Situada em Nova York, explorando a violência e o blaxploitation tanto do Rap dos anos noventa quanto nos bairros suburbanos da década de 1970, The Get Down é uma história épica, focada na trajetória de Books (Daveed Diggs), que no passado, era Ezekiel ‘Zeke’ Figuero(Justice Smith), um homem que recita sua poesia de rua nas duas linhas temporais, discorrendo sobre miséria, sobrevivência e amor, este último envolvendo primeiramente a bela Mylene Cruz (Herizen F. Guardiola), uma menina de voz doce e espírito arredio. Os seis episódios desta parte um se dedicam a aprofundar a questão dos dois personagens, em sua busca pessoal e conjunta pelo sucesso.
O programa criado por Stephen Adly Guirgis e Baz Luhrmann mostra, no passado, Mylene e Ezekiel não conseguindo ficar juntos, basicamente porque o rapaz não consegue o ímpeto de mostrar a sua arte. O encontro dos dois ocorre na boate Les Infernos, onde a parte latina da população negra se encontra para ouvir o som do famoso Dj Malibu (Billy Porter) e onde a menina acredita que poderá se exibir aos olho de quem faz acontecer na vizinhança. A família de Maylene é a responsável pela igreja local, e seu pai, Pastor Ramón Cruz (Giancarlo Esposito) é um fanático religioso que sente nojo pela simples possibilidade de envolvimento de sua família com qualquer rastro de vida mundana e pseudo leviana, tendo a vida completamente diferente da de seu irmão Francisco ‘Papa Fuerte’ Cruz (Jimmy Smiths), um sujeito boêmio e influente dentro da comunidade. O objetivo do velho é manter seus herdeiros longe da volúpia do Bronx contemporâneo, cerceando a liberdade da moça e bloqueando sua estrada para a fama.
Paralelo a isso, Zeke busca entender sua vocação e identidade enquanto escritor e intérprete. Ambas jornadas são guiadas sob um ponto de vista estilístico, que mescla a fantasia típica dos filmes de Baz Luhrman – que dirige o primeiro episódio- e o visual de clássicos como Warriors, Cleópatra Jones e Shaft. O piloto estabelece não só o ideal que Ezekiel passa a buscar como a descoberta de todo um mundo novo, para ele, para seus amigos, Marcus ‘Dizzee’ Kipling (Jaden Smith), Ra-Ra Kipling (Skylan Brooks) e Boo-Boo Kipling (Tremaine Brown Jr.) junto ao novo mentor, Shaolin (Shameik Moore), que o introduz na cultura do repente e da comunicação via batalha rimada, nascendo assim o Fantastic Four Plus One, que depois se tornariam os The Get Down Brothers.
A trama de The Get Down é essencialmente visual. O subtexto que no inicio beira o raso é muitas vezes escondido pela inventividade dos diretores Ed Bianchi, Andrew Bernstein e Michael Dinner, que conseguem junto ao departamento de arte produzir uma identidade visual grandiosa, que insere o espectador automaticamente no mundo proposto ali.
Não demora para a qualidade do argumento subir, a partir de Esqueça a Segurança, 4º Episódio, onde os elementos dissonantes, entre religião e descoberta de uma nova cultura produzida pelos negros americanos surge, se valendo do talento e beleza arrebatadoras de Maylene e de seus duas amigas Regina (Shirley Rodriguez) e Yolanda (Stefanée Martin). A estrada para o sucesso seria pavimentada ainda com muitos sacrifícios e concessões, tudo desenvolvido de modo gradual, levando em conta todas as condições e nuances de uma trajetória difícil.
O núcleo adulto é até bem desenvolvido, em especial nos detalhes da ascensão artística de Mylene e profissional de Zeke, especialmente nos detalhes da rotina do produtor Jackie Moreno (Kevin Corrigan) mas as nuances dramáticas mais fortes moram nos dramas dos meninos, que são obrigados a crescer sob um olhar castrador e conservador, ao mesmo tempo que tem que lidar com as descobertas de uma nova existência, de um novo patamar de desventuras, amores e sonhos.
The Get Down mistura elementos dissonantes, unindo sentimento, talento, violência, ascensão social e simbolismo tudo com um abordagem absolutamente harmônico, que justifica em si até os exageros dramáticos. A apresentação dos The Get Down Brothers ocorre em paralelo com um comício politico, protagonizado por boa parte do elenco mais velho e por Ezekiel, sendo essa só mais uma mostra que o protagonista transitaria entre esses dois mundos. Mais do que falar sobre a gênese da cultura hip hop, a serie consegue elucubrar sobre alma e sobre a conexão que a arte tem com identidade dos homens e mulheres, ainda que não finde o assunto, uma vez que a temporada só terminará em 2017, em um novo formato testado pela Netflix. Ainda assim, a sensação mais comum ao público é de curiosidade pelo desenrolar de todas as histórias.