • Crítica | A Grande Aposta

    Crítica | A Grande Aposta

    A Grande Aposta 1

    Baseado em uma premissa humorística, tomando por base a pré-crise financeira que acometeu os Estados Unidos em 2008, A Grande Aposta brinca com o mercado de especulação, usando a bolha imobiliária como ponto de partida de seu drama. O lugar comum da jornada ocorre a partir da visão privilegiada de Michael Burr (feito por um Christian Bale inspiradíssimo) que percebe a aproximação do período terrível para a economia mundial.

    A direção surpreendente de Adam McKay consegue reunir na louca história escrita por ele e Charles Randolph (Sexo, Amor e Outras Drogas) – na adaptação do livro de Michael Lewis, o mesmo autor de Moneyball e Um Sonho Possível – um elenco prolífico e muito talentoso. Outros especuladores, liderados por Steve Eisman (Steve Carell) percebem as mudanças do mercado, mas demoram a ceder aos encantos de Greg Lippman (Ryan Gosling), um sujeito sorrateiro e falacioso, que pioneiramente se atenta para os investimentos que sobreviverão ao ambiente quase apocalíptico que se aproxima.

    A experiência em comédias rasgadas, aliadas quase sempre a Will Ferrell, a exemplo de O Âncora e Tudo Por Um Furo, credenciam o diretor a conduzir uma paródia do efervescente mundo de Wall Street, com uma perversão metalinguística, evoluindo o conceito aberto anteriormente por Martin Scorsese em O Lobo de Wall Street, e uma marca pessoal curiosa, atribuída ao seu produtor, que também atua no filme. Além de um Brad Pitt mais preocupado em equilibrar todas as forças da fita do que tornar seu personagem no galã que comumente apresenta.

    O argumento, jocoso em essência, apresenta um mundo masculinizado, se assemelhando em espírito ao universo proposto por Andrew Dominik em O Homem da Máfia, ainda que seja o cinismo, e não a crueldade, a mola motriz da política do filme. Há alguns momentos de interrupção da trama, apresentando a quebra da quarta parede, unicamente para demonstrar ao espectador que toda a realidade exposta ali é digna de risos, com piadas do sofrimento alheio.

    Dentro do trabalho dos homens de Eisman há um bocado de sequências cafonas, apelando para um sentimentalismo extremamente barato. Olhar para este aspecto como um simples erro, ou tentativa de redenção aos homens cheios de retórica, é uma atitude banal, já que a intenção do texto em fazer tais apelos é aludir à necessidade que as cobras têm em gerar esperança em seu público, povo e consumidores, associando ao jogo político um sentimento que em nada condiz com a realidade e com o pragmatismo com que um regime governamental é levado.

    A estilização dos barões industriais não esconde as suas reais intenções, tampouco salvaguarda os exploradores de seus pecados, ao contrário, humanizando os personagens reais, mostrando-os com defeitos, amores não correspondidos e problemas pessoais, aproximando o espectador de uma história praticamente inacreditável por meio de atuações que beiram a perfeição, com um elenco tão afinado que rivaliza com o recente Spotlight – Segredos Revelados em talento conjunto, ainda que sua trama necessite ainda mais desse aspecto do que o filme de Tom McCarthy, diferenciada em praticamente tudo se comparada com seus primos premiáveis. McKay produz uma comédia negra, que em suma desconstrói todo o seu esforço em sua filmografia anterior, já que este é seu produto mais visceral, realista, pessimista e cru.

  • Crítica | Foxcatcher: Uma História Que Chocou o Mundo

    Crítica | Foxcatcher: Uma História Que Chocou o Mundo

    Foxcatcher 1

    O piano que predomina na trilha remete a uma singeleza espiritual bastante diferente dos golpes presentes nos membros superiores e inferiores dos personagens de Foxcatcher, nova aventura de Bennet Miller na direção. A história, baseada em eventos reais, começa exibindo a rotina de Mark Shultz, interpretado por Channing Tatum, claramente afetado pelas condições que envolvem o proceder das lutas, com o pensamento e modo de caminhar afetados pelos materiais comuns aos lutadores profissionais, e abalado emocionalmente pela ausência de seu irmão, Dave (Mark Ruffalo). A presença do caçula, em um discurso em uma escola primária, já prenuncia a tragédia que ocorrerá na família, sem necessidade de sinopse ou qualquer aviso prévio.

    Mark e Dave trabalham arduamente em um ginásio, onde as posições distintas de ambos são exibidas, mais uma vez reforçadas pelos belos ângulos em que a câmera se insere, fazendo com que cada golpe proferido e esquivado tenha texturas e significados diferentes entre si. Cada movimento exprime sentimentos, vontades e sensações diferentes, agravadas pelas diferenças entre o sonho olímpico de Mark e os rumos profissionais que Dave pensa para a dupla.

    Como se fosse um evento do destino, o cotidiano de Mark é interrompido pela ligação de um homem rico e famoso: John Du Pont, interpretado por um modificado Steve Carrell, quase irreconhecível pela maquiagem que o faz parecer um brutamontes. Seu comportamento envolve alguns métodos simples, mas com uma ambição sem igual. Sua fama e ostentação material seriam frutos de um passado de investimento explorando o espetáculo das lutas pagas. Cada palavra que sai de sua boca mantém um conteúdo de motivação e inspiração, traçando paralelos entre o wrestling e as guerras travadas pelos americanos, tendo em comum a supervalorização da honra, o que claramente seduz Mark e o faz tentar conversar com seu irmão.

    A recusa da proposta causa um racha entre os irmãos, com o caçula acreditando ser o comodismo o principal fator da estabilidade, mas eles encerram as discussões em paz, cada um seguindo o seu rumo. O modo curioso como os lutadores se movimentam lembra um comportamento primário, repleto de selvageria, quase animalesco, como se seres irracionais tentassem com todo esforço possível se adequar ao mundo civilizado, invertendo o paradigma, por exemplo, de histórias como O Planeta dos Macacos.

    Aos olhos de Du Pont, o alvo prioritário era o irmão mais velho, que, preso a sua família, demonstra-se pouco seduzido pelas propostas do aposentado homem rico. As conversas, travadas entre os personagens, são quase sempre executadas sem música, em um silêncio que inquieta o espectador, maximizando a sensação incômoda ao exibir o amor de Du Pont por armas raras. Seu comportamento, passivo agressivo com os que deveriam ser seus pupilos, faz perguntar a todo momento quando será o momento em que ele explodirá, como um barril repleto de pólvora, com um furo que permite um lastro prestes a explodir e desgraçar tudo a sua volta, sob o risco de ocorrer uma fatalidade ao sinal de qualquer mínima faísca.

    Entre financiador e empregado nasce uma relação diferente, de interdependência, incluindo treinamentos físicos e um compartilhar sentimental que engloba segredos e vícios químicos, mesmo os que são tratados pelos esportistas como pecados globais. O salário desses atos logo é cobrado, com uma derrocada de seus desempenhos atléticos, e uma entrada superficial no ambiente depressivo, que faz com que seu novo mentor o deprecie, movendo seu antigo tutor para perto de si novamente. Logo, Du Pont e Dave se veem frente a frente disputando a atenção de Mark, claro, com o irmão mais próximo do protagonista, que retribui ao magnata um pouco da rejeição sofrida anteriormente.

    A preparação física do lutador é semelhante à carreira odisseica de Ulisses, pautada na superação física e mental e repleta de reveses, fazendo com que as vitórias sejam ainda mais valorizadas. O trio de personagens focados pela lente mostra indivíduos com limitações físicas e espirituais, todas contidas em tudo o que representa o grupo Foxcatcher. A entidade é claramente posta acima do fraquejar humano, perfeita, sem possibilidade de nuances humanas, o que faz dificultar ainda mais a já atribulada relação entre John e Mark, que se deteriora cada vez mais no decorrer da fita.

    As desavenças têm suas resoluções baseadas na simplicidade, sendo possivelmente resolvidas caso o estado mental dos que brigaram estivesse em perfeitas condições. O que sobra no certame é a vaidade, e a principal vítima do arbítrio gratuito, a ponta do “triângulo amoroso”, que se mostrava a mais compreensiva, paciente e condescendente.

    O tom dourado da medalha de Mark não esconde a sensação de tristeza absoluta e amargura proveniente das perdas. O andar de cabeça baixa finalmente justifica-se, possivelmente pela vergonha e culpa que sente por agir tardiamente.

    Foxcatcher é um relato sensível que confunde a ordem de seus fatores, oras sendo mais um relato de uma versão, para, em outro momento, ser uma cinebiografia realista, que resgata o sentimental de seu objeto de análise. Semelhante ao vencedor do prêmio acadêmico Capote, a obra tem o agravar de serem três os espécimes analisados pela câmera de Miller, todos igualmente interessantes e bem interpretados, vivendo em uma atmosfera crível e bastante emotiva.

  • Crítica | Procura-se Um Amigo Para o Fim do Mundo

    Crítica | Procura-se Um Amigo Para o Fim do Mundo

    Procura-se Um Amigo Para o Fim do Mundo

    A destruição como o fim em potencial sempre causa certa comoção. Seja pelo lado sensível, por uma liberdade anárquica ou o alívio de um fardo. Como nossa civilização ainda não chegou a um fim, o exercício especulativo está sempre presente em diferentes artes que sempre dão vazão ao sentimento de finitude das personagem acomodando-as em padrões. Alguns se sentindo confortáveis em realizar os trabalhos até o último minuto, outros que compreendem o fim como um espaço para mudar tudo, e seguem as variáveis.

    Em Procura-se Um Amigo Para o Fim do Mundo um meteoro colidirá com a Terra. Todas as tentativas de salvar o planeta falharam e resta apenas se conformar. Dodge é um homem solitário que representa bem sua tristeza pelo semblante. Foi largado pela mulher após o aviso do armaggedon e vive com a sensação de morrer sozinho sem ninguém para uma última despedida.

    Não há nenhum motivo evidente para que a trama utilize o argumento do fim, exceto por tentar trazer um contorno diferenciado a esta produção. Como até mesmo um estilo alternativo de narrativa se transformou em fórmula na indústria cinematográfica, a maneira que a diretora Lorene Scafaria encontrou para sua história de amor foi configura-la em um espaço finito de tempo. Elemento fatalista não muito inédito e presente, só para citarmos um exemplo bobo, em diversos romances do escritor Nicholas Sparks (todos devem se lembrar da açucarada história de Amor Para Recordar).

    No meio de seu desolamento, Dodge encontra-se com Linda, outra personagem deslocada dentro de seu mundo e que vê no fim uma oportunidade, mesmo que limitada, de recomeçar. Juntos começam uma jornada atravessando o pais para, respectivamente, procurar um grande amor e reencontrar a família. Evidente que os caminhos se transformarão em um laço amoroso.

    A necessidade de sempre se promover uma história de amor retira da trama um possível potencial positivo de apenas situar duas personagens solitários no contexto apocalíptico sem a necessidade de uma relação. Mas movidos apenas pela vontade de não permanecerem solitárias no final, com o toque de melancolia necessário.

    Curiosamente, o cineasta Lars Von Trier também realizou um exercício de destruição final em Melancolia, gerando até mesmo comparações entre sua produção e este filme. Porém, colocado de maneira tão desimportante a trama não funciona nem para gerar reflexão, se tornando mais uma história de amor que tem um leve valor pela competência de Steve Carell em fazer um perdedor, personagem que, alias, foi bem melhor executada pelo ator em Pequena Miss Sunshine.