Não sei se foi você que veio a mim ou eu que fui até você. Nem se foi realidade ou se foi sonho, adormecido ou desperto. Estou perdido nas trevas de um coração abatido. Se foi sonho ou realidade, que decidamos nesta noite.”
Digo desde já que as chances de eu ser imparcial falando de Neil Gaiman são remotas. É com certeza um dos escritores que mais me influenciaram; admiro-o com todo o respeito e sempre fico empolgado quando vejo um livro ou quadrinho que foi roteirizado pelo mesmo. Não foi à toa que não demorei cinco minutos para comprar Sandman – Os Caçadores de Sonhos quando vi em uma livraria.
Primeiramente, esta obra foi lançada em formato de livro, em comemoração ao décimo aniversário de Sandman. À época, Gaiman transcrevia para o inglês os diálogos de filmes de Hayao Miyazaki, o que o fez estudar sobre mitologia japonesa. Foi da leitura do conto A Raposa, o Monge e o Mikado dos Sonhos que surgiu a inspiração para a adaptação da história para o mundo de Sandman, pois havia enxergado uma grande semelhança com o universo do seu personagem. Juntou-se ao artista Yoshitaka Amano e concluiu um trabalho que foi recebido de braços abertos por todos os fãs. Dez anos se passaram e P. Craig Russell resolve adaptar a obra literária de Gaiman para uma história em quadrinhos. Felizmente, o resultado deste trabalho grandioso se encontra em minhas mãos.
Os Caçadores de Sonhos conta a história de um Japão antigo em que criaturas mitológicas e lendas viviam entre os humanos. Certo dia, uma raposa apostou que faria um humilde monge perder a guarda de seu templo, porém acabou se apaixonando por ele. Um maldoso senhor, que dominava as artes de magia demoníaca, cobiçou a força interior do monge e a queria roubar para si a qualquer custo. O Rei dos Sonhos se vê em favor de um amor que nunca deveria ter acontecido.
Não é necessário dizer mais nada sobre a história. A sinopse acima é o suficiente para ilustrá-la na imaginação virgem de quem ainda não a leu e atiçar a curiosidade.
P. Craig Russell faz um trabalho grandiosíssimo adaptando com delicadeza para a linguagem dos quadrinhos uma história que já havia feito bastante sucesso. Consegue transpor em imagens todos os elementos e a atmosfera presentes nas histórias de Neil Gaiman. Se aproximando ainda mais do universo em que se passa o conto, o artista, juntamente com o colorista Lovern Kindzierski, mistura a beleza da arte asiática e técnicas da art nouveau europeia, para assim criar um padrão de proximidade da arte com aquilo que o leitor está lendo. Os traços de Russell, juntamente com as cores de Lovern, são simples, porém ricos em detalhes, sempre valorando os elementos importantes de cada quadro que se vislumbra.
Para aqueles que já conhecem as histórias de Sandman, este livro é uma obrigação, pois ainda podemos contar com ilustrações lindíssimas de vários artistas diferentes (como Mike Mignola, Yuko Shimizu, Paul Pope, Joe Kubert e do próprio Russell) nos extras do encadernado.
Falar mais sobre este lançamento apenas seria continuar insistindo no óbvio. Minha intenção inclusive não é dar spoilers, longe disso, pois estaria incorrendo em um erro gravíssimo para aqueles que leem as obras de Gaiman. Meu objetivo, porém, é incentivar a leitura e a experimentação (porque é assim que visualizo a leitura deste, como uma experiência) desta belíssima obra.
–
Texto de autoria de Pedro Lobato.