O começo silencioso do episódio faz lembrar o óbvio: o massacre em The Bells, e que quase nada sobrou. Uma boa prova disso é a cena do homem queimado vagando, passando por Tyrion (Peter Dinklage), enquanto o anão está a procura de seus irmãos, em uma das cenas mais emocionantes das oito temporadas. Os produtores finalmente lembraram do talento de Dinklage, e deram ao personagem um momento em que poderia fazer as pazes com suas memórias e amarguras.
Logo depois, temos um enquadramento do momento em que Drogon fica atrás de sua mãe, dando-lhe asas – certamente David Benioff e D.B. Weiss nos relembra que essa não é uma temporada de sutilezas. Neste episódio, Jon Snow volta a ser muitas coisas, principalmente, o excluído que sempre foi. É necessário que o anão que esteve ao seu lado faça um discurso sobre a tirana que Daenerys se tornou, e só assim ele se convença disso. Nada faz muito sentido no arco dele, não pelas conclusões em si, mas pelo modo que ocorrem, e seria um verdadeiro milagre que isso fosse magicamente consertado no final, mas tudo bem.
O fato do capítulo ter sido conduzido por Benioff e Weiss é de uma licença poética ímpar, pois os acertos e (principalmente) os erros da série são méritos dos dois. Toda a problemática, desde a péssima escolha de Emilia Clarke para momentos dramáticos, e a curva de justiça que o episódio convenientemente dá vazão nos seus últimos instantes. Os pecados que ambos cometeram fez com que recebessem duras e justas críticas a forma como se desenhou esse final, atrapalhado e atabalhoado, de certa forma uma releitura de A Vingança dos Sith. É realmente uma pena a pressa que os criadores tiveram nesse desfecho, pois o desenho final demonstra que a maioria dos problemas de roteiro seriam resolvidos com um maior cuidado se houvesse mais desenvolvimento desses personagens e tramas.
É bom lembrar que, apesar dos inúmeros diálogos, esse último episódio trabalha bastante bem o silêncio. Desde a contemplação de Daenerys pelo trono ao choque dos personagens pelo massacre que a rainha praticou. Além disso, Tyrion chega as conclusões que precisa sem conversas, Snow percebe que acertou quando não há mais palavras ditas, e Drogon desfaz o trono de mil espadas com seu fogo redentor, sendo o mais racional dos seres. Ao menos não demora mais de uma hora para dar um desfecho a Khaleesi, e sua despedida é emocionante, deixando algo em aberto, sobre o destino de seu Drogon. Ainda assim é odiável ter que assumir que Sansa Stark (Sophie Turner) tinha razão, e odiável que o homem que ressuscitou precise ser convencido de que ele vivo, ainda é um perigo para Daenerys.
O que se vê a partir da reunião do que sobrou das famílias também faz pouco sentido. Parecendo uma reunião de veteranos de série, após 10 anos dela ter acabado, mas isso ocorre dentro do próprio seriado. Ao menos, se dá oportunidade para que alguns dos coadjuvantes tenha brilho, como Sor Davos (Liam Cunningham), que de repente, se lembra que pode ser um bom mediador, ainda que não faça sentido ele pedir sobriedade aos outros e depois dizer que não sabe se tem direito a voto. Muita humildade para quem faz parte de um conselho de notáveis. É uma boa piscadela para os fãs o assunto da democracia surgir pela boca de Sam (John Bradley-West). A queda de um rei não parece ser o suficiente para dar poder de voto ao povo, aparentemente esse desejo precisa vir e ser conquistado a partir do povo, e não vindo de nobres, como uma dádiva.
Martin estava certo, precisava de mais tempo para desenrolar a trama toda e seus personagens com seus destinos. O armistício, a escolha de Bran (de todas as coisas, a que menos faz sentido) e o fato do anão aceitar ser a Mão do Rei soa incoerente e pouco desenvolvido. O rei “quebrado” é tão alienado e ausente do mundo dos vivos que sua realeza é simbólica e só, tanto que nem sua irmã cuida de si, e decide manter seu pedaço de reino independente. Ela ser coroada até faz sentido, e é um dos bons acertos dessa reta final, mas até esse mérito poderia ter sido feito de outro modo e melhor engendrado. Das boas idéias, a coroação de um homem sem herdeiros e sem possibilidade de herdeiros é sábia, ainda que se confie demais em único homem para decidir por seu legado. O destino de Snow é o que mais destaca os problemas apontados neste parágrafo. Ele é sentenciado a retornar a Patrulha da Noite, mas seu destino final é para além da muralha, ao lado dos Selvagens. Não ficando claro se ele decide descumprir a decisão do rei de Westeros ou se se trata de uma missão específica. A cena reitera a ideia de que ele era mais Stark que Targaryen, reunindo-se ao lado de Fantasma mais uma vez.
Boa parte das teorias finalmente se cumpriram, como os adendos na biografia de Jaime Lannister, o fato de Arya se tornar uma desbravadora, a coroa nortenha de Sansa. Há coisas bem decepcionantes, como Bronn sendo um burocrata ou as Crônicas de Gelo e Fogo sendo entregues sem qualquer emoção ou surpresa. Ao menos Porto Real termina com discussões os detalhes mais burocráticos dos reinos, como fortificações dos muros, alimentação, reconstrução de bordéis e o destino do último dragão. A brincadeira de que essa foi uma história dos Starks é levada até a última das consequências, e é realmente uma pena que essa temporada tenha sido tão frágil e apressada. Quem reclama unicamente desse final parece mesmo não ter acompanhado toda a problemática trajetória da quinta temporada em diante, com anos que vinham piorando cada vez mais.