Resenha | Elite da Tropa 2 – Luiz Eduardo Soares, Rodrigo Pimentel, André Ramiro e Cláudio Ferraz
A continuação da polêmica histórica contada por Luiz Eduardo Soares (Antropólogo e ex-secretário de segurança do RJ), Rodrigo Pimentel (ex-bope) e André Ramiro (ex-bope e atual major da PM) em 2007, com o livro Elite da Tropa, retorna com seu segundo volume, acrescentando entre o time de autores, Cláudio Ferraz, delegado chefe da DRACO (Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e de Inquéritos) e peça chave no combate ao crime contra as milícias. Para aqueles que não acreditavam ser possível descer mais fundo na questão da segurança pública do que o quê já havia sido feito em Elite da Tropa, aqui nos deparamos com uma realidade muito mais cruel.
Trazendo o dia-a-dia de uma unidade tática da polícia civil, onde ainda é possível vislumbrar profissionais honestos e que se dispõe a fazer a diferença em meio ao mar de corrupção que assola a sociedade e o governo. Sob o ponto-de-vista dessas pessoas, nos deparamos com um sistema penal e judicial desatualizado, que já escancara sinais de desgaste ao longo de todos esses anos.
O protagonista e narrador do livro é um inspetor da policia civil da mesma unidade de Cláudio Ferraz, a DRACO, e com o início do livro sabemos que este está afastado da unidade devido a um acidente que o acabou deixando em uma cadeira de rodas. Com o desenrolar do livro, vamos nos informando a respeito do destino trágico que o levou aquilo, além de próprios comentários que ele vai postando no twitter (para quem quiser conferir o perfil, clique aqui) e estão ali para enriquecer a história, o que aliás foi uma grande sacada dos autores, independente do personagem ser ficcional. Uma pena esse tipo de ação ter se perdido, devido a exclusão e postagem dessas mensagens repetidamente.
Já em seus capítulos iniciais, temos um relato detalhado envolvendo todo o mistério do desaparecimento de Patrícia Franco, engenheira recém-formada que desapareceu em 2008 e estampou os jornais não só do Rio de Janeiro como do Brasil. É lógico que os autores evitaram fazer referência direta ao caso e utilizaram nomes, locais e datas falsas, mas para quem se lembra do caso é inegável não relacionar, deixando evidente sobre quem estão falando. O crime foi ato de milicianos e o livro narra com riqueza de detalhes toda a sequência de acontecimentos anteriores e posteriores à morte da jovem.
Assim como no filme, o foco do livro são as milícias do Rio de Janeiro, e temos todo um relato detalhado pelo narrador do livro de como estas começaram a se formar e toda coerção que impuseram nessas regiões, além de detalhar todo o lucro exorbitante que esta gera. A dificuldade dos policiais dispostos a combater este tipo de crime organizado fica claro no livro, seja pelos depoimentos de testemunhas, que são feitos em um dia e desfeitos no outro, devido ao medo que esse bando exerce sobre a população; seja pelo poder de influência que estas exercem sobre o poder judiciário e legislativo; ou mesmo pelo risco de contaminação que existe dentro da própria polícia, não sabendo ao certo quem é confiável o bastante para apoiar tais ações.
Da metade para o final do livro já temos nosso inspetor como um cadeirante e não podendo dar apoio efetivo na DRACO, este passa a trabalhar no gabinete do deputado Marcelo Freitas – ou se preferirem, Marcelo Freixo, deputado estadual do Rio de Janeiro pelo PSOL – que prepara uma CPI contra as milícias. Durante este trecho do livro, temos um flashback do Marcelo Freixo (desculpem, mas fico mais a vontade chamando pelo nome real), durante a famosa rebelião ocorrida em Bangu I em 2002, liderada por líderes do Comando Vermelho, entre eles, Fernandinho Beira Mar e “Escadinha”, todos com nomes alterados, logicamente, mas que nem por isso, não torna fácil a associação.
Durante esta rebelião, onde foram mortos quatro peças importantes de facções rivais, temos Freixo e um comandante do BOPE na época tentando apaziguar a situação sem chegar a extremos e nos deparamos com a então governadora, Benedita da Silva, após forte hesitação, ordenando uma chacina no presídio, através de um conselho de alguém do alto escalão do partido (supostamente, José Dirceu), mas que no entanto, foram descumpridas pelo então comandante do BOPE, o que acabou terminando de uma maneira menos brutal, sem um extermínio geral.
Histórias como essas você irá encontrar no livro, que buscam acima de tudo um compromisso com a verdade, seja ela qual for. Luiz Eduardo Soares teve o papel de escrever o livro, enquanto os outros três co-autores foram os responsáveis por fornecer boa parte de toda a fonte de pesquisa para a realização do livro, sendo um material riquíssimo sobre a organização das máfias brasileiras, que não se enganem, não estão se proliferando apenas no Rio de Janeiro, como por todo o Brasil. A narrativa está muito mais fluída e rica, fator fundamental que pecava um pouco no primeiro livro, e a escolha de um personagem central para a trama ajuda bastante no envolvimento da história. Apesar de não precisar mencionar, mas a trama tem poucas semelhanças com o filme em questão, porém, compartilham as mesmas intenções, a denúncia e a conscientização.
Elite da Tropa 2 é leitura obrigatória para entender como funcionam as engrenagens da segurança pública. Poderia defini-lo como revelador, chocante, polêmico, e outros tantos adjetivos, mas isso diminuiria o valor do livro. Leitura fundamental.