Crítica | Passagem Para Marselha
Produção da Warner Bros, assinada inclusive por Jack L. Warner como produtor executivo, Passagem Para Marselha é uma obra de Michael Curtiz, que conta um drama de guerra, desenrolando as conseqüências dela, com a produção sendo feita em meio ao conflito dos aliados com os nazistas. O filme tem Humphrey Bogart como seu principal chamariz, no papel de Jean Matrac, um piloto que estava em combate, e que esteve na estranha Ilha do Diabo e voltou.
A narrativa começa com um letreiro, explicando as forças francesas, que resistiram em território europeu contra o avanço do Eixo. Isso tudo é acompanhado de música instrumental “inspiradora”, com hinos embalando as explicações, evocando o patriotismo típico dos tempos conflituosos, mas seu espírito é um pouco confuso, pois sua estrutura se baseia em flashbacks dos personagens, repletos de momentos confusos, que remetem a confusão comum dos que lutam as guerras mundiais. Matrac é motivo de orgulho para os que lutam consigo, mas ele mesmo parece um homem ser certezas, de olhar vacilante e postura, e não é à toa, afinal o que se vê durante o filme não é nada épico ou heroico.
A duração do filme beira as duas horas – 109 minutos, na verdade – e seus momentos mais marcantes são os resgates a náufragos e a necessitados, pessoas que sofreram demais com os conflitos as nações extremas que seguiam o III Reich. Mesmo Matrac sofre com isso, é resgatado magro, com a barba por fazer, com a compleição bem diferente do galã que protagonizou Casablanca e tantos outros filmes, mas não é só fisicamente que ele está diferente, pois alem de sua magreza, há também uma campanha de acusação, que o associa a um massacre, como suspeito direto dos assassinatos.
Além dos horrores perpetrados por Adolf Hitler e dos seus subordinados militares e pelo partido nazista, como os óbvios casos de violência e intolerâncias contra os judeus, também havia uma forte campanha de difamação, onde o foco narrativo morava em desacreditar seus adversários através de notícias falsas espalhadas, prática essa bizarramente utilizadas por linhas políticas de extrema direita na atualidade, mas que normalmente são desassociadas pelos defensores desses sectos políticos, pessoas essas que não conseguem – ou pelo menos não assumem conseguir – ver semelhanças e coincidências entre os métodos.
As acusações ao herói da jornada incluem incitamento a motins e cumplicidade a arruaças, aludindo a dois fatores primordiais, primeiro, jogando o nome do sujeito de postura até então ilibada no lixo, ao associar ele a homicídio, para logo depois trancafiar o sujeito por suposto envolvimento com causas rebeldes, tentando colocar rivalidades entre ele e o povo.
Nos vinte minutos finais, a historia se passa em uma embarcação, onde Matrac tem oportunidade de matar adversários de guerra, alvejando os nazistas mesmo com eles desarmados, em uma demonstração certeira de como se deve lidar com ameaças aos extremos da direita, uma vez que se estivessem na posição inversa, certamente não haveria paciência com os aliados, além de que em posição de desvantagem, o comportamento comum dos adeptos do fascismo é de manter-se quieto, aparentemente submisso, mas pronto para a qualquer momento destilar intolerância e seu modo de governo autoritário. O piloto, que tem um final trágico faz lembrar que mesmo com heroísmos, a guerra não retribui de maneira pacificadora aos que entram em si, condenando seus participantes, a perecer por conta de suas escolhas. Passagem Para Marselha é simples, direto, econômico narrativamente e muito certeiro no discurso anti nazismo, utilizando para isso uma inteligente inversão de expectativa, ao por Bogart que normalmente é galã como um soldado forte, complexo e nada maniqueísta ao cumprir sua intolerância com quem nada tolera.
https://www.youtube.com/watch?v=z6cQKi4A23o