Tag: Stéphane Brizé

  • Crítica | O Valor de um Homem

    Crítica | O Valor de um Homem

    la-loi-du-marche

    Thierry (Vincent Lindon), aos 51 anos, está desempregado há mais de um ano. Tentando sobreviver com o parco seguro-desemprego, tem de sustentar a família – a esposa (Karine de Mirbeck) e um filho especial (Matthieu Schaller) – enquanto continua sua busca infrutífera por uma recolocação.

    Repetindo a parceria diretor (Stéphane Brizé) e ator de Mademoiselle Chambon, a obra é, a priori, um filme de um personagem só, já que a câmera acompanha somente Thierry, praticamente durante todo o filme. Thierry conversando com a gerente do banco; Thierry discutindo com o funcionário da agência de empresa; Thierry fazendo entrevistas via Skype; Thierry jantando; Thierry consertando uma porta; Thierry discutindo com funcionários que foram demitidos junto com ele; Thierry sendo escrutinado durante o que parece ser um treinamento sobre como lidar com recrutadores; Thierry limpando sua cozinha; Thierry dando banho no filho; Thierry tentando negociar a venda de um imóvel. Tanto é assim, que muitos personagens sequer têm nomes. Felizmente, Lindon carrega esse fardo muito bem, dando vida a um protagonista de poucas palavras ao usar expressões corporais e faciais que dão a medida exata do cansaço e da falta de perspectiva do personagem. Merecidamente, foi premiado em Cannes por sua atuação.

    O filme, a exemplo de alguns outros como Dois Dias, Uma Noite, quer ser um filme que se propõe a fazer uma crítica social. Mas fica aquém de seu intento justamente por mostrar apenas o lado de Thierry. Da forma como o personagem é explorado durante a trama, ele é apenas o oprimido pelo sistema. Sob o olhar do mercado, Thierry é incapaz. Desatualizado para continuar no emprego em que ficou durante anos. Inapto até para convencer alguém de que merece uma chance de emprego. E isso fica nítido quando seu “teste” de entrevista é dissecado pelos colegas.

    E imediatamente ao conseguir um emprego como segurança de uma loja/supermercado, Thierry passa para “o outro lado”. Nessa nova colocação, aprende a prevenir perdas na loja, observando as imagens das câmeras de vigilância, analisando a atitude dos clientes e espionando os demais funcionários. Numa das cenas em que uma funcionária flagrada embolsando cupons de desconto tentam convencer o gerente a dar um “jeitinho”, o enfoque é tal que até parece que não há problema algum em roubar, que o gerente é o vilão e a funcionária ladra é a vítima. O problema reside na inexistência de meio termo.

    Fica nítido o conflito em que Thierry se vê. Precisa do emprego, mas não gosta dele, pois é obrigado a vigiar e delatar colegas de trabalho e clientes que furtam da/na loja. Está implícito seu desconforto ao ter de acusar e culpabilizar quem cometeu os furtos. Pessoas que talvez tenham sido levadas a cometer o delito por estarem em situação semelhante à dele anteriormente. O que não justifica atitude. Lindon é bom o bastante para conseguir expressar, numa mesma cena, a empatia com o acusado e o nojo por estar ocupando uma posição em que deve julgar as atitudes alheias.

    O filme faz uma crítica social que gera reflexão, mas peca pelo seu maniqueísmo, já que ao querer defender um ponto de vista, apresenta apenas os argumentos a favor, sem permitir que o espectador tire suas próprias conclusões.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Mademoiselle Chambon

    Crítica | Mademoiselle Chambon

    mademoiselle chambon movie poster

    Baseado no livro homônimo de Éric Holder, publicado em 1997, com roteiro e direção de Stéphane Brizé, o filme conta a história de Jean (Vincent Lindon) – bom pai, bom marido, bom filho, bom pedreiro. Sua família – a esposa Anne-Marie (Aure Atika) e o filho Jérôme (Arthur Le Houérou) – tem uma vida comum, fazendo coisas comuns. Um dia, ao buscar o filho na escola, conhece Véronique Chambon (Sandrine Kiberlain), professora de Jérôme. Ela, sem raízes, violinista amadora, professora substituta de cidade em cidade. Ele, pé no chão, quase literalmente enraizado pelas fundações das casas que constrói. Dois mundos diferentes que se cruzam e se entrelaçam.

    Diz-se que todas as histórias já foram contadas e que o que varia é forma de contá-las. Neste caso, a história é o mais que manjado encontro entre pessoas de realidades diferentes que se sentem conectadas por algum motivo e que, devido a esse encontro, passam a se questionar e a questionar suas vidas. Roteiro e direção não tiveram sucesso em conseguir contá-la de modo a não parecer apenas mais um filme com essa premissa.

    Para desgosto dos detratores do cinema europeu – o francês especificamente – e para deleite de seus admiradores, a estética é típica de um filme francês. Planos extensos que, em conjunto com longos silêncios, na maioria das vezes não contribuem em nada com a história – a menos que a intenção do diretor seja entediar o espectador. Há enquadramentos precisos e planos detalhe focando em olhares e gestos quase imperceptíveis – como o momento em que Anne-Marie percebe o que está havendo. Mas isso não basta para tornar o filme memorável.

    O elenco está muito bem. Lindon dá a Jean um certo ar de “bronco sensível” bastante convincente. Kiberlain está perfeita como a professorinha tímida e contida, que não sabe ao certo como lidar com seus sentimentos. E Atika consegue dar a Anne-Marie, uma mãe de família trivial, uma altivez que a diferencia. Mas mesmo assim, com um bom elenco, com fotografia impecável, com uma trilha sonora encantadora, é quase impossível afastar a sensação de déjà-vu e a certeza de saber exatamente como a história irá terminar. Assistível, mas facilmente esquecível.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.