Crítica | Relatos do Mundo
Um desejo: eu realmente espero que todos que assistam a Relatos do Mundo, já tenham visto bons ou ótimos faroestes antes. Caso contrário, há chance de o espectador casual achar que todo western é assim: fraco, disperso e entediante. Isso porque, tirando Django Livre e Bravura Indômita, o século XXI não construiu até agora um bom histórico para essas histórias ambientadas no velho oeste, e que num passado distante, já tiveram a mesma popularidade e sucesso que a Marvel e DC têm, hoje em dia. Assim sendo, Relatos do Mundo é mais uma tentativa fracassada desse gênero tão esquecido pelo grande público, voltar à cena. Só que não: se um dia houve uma vontade de revitalizar alguma coisa ou tornar interessante as jornadas da humanidade nesse cosmos ancestral de poeira e cavalos, essa foi destruída pela direção de Paul Greengrass, ou perdida na sala de edição do filme. Nunca saberemos.
A adaptação da Netflix e Universal para o romance homônimo de Paulette Jiles é tão inovadora, e atraente, quanto um cubo de gelo na Antártida. No final dos anos 1800, os Estados (Des)Unidos enfrentavam impasses morais que mudariam para sempre a sociedade americana, e por consequência, o mundo ocidental. No ápice da polêmica sobre a abolição dos escravos no sul do país, o norte do Texas estava prestes a explodir em revolta social, e grandes mudanças na mentalidade e no bem-estar do cidadão estavam prestes a começar. Nesse clima quase instaurado de tensão pública e institucional, o homem precisa trabalhar (mesmo que num país hostil, desses), e Tom Hanks interpreta o capitão Jefferson Kidd, um veterano de guerra branco a se embrenhar nas cidades ultraconservadoras do norte, espalhando notícias de muito além da região, em troca de algumas moedas, e uma certa liberdade.
Tal um rádio ambulante, ou no contexto de 2021, um WhatsApp viajante, Kidd é um homem marcado e solitário por razões que nós nunca nos envolvemos a fundo, no filme, sendo que, aos 30 minutos de exibição, Relatos do Mundo exige que sejamos íntimos dele, e da garota alemã perdida que Kidd passa a proteger. Mas quando nem Tom Hanks, com seus olhos de tio emocionado nos convence disso, temos um problema bem na frente dos olhos. Kidd não sabe que está adotando um ímã de problemas, por onde quer que eles passem, mas nós realmente nos importamos com isso? O diretor Paul Greengrass (escolha errada para a direção) não dá a mínima para as mensagens por trás das imagens naturalistas dessa pseudo-história de perseverança, e resistência, e filma o road-movie de maneira arrastada e esquecível – apesar da excelência da parte técnica presente, em especial a dos cenários barrocos e fotografia. Relatos do Mundo parece um ensaio de um bom faroeste que, talvez, um dia, quase foi concebido.