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  • Resenha | Batman Berlin

    Resenha | Batman Berlin

    Batman Berlin

    Lançada originalmente em Batman Chronicles#11 – com publicação da Editora Abril em Batman: Lendas do Cavaleiro das Trevas n° 3, a história com texto e arte de Paul Pope (Ano 100 e Batman Preto e Branco) mostra o homem-morcego agindo na Alemanha dominada pelos nazistas, nos anos que coincidiam com as primeiras publicações de Bob Kane e Bill Finger.

    O interessante da abordagem de Pope é a aura nostálgica remetendo imediatamente à gênese do personagem, muito mais soturno e violento, além de se utilizar de elementos do expressionismo alemão. A troca da base de operações é feita de modo orgânico e funciona na proposta do autor. As referências a Detective Comics #27 e ao Ano Um são notadas logo no início, mas a abordagem diferenciada faz lembrar a de outras obras além das do Morcego, como o Nosferatu de Murnau.

    Em 1938, o milionário e socialite Baruch Wane recebe o comissário de polícia Gordon que o alerta sobre um malfeitor sabotador de algumas das ações policiais pela capital. O milionário evidencia que as áreas afetadas pelo vigilante não são lugares onde ele costuma passar, demonstrando um abismo social entre a classe deste e dos menos favorecidos economicamente. Wane é também um pintor famoso – justificando sua fortuna – e logo recusa fazer um retrato do Führer, com a desculpa de que era um artista cubista – e realmente o é, mas guardava em si óbvias reprovações ao regime ditatorial.

    As cores de Ted McKeever ajudam a grafar ainda mais o incômodo do personagem principal. Seus tons em marrom contrastam visualmente com a arquitetura azulada da cidade, mostrando o quão a criatura é diferente e diversa do local que ela assombra. Baruck Wane apesar de ser um homem afortunado sofreu as mesmas agruras do povo, com seu passado órfão, mostrando em um recordatório os  pais de Wane, mortos unicamente por serem judeus.

    A ideia do anti-herói é ligada ao poder da destruição em devastar o lado comum do monopólio de homens maus para, das cinzas, surgir um novo modo de governar. As últimas páginas mostram um predomínio das tonalidades laranjas, com o fogo que preenche o ideal do personagem, como também seu ímpeto incendiário e o discurso libertário, necessário naqueles tempos maus. Batmam Berlin é uma bela análise do mito do Morcego, se utilizando de um momento histórico para fazer valer uma deslumbrante leitura, cujo visual é ainda mais aprazível que o bem urdido enredo.

    A segunda e pequena história A Maldição da Mulher Gato, de John Francis Moore e arte de Kieron Dwyer evoca elementos da literatura pulp. Os ares de filme noir – ainda mais evidentes com a quase ausência de cor – mostram uma breve trama, focando a superstição dos marginais e o cinismo dos policiais. Apesar de curiosa, a segunda narrativa não ofusca a primeira, e mesmo sem temáticas semelhantes, estas duas formam um bom encadernado.

  • Resenha | Batman 70 Anos: Volume 2

    Resenha | Batman 70 Anos: Volume 2

    Batman - 70 Anos - Vol. 2 - Os Segredos da Batcaverna

    O segundo volume lançado pela Panini Comics em comemoração aos 70 anos do Cavaleiro das Trevas é uma coletânea dedicada à Batcaverna, central de operações do Morcego desde a criação da personagem.

    A escolha das histórias não busca um panorama como na edição anterior, mas centra-se na época de ouro da década de 40 e 50 para apresentar aventuras que explicam diversos dos artefatos encontrados e destacados no interior da caverna, principalmente na famosa Sala de Troféus. Como um colecionador, Bruce Wayne mantém uma sala que recorda diversos crimes solucionados em parceria com Robin. Dessa maneira, descobrimos a origem de diversos objetos conhecidos na sala de operações, como o dinossauro mecânico, a moeda gigante de um centavo, entre outras curiosidades da infraestrutura de ser um herói milionário, tal qual a criativa gama de batarangues utilizada em ocasiões diversas. Itens que, vistos com distanciamento, não são coerentes com as atuais histórias sombrias, mas fazem parte da história do encapuzado.

    As 16 histórias apresentadas estão divididas formalmente em três partes: Troféus da Batcaverna, Origem da Batcaverna e Contos da Batcaverna. Ainda que as divisões sejam arbitrárias, apresentam tramas com o mesmo tema e sem nenhuma diferença.

    Em relação aos primórdios de Batman, as histórias ganharam maior agilidade, mesmo que continuem pueris. A personalidade do Morcego é bem definida por um senso cômico de fazer piadas com trocadilhos envolvendo os bandidos, um humor de época engraçado, mas sem soar agressivo. Mesmo que por meio de outra abordagem, há consistência nas tramas, as quais ainda atingem o objeto primordial de uma leitura de entretenimento.

    Em uma seleção dedicada à caverna, há um grande equívoco de se inserir nela a história O Homem do Capuz Vermelho. Embora seja uma excelente e importante trama, a primeira que modifica a origem do Coringa e lhe dá o passado do vilão Capuz Vermelho, ela não possui nenhum vínculo com a temática em questão.

    Somente três histórias são dos últimos 30 anos. Teatro de Sombras marca a volta de Wayne à batcaverna sob a mansão. Na década anterior, com Dick Grayson indo para a faculdade, Bruce realocou a caverna em um de seus edifícios na cidade. No retorno, a personagem presta ajuda à família de Robert Kirkland Langstrom, o vilão Morcego Humano, que, na época pré-Crise, era um fã de Batman e criador de um soro para obter os poderes de um morcego de verdade.

    O Homem Que Cai é uma das tradicionais edições que recontam elementos da origem da personagem. Com uma ambientação próxima da contemporânea e utilizando-se do roteiro de Danny O´Neil, a trama foca Bruce Wayne desde sua adolescência, no que se tornaria o ponto de arranque para a fundação da caverna, momento em o jovem cai em um buraco perto da mansão Wayne – cena repetida em outras histórias e vista também no início de Batman Begins, de Christopher Nolan.

    Publicado em janeiro de 82 em The Brave And The Bold #182, Interlúdio na Terra 2 apresenta, também pré-Crise, uma aventura de Batman na outra Terra. A aventura é bem executada e demonstra ao público pós-Crise como era a interação das diversas Terras ante a grande saga que modificou as estruturas da DC Comics.

    Finalizando a seleção, uma pequena história publicada em Bizarro Comics (2001), com roteiro de Paul Pope – que produziria depois o interessante Batman: Ano 100 – e desenhos de Jay Stephens. Uma narrativa doce em que um pequeno garoto descobre a existência real da batcaverna. Um argumento sensível que apresenta um viés raro da personagem sempre sombria.

    Sem a obrigatoriedade de histórias representativas de cada época, este segundo volume ganha coerência em relação ao primeiro e com a qualidade da Era de Ouro, ainda que muito diferente das atuais narrativas soturnas. Ao contrário da edição anterior, o segundo volume apresenta quatro páginas indicando as modificações da caverna através das décadas. Porém, a coleção continua sem nenhum texto introdutório e nenhuma outra informação extra deste rico material.

  • Resenha | Sandman Apresenta – Os Caçadores de Sonhos

    Resenha | Sandman Apresenta – Os Caçadores de Sonhos

    SANDMAN-OS-CACADORES-DE-SONHOS

    Não sei se foi você que veio a mim ou eu que fui até você. Nem se foi realidade ou se foi sonho, adormecido ou desperto. Estou perdido nas trevas de um coração abatido. Se foi sonho ou realidade, que decidamos nesta noite.”

    Digo desde já que as chances de eu ser imparcial falando de Neil Gaiman são remotas. É com certeza um dos escritores que mais me influenciaram; admiro-o com todo o respeito e sempre fico empolgado quando vejo um livro ou quadrinho que foi roteirizado pelo mesmo. Não foi à toa que não demorei cinco minutos para comprar Sandman – Os Caçadores de Sonhos quando vi em uma livraria.

    Primeiramente, esta obra foi lançada em formato de livro, em comemoração ao décimo aniversário de Sandman. À época, Gaiman transcrevia para o inglês os diálogos de filmes de Hayao Miyazaki, o que o fez estudar sobre mitologia japonesa. Foi da leitura do conto A Raposa, o Monge e o Mikado dos Sonhos que surgiu a inspiração para a adaptação da história para o mundo de Sandman, pois havia enxergado uma grande semelhança com o universo do seu personagem. Juntou-se ao artista Yoshitaka Amano e concluiu um trabalho que foi recebido de braços abertos por todos os fãs. Dez anos se passaram e P. Craig Russell resolve adaptar a obra literária de Gaiman para uma história em quadrinhos. Felizmente, o resultado deste trabalho grandioso se encontra em minhas mãos.

    Os Caçadores de Sonhos conta a história de um Japão antigo em que criaturas mitológicas e lendas viviam entre os humanos. Certo dia, uma raposa apostou que faria um humilde monge perder a guarda de seu templo, porém acabou se apaixonando por ele. Um maldoso senhor, que dominava as artes de magia demoníaca, cobiçou a força interior do monge e a queria roubar para si a qualquer custo. O Rei dos Sonhos se vê em favor de um amor que nunca deveria ter acontecido.

    Não é necessário dizer mais nada sobre a história. A sinopse acima é o suficiente para ilustrá-la na imaginação virgem de quem ainda não a leu e atiçar a curiosidade.

    P. Craig Russell faz um trabalho grandiosíssimo adaptando com delicadeza para a linguagem dos quadrinhos uma história que já havia feito bastante sucesso. Consegue transpor em imagens todos os elementos e a atmosfera presentes nas histórias de Neil Gaiman. Se aproximando ainda mais do universo em que se passa o conto, o artista, juntamente com o colorista Lovern Kindzierski, mistura a beleza da arte asiática e técnicas da art nouveau europeia, para assim criar um padrão de proximidade da arte com aquilo que o leitor está lendo. Os traços de Russell, juntamente com as cores de Lovern, são simples, porém ricos em detalhes, sempre valorando os elementos importantes de cada quadro que se vislumbra.

    Para aqueles que já conhecem as histórias de Sandman, este livro é uma obrigação, pois ainda podemos contar com ilustrações lindíssimas de vários artistas diferentes (como Mike Mignola, Yuko Shimizu, Paul Pope, Joe Kubert e do próprio Russell) nos extras do encadernado.

    Falar mais sobre este lançamento apenas seria continuar insistindo no óbvio. Minha intenção inclusive não é dar spoilers, longe disso, pois estaria incorrendo em um erro gravíssimo para aqueles que leem as obras de Gaiman. Meu objetivo, porém, é incentivar a leitura e a experimentação (porque é assim que visualizo a leitura deste, como uma experiência) desta belíssima obra.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.