John Green esteve recentemente no Brasil para divulgar, ao lado do ator Nat Wolff, o lançamento cinematográfico de Cidades de Papel, quinto romance do autor publicado no país somente em 2013 pela Editora Intrínseca. Mais do que apresentar a produção, que estreia nesta quinta-feira em circuito nacional, o autor contempla, mesmo que tardiamente, o sucesso de uma de suas obras anteriores à época em que era um dos grandes representantes do young adult.
Movimento comum no mercado editorial, nosso país recebeu primeiro sua obra de maior sucesso, A Culpa é Das Estrelas e em seguida sua bibliografia, cujo marco inicial é Quem é Você, Alasca?, seguido de O Teorema Katerine e o romance escrito a seis mãos Deixe a Neve Cair. O público brasileiro conheceu, portanto, a obra de maneira retroativa. Acompanhando sua trajetória por estas narrativas, impressiona que A Culpa é das Estrelas tenha alcançado um sucesso tão estrondoso com uma trama simples ao extremo. Considerando o público-alvo de suas narrativas, Cidades de Papel é um excelente romance de formação para jovens adultos e leitores.
Há uma fórmula pela qual Green desenvolve seus personagens além da estrutura do young adult com personagens adolescentes narrando seus feitos: o estilo e sua linguagem favorecem a credibilidade destes papeis na época da vida em que diversas crenças são destruídas e os alicerces do mundo adulto começam a se construir: a transição da convivência escolar para a graduação, a um trabalho e, consequentemente, a ampliação do universo que o cerca.
Não existe sutileza em sua obra: as personagens são simples ao extremo, e cativantes por serem normais. A normalidade, inclusive, torna-se objeto de identificação do público, que projeta seus anseios e inseguranças em cada personalidade. Mesmo a leitura feita por um adulto o levará a um momento nostálgico de sua própria história e, assim, o momento de transição se transforma em universal.
O autor apresenta um romance de tese ao público juvenil, desenvolvendo entre a trama superficial uma teoria subterrânea que dialoga sobre a maturidade da vida e as mudanças que surgem naturalmente. A história é narrada por Quentin Jacobsen, adolescente que nutre pela vizinha, Margo Roth Spielman, uma paixão platônica. Certa noite, a garota invade o quarto do rapaz convocando-a para um urgente e um engenhoso plano de vingança. Após esta noite de aventura, a garota desaparece.
O primeiro capítulo da narrativa é situado no passado destas personagens quando, ainda infantes, presenciaram um acontecimento trágico que marcou a amizade, o primeiro contato com a efemeridade da vida: um homem morto em um parque. É esta lembrança a única memória que une Quentin e Margo até o início da ação e da noite de vingança. Com o desaparecimento da personagem, o leitor conhece sua figura pelas palavras de Quentin e as demais opiniões de seus amigos. Inconformado com o desaparecimento proposital de sua amada, o garoto procura maiores informações sobre Margo e descobre que ela lhe deixou pistas de seu futuros passos. Em companhia de amigos, segue rumo à caça de seu paradeiro.
A amizade surge como um dos primeiros argumentos defendidos pelo autor. Mesmo deslocados da popularidade escolar, Quentin e os amigos Radar e Ben formam um trio, diferentes entre si mas unidos pela fraternidade. São eles que ouvem a obsessão do garoto em encontrar Margo e também apoiam-no com teorias a respeito. Enquanto, ao mesmo tempo, a mística da garota perfeita e do amor platônico perde camadas aos poucos, revelando fragilidade.
Como em outras obras, Green se apoia em grandes escritores para desenvolver com maior autoridade suas teses, dando vazão à ciranda narrativa que fará leitores procurarem novos autores. Dessa vez, é Walt Whitman e seu Folhas de Relva a inspiração narrativa e espelho para as personagens. Com seus poemas profundos sobre a interconectividade dos seres humanos, a sabedoria em observar outros e se reconhecer em estranhos, Whitman se transforma no símbolo de reflexão para este grupo que, aos poucos, tem consciência de que está diante de um novo momento vazio após o término do colegial.
A jornada estabelecida à procura de Margo é um símbolo da própria transição da maturidade, de uma última aventura em conjunto. A composição não é fatalista, mas deixa nas entrelinhas a importância de se compreender cada momento de transição, respeitando os caminhos divergentes sem perder a ligação entre cada um, os fios que ligam um ao outro como citado na história.
Sem ceder a um final feliz que seria favorável à felicidade do público mas não à própria história, Green faz um interessante romance de formação carregado de reflexões pontuais sobre a vida, principalmente no momento primordial em que boa parte de seus leitores estão situados, e encerra a narrativa sendo fiel aos princípios de seus personagens ficcionais.
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