Consagrada como heroína na França por seus feitos durante a Guerra dos Cem Anos, Joana d’Arc foi capturada, julgada e condenada à morte na fogueira, o que ocorreu em 1431.
Amplamente conhecida, a trajetória de vida da jovem que ousou romper com os padrões da época já rendeu centenas de adaptações para os mais diferentes meios narrativos. Assim, contar qualquer aspecto de uma história tão famosa após tantos projetos bem sucedidos no passado torna-se um grande desafio.
Que bom que quem se encarregou da inglória tarefa dessa vez foi o quadrinista brasileiro Wagner Willian.
Em O Martírio de Joana Dark Side, o versátil artista se propõe a contar sobre o processo inquisitório pelo qual passou Joana, subjugada e humilhada pelo clero, até culminar com sua terrível execução na fogueira.
Inspirado pelas diversas adaptações cinematográficas da história de Joana, como os filmes de Victor Fleming (1948), Robert Bresson (1965) e principalmente a versão de Carl Dreyer (1928), Wagner Willian opta por destrinchar o julgamento de Joana em toda sua carga dramática, apostando em planos fechados que ressaltam a agoniante condição da mártir diante de algozes que a todo momento debocham e vociferam contra suas convicções.
Desenvolvida em preto e branco, a arte de Willian explora o suplício psicológico da personagem, e mesmo que se baseie em A Paixão de Joana d’Arc e em uma entrevista da protagonista do filme, Jeanne Falconetti, a abordagem escolhida pelo quadrinista remonta em grande medida os melhores momentos da cinematografia de Ingmar Bergman, ao contrapor a fé de Joana com sua angústia diante da iminência da morte.
O realismo colocado em prática durante o julgamento é por vezes deixado de lado na progressão do roteiro, abrindo espaço para sequências que mesclam real e imaginário, num processo que reflete a mistura entre os anseios de Joana com a aceitação de seu fatídico e cruel destino.
Incorrendo numa abordagem que remonta à metaficção historiográfica, Willian investe em um final poético para a história, que subverte o real encerramento da vida de Joana, numa tentativa de sublimar e redimir a injustiçada mulher, que desafiou as convenções e os preconceitos da época em nome de uma missão que considerava tão importante ao ponto de valer a sua vida.
Com um roteiro conciso, O Martírio de Joana Dark Side apresenta uma história trágica e dura, cujo ritmo poderia se dar de forma mais ágil caso não se prendesse tanto nas referências que norteiam a concepção da trama como um todo, para assim poder explorar a inventiva e dinâmica narrativa visual que marca os trabalhos do autor de Bulldogma, O Maestro, o Cuco e a Lenda e Silvestre, esta última ganhadora do Prêmio Jabuti de 2020.
Publicada de forma independente pelo próprio Willian, através de sua Editora Texugo, O Martírio de Joana Dark Side conta com 76 páginas, capa cartonada e papel Pólen Soft de 80g, como parte da Coleção Cine Qua Non Vol I.
O potencial dramático do traço do quadrinista foi colocado à prova nesse Quadrinho, que conta com prefácio de Gabriela Franco (criadora do Minas Nerds), e resultou em uma grande homenagem ao ícone feminista que Joana d’Arc representa.
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