A comédia é um gênero complexo. É mais simples suscitar a emoção comum do drama, pois é possível partir do princípio que, com frequência, medos e dramas são comuns à boa parte das pessoas. O drama, quando não sádico, tem o papel de fazer com que o espectador saia elevado do show. A comédia compartilha dessa ideia quando considera-se que, para rir, é preciso buscar a empatia do espectador, seus pensamentos secretos (a concordância ajuda na graça) e uma boa dosagem de quebra de expectativa.
A ousadia de Bo Burnham, ator, músico, sucesso no Youtube e comediante, é justamente trazer o sorriso amarelo e não condescendente do incômodo para os palcos, e para a tela da Netflix, com seu espetáculo Make Happy. Com pouco mais de uma hora de espetáculo, este é o melhor show original da rede de stream, ao lado do também excelente O namorado da Minha Namorada, de Mike Birbiglia. O que ambos têm em comum é a forma niilista e desconfiada com que trata seu público. Não que seja algo único, Chelsea Peretti, em seu especial Netflix, também deixa claro sua intenção de ser uma pulga atrás da orelha da plateia. Mas Bo Burham aproveita para manipular o público levando-o para a concordância, para então frustrar qualquer expectativa, transmitindo suas falas autodepreciativas para um aspecto universal. Make Happy não é pra deixar ninguém feliz.
Trecho de uma das músicas do show:
“Conto os meus problemas, outras pessoas reviram os olhos
Três idas ao shopping e nenhuma calça cáqui do meu tamanho
Eu nunca fui vítima de uma busca aleatória de drogas
Mas você não pode dizer que minha vida é fácil até que você tenha andado uma milha em minhas Uggs.”
Se este formato torna Make Happy um dos melhores shows da Netflix, não faz ser necessariamente o mais engraçado. Sua intenção não é gerar entretenimento, apesar de ser um espetáculo finamente ensaiado (acima de qualquer outro do gênero) e produzido de forma única, mas sim gerar uma peça de contracultura. Desta forma, usa boa parte do tempo de show e seus talentos musicais para atacar frontalmente o entretenimento e fazer refletir o por que de buscar a comédia apenas como uma ferramenta hedonista, tal qual o pornô. Satisfação pessoal não é um direito.
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Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.