E se juntassem toda a trama básica de O Poderoso Chefão, com os elementos de luxúria, violência e sarcasmo sem limites da série True Blood (um tanto esquecida, hoje em dia)? Os Corleone sairiam de fato mordendo pescoços, na Sicília e em Nova York? O resultado mais simples seria essa minissérie adulta do fantástico selo Vertigo, da DC, em que vampiros não são mais uma lenda, e sim uma realidade já consumada no submundo conturbado e pervertido de Miami. Se antes o crime organizado local era comandado pela família de vampiros Del Toro, por quase um século de atuação, quando seu centenário patriarca é atirado de um prédio para que todos pudessem ver seu corpo explodir, em praça pública, o culpado agora precisa ser encontrado, e um jogo de poder entre seus filhos toma corpo para ver quem é digno de ser o novo chefão a liderá-los.
Uma família de crimes, cujos delitos principais vão muito além de tirar sangue de suas vítimas – seus objetivos são bem mais complexos que os de conde Drácula, pode ter certeza disso. E neste primeiro volume de Clube Vampiro, dos escritores Howard Chaykin e David Tischman, o realismo fantástico pretendido pelos seus autores é destilado em uma trama policial introdutória a boa mitologia da história, e aqui dividida entre dois enredos principais: a caça pelo assassino do finado Eduardo, figura lendária em Miami (um vampiro alfa, na hierarquia da raça), e o embate ético entre os seus três filhos: a inescrupulosa mulher de negócios Risa, o explosivo Eddie, uma referência imediata ao truculento Sonny da saga Chefão, e num contraponto direto a imoralidade absoluta dos irmãos, temos o sacerdote Leto (o Michael Corleone da vez), um estranho fora do ninho que busca a salvação de todos em nome da reputação dos Del Toro, e de uma vaga no paraíso para os seus entes queridos.
Queridíssimos, aliás. Uma gente capaz de tudo, incluindo sua mãe Arabella, que vivem para seus negócios com drogas ilícitas, perversão entre eles e muita prostituição, em nome dos privilégios que precisam continuar tendo após Eduardo ter partido, e deixado como líder o seu filho Leto – cuja honra e serenidade ímpares conquistou a sabedoria do pai. Diante disso, Risa e Eddy mostram-se os inimigos ideais para o jovem padre, um otimista inveterado com síndrome de Superman no meio de uma orgia de pura competição e ganância. Em Clube Vampiro, nota-se aquele clássico conflito shakespeariano em que o sangue nas veias de uma família é envenenado pelo instinto animal de cada um, e é claro que as chances de tudo dar errado já estão postas na mesa desde o início, tendo apenas um elemento na história que se mostra humano o suficiente para merecer nossa atenção, enquanto que os outros gozam de sua imortalidade e dos hormônios sempre à flor da pele que ela oferece (afinal, se temos todo o tempo e juventude do mundo, porque não aproveitar com prazeres sem fim?).
Com personagens realmente cativantes, devido à personalidade forte de cada um bem apresentadas neste primeiro volume, a minissérie inicialmente carece de um roteiro mais inteligente e empolgante tanto nas suas reviravoltas, quanto em seu final, bastante previsível em torno de um drama e de uma ação maniqueísta demais e fraco, em certos momentos – a conversa no taxi entre Leto e seus novos capangas que começa a liderar – é especialmente apática, e óbvia para quem já leu outras histórias mais sofisticadas sobre grupos criminosos, e a constante paranoia e tensão interna que paira no seu dia a dia. Mesmo assim, o primeiro Clube Vampiro vale por sua premissa bem legal, algumas figuras caricatas mas bem divertidas, e os traços quase eróticos de David Hahn, dando vida a alguns painéis chocantes. Não apenas ousadia, mas há aqui a falta de um esforço maior na construção do enredo que inicia a história dos sanguinários e poderosos Del Toro, ainda que seja irresistível querer saber o que o futuro os aguarda.
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