Crítica | 12 de Junho de 93: O Dia da Paixão Palmeirense
O filme de Jaime Queiroz e Mauro Beting resgata as tristes memórias dos torcedores palestrinos, que amargaram uma seca de quase dezessete anos sem títulos, quebrada finalmente em 1993 através de uma geração de jogadores fenomenais. O gol de Evair liberou um grito há muito enterrado na garganta: a vontade de gritar “campeão” que teimava em não sair da boca de nenhum dos alviverdes paulistas.
Os depoimentos de torcedores ilustres revelam a ânsia dos fanáticos pela Sociedade Esportiva Palmeiras, que teve após a geração de Ademir da Guia um período de entressafra. O desmonte ocorrido após o ano de 1975 foi o prenúncio da tragédia, com as transferências internacionais de Leivinha e Luís Pereira, com poucos remanescentes, tendo Ademir e Jorge Mendonça como os principais nomes. Uma lesão faria Da Guia não ser mais o mesmo. Mal fisicamente, ele não conseguiria repetir os momentos de sucesso, sendo o Paulista de 1976 o último dos títulos por muito tempo.
Declarações do próprio Beting e de outros jornalistas, como Roberto Avallone, Paulo Vinícius Coelho (PVC) e de outras pessoas ilustres, como Paulo Nobre (atual presidente do clube), e membros das comissões técnicas, além de antigos jogadores, afirmam e reafirmam todo o sofrimento que fora aquela seca. Dentre os momentos mais melancólicos estavam a disputa contra o Corinthians, na semi-final do Paulistão de 83, o dito jogo mais roubado da história, e, claro, a final de 1986, completando uma década de jejum vencido pelo XV de Novembro de Jaú.
Pelos idos de 1991, a história começaria a ser mudada. Evair seria contratado, com o medo de ser este um jogador bichado. O atacante foi afastado por deficiência técnica, mais retornaria um tempo depois. Em 1993, viria a parceria com a Parmalat, considerada pelas narrações como a maior das parecerias esportivas da história brasileira, sob a tutela de José Carlos Brunoro. Com a contratação de grandes jogadores, como Mazinho, Edilson, Roberto Carlos, Antonio Carlos Zago, Edmundo e Zinho, o elenco passaria a enriquecer-se, tendo na chegada de Vanderlei Luxemburgo um divisor de águas, já que o promissor e moderno técnico deixou reinar a democracia pelos quatro cantos do Parque Antártica.
A história trataria de mostrar que a parceria com a Parmalat não seria um mar de rosas, mas o viés do filme era muito mais de memória afetiva que de discussão econômica, ou algo que o valesse. O caráter era de absoluta festa, até aplacarem nos torcedores dos tempos atuais as sensações de vergonha ocorridas pelo revés atual, do rebaixamento à série B, duplamente repetido.
O choro de Edmundo ao ouvir a torcida gritando “Au, au, au, Edmundo é Animal!” faz relembrar os tempos áureos do auge de sua carreira e a forma com que foi abraçado por uma torcida de um estado e cidade que o adotou como se fosse um conterrâneo. O amor do atacante seria provado em outros momentos de sua carreira, até renasceria no Palestra, após os anos 2000.
A provocação de Viola, no primeiro jogo da decisão de 1993 ecoava pela lembrança dos torcedores, jogadores e comissão técnica. A angústia causada por aquele simples gesto de imitação de um porco, após o gol, marcou a alma do palmeirense: Era como mexer com a família, como ofender de modo pessoal e íntimo. A decisão de Luxemburgo e Brunoro foi de isolar o grupo em Atibaia, para isolar o grupo dos dezesseis anos de fila, tentando eximi-los de qualquer culpa ou pressão externa.
O revide começaria com uma união muito estreita, encabeçada pelo treinador – segundo o próprio craque do time, Edmundo – passando confiança aos seus legionários, inserindo uma pilha enorme neles, elevando seu nível de concentração como se estivessem indo à guerra, sendo o estádio o grande campo de batalha, e, como leões famintos, entrariam no gramado. Evair diria que, de um jeito ou de outro, eles sairiam do Morumbi carregados.
O modo como Evair e Brunoro descrevem a finalíssima é muito emocionado: percebe-se um embargo na voz, mesmo passadas duas décadas do ocorrido. O gol de Zinho foi uma catarse, como se a zona entre o possível e o impossível fosse transposta. A emoção era tamanha que os arquibaldos mal acreditavam.
A expulsão do corintiano Henrique pioraria a situação e aumentaria as especulações em torno do “esquema Parmalat”, que seria para a manipulação do resultado, supostamente pela compra do árbitro José Aparecido, muito por conta do placar elástico que somente evidenciava a diferença da qualidade dos dois elencos.
Os versos do batedor de pênalti pareciam ser corridos a partir de 1976 para somente converterem-se em gol em 1993. Emocionado, Evair retira o peso das costas, de si e de toda a massa verde. O grande símbolo daquela época, saindo da mediocridade para finalmente ser reconhecido como um dos melhores centroavantes da história do futebol nacional. A sensação era a de que nenhum título superaria aquela festa, com a maldição encerrada contra o seu principal rival.
As últimas cenas mostram a reunião em 2011 do time campeão, encerrada com uma partida que tencionava repetir os momentos emocionantes daquele jogo, com um saudosismo que tomou cada um dos integrantes daquele mágico time, que mudou o astral e o destino de 16 milhões de pessoas. A verve de toda a torcida e dos apaixonados pelo Palmeiras é registrado de modo emotivo e comovente.