Martin Scorsese é um dos maiores cineastas da história e Os Infiltrados (The Departed, 2006) já reservou seu espaço entre as obras-primas da sétima arte. São 152 minutos de pura técnica e beleza. A história é baseada no eletrizante Conflitos Internos (2002), sucesso de Hong Kong. Mesmo não sendo material original dele, o diretor extrai originalidade, na maneira sempre cheia de frescor com que trabalha seus temas preferidos, como os conceitos de culpa, redenção e violência na sociedade norte-americana.
Personagens solitários procurando uma saída em um mundo corrompido, muitas vezes encarando seus pecados através de uma “crucificação” sanguinária, no plano metafórico. Tudo isso tangenciado com uma forte presença da religião católica, em termos de Scorsese sempre de forma conturbada, e a sombra discreta em citações de Joyce, Freud, Shakespeare e John Ford (cenas de O Delator em uma TV).
O elenco traz interpretações impecáveis, liderado por Jack Nicholson em uma atuação anti-realista, quase demoníaca, própria para emoldurar o dualismo espiritual e físico por parte da polícia e gangsteres protagonizadas, respectivamente, por Leonardo DiCaprio e Matt Damon. Isso é exemplificado na cena em que os dois são refletidos de forma fragmentada. Um espelho nefasto emprestado do universo de Hamlet.
Tecnicamente a produção reafirma, com primor, todas as idéias sugeridas pela orientação de Scorsese. Cada cena tem uma função na narrativa, sedimentando as nuances da trama. A fotografia de Michael Ballhaus enriquece cada plano com uma cor sombreada sugerindo ambigüidade em diversos personagens. A edição de Thelma Schoonmaker corrobora essa premissa com uma série de eventos que por nenhum instante deixa o espectador confuso. Os cenários de Kristi Zea nos levam para uma selva urbana e atmosférica pela dualidade de comportamento dos personagens.
Modernidade e retro se completam. Mesmo sendo encenado nos dias de hoje, sentimos um certo clima de produção ambientada nos anos 70. Época em que os filmes retratavam pessoas amorais e ambíguas sem muita preocupação com o politicamente correto. Tudo isso embalado por uma mistura de rock e ópera na trilha sonora. Os Infiltrados também marca a volta de Scorsese ao caos urbano, gênero em que ele é um mestre. Depois de realizar filmes grandiosos e de época, ele volta suas lentes para o mundo do crime repleto de gangsteres trágicos. Mas dessa vez a ação também é concentrada no dia-a-dia dos policiais. Pois “ratos” não são um privilégio exclusivo dos bandidos.
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Texto de autoria de Mario Abbade.
Adoro esse filme. Vejo pelo menos uma vez por ano.
Realmente, esse filme é bom demais…
Scorsese é foda…
E as críticas do Mario, também.
Muito bom, mesmo…
O que eu gosto nesse filme, é a dureza da realidade nas cenas de morte, sem dramatismo barato, é bruto como na vida real, é de repente, ninguém espera, sem trilha sonora pra antecipar a fatalidade é cru e foda ao mesmo tempo, gosto muito desse filme. Fala da polícia de Boston mas se contextualizasse esse filme na Civil do Rio dava jogo também…
Uma critica do Mario Abbade é sempre uma aula de cinema. Gostaria muito de ouví-lo no podcast novamente, analisando os filmes que ele assiste.
Aliás, o Mario deveria publicar um guia de Filmes para baixar, digo, para se ver antes de morrer.
Um abraço
Akira
Além de cineasta, Scorsese é um cinéfilo, um estudioso. Por isso encontramos em muitos de seus filmes, tributos a outros mestres da sétima arte. Em “Os Infiltrados”, ele presta uma homenagem a “Scarface”(o original de 1932), dirigido por Howard Hawks, através da letra X. Esse matéria do crítico de cinema Rene Rodriguez, do jornal Miami Herald, explica tudo:
http://miamiherald.typepad.com/reeling/2007/01/x_marks_the_spo.html
abs
Esse filme é demais. Adoro sentir agonia junto com o personagem do DiCaprio e ter raiva da ‘vida boa’ do personagem de Matt Damon. Sem contar o balé violento de Scorsese, Mario tem razão mesmo, por um momento vc sente q está nos anos 70 e q depois de Os Infiltrados, você também vai pegar uma sessão de Taxi Driver.